Do Outras Palavras

O cuidado está no centro da sustentabilidade da vida. Não há a possibilidade de discutir o mundo pós-pandemia sem levar em consideração o quanto isso se tornou evidente no momento de crise global, que também nos fala sobre uma “crise do cuidado”. Para identificar e revelar os efeitos da pandemia sobre o trabalho, a renda das mulheres e a sustentação financeira da casa a partir da perspectiva de que as tarefas de cuidado e trabalho se sobrepõem de forma mais intensa na pandemia, a Gênero e Número e a SOF Sempreviva Organização Feminista realizaram pesquisa de percepção com mais de 2.600 mulheres brasileiras. As respostas foram coletadas, por formulário online, entre abril e maio.

Se os dados mostram que metade das mulheres brasileiras passaram a cuidar de alguém na pandemia, os recortes indicam como a realidade não é a mesma para todas: ao olhar apenas mulheres que estão em ambientes rurais, nada menos que 62% das respondentes afirmaram que passaram a ter esse tipo de responsabilidade. Além das diferenças, as desigualdades estão expostas no levantamento. Os dados mostram que as mulheres negras têm menos suporte nas tarefas de cuidado.

Entre as que seguiram trabalhando durante a pandemia com manutenção de salários, 41% afirmaram estar trabalhando mais no período da quarentena, e a maior parcela é de mulheres brancas, evidenciando que a ausência de funcionárias no domicílio ou de espaços como a creche/escola pesou mais para esse grupo. As mulheres que estão em casa sem renda ou com prejuízo de renda são 39%.

A pesquisa também coletou depoimentos, que mostram como é complexa a leitura da condição de vida e de trabalho neste momento. Mesmo as que seguem trabalhando, com renda, podem estar sob condições diferentes, mais

Os resultados estão no relatório, disponível para download (acesse o site). Demonstram, em geral, que as dinâmicas de vida e trabalho das mulheres se contrapõem ao discurso de que “a economia não pode parar”, mobilizado para se opor às recomendações de isolamento social. Os trabalhos necessários para a sustentabilidade da vida não pararam – não podem parar. Pelo contrário, foram intensificados na pandemia. A economia só funciona porque o trabalho das mulheres, quase sempre invisibilizado e precarizado, não pode parar. Por isso entender a situação do cuidado durante a pandemia é fundamental para o desenho de ações que sejam capazes de transformar essas dinâmicas de desigualdade que imbricam gênero, raça e classe.

Artigos

Para o lançamento, pesquisadoras feministas foram convidadas a escrever artigos que jogam luz em questões centrais da pesquisa. “Mulheres rurais em meio à pandemia: desigualdades e práticas econômicas para a vida” é assinado pela engenheira agrônoma Miriam Nobre; “Trabalho, solidariedade e estratégias das mulheres negras” é o texto da jornalista e também pesquisadora Bianca Santana; Marilane Teixeira, economista do CESIT/Unicamp escreve sobre “A pandemia do coronavírus e os seus efeitos sobre as mulheres trabalhadoras”. Tica Moreno, da equipe da SOF e pesquisadora de temas relacionados ao cuidado, assina o artigo “Cuidado e sustentabilidade da vida: mulheres que não podem parar”.

Os artigos citados podem ser encontrados em http://mulheresnapandemia.sof.org.br/