A percepção das entrevistadas de que a situação da mulher piorou cresceu significativamente e atingiu 28%, a maior registrada entre os levantamentos  

Em parceria com o Sesc, FPA lança 3ª edição de pesquisa sobre vida das mulheres
FOTOS Sergio Silva/FPA

Nesta terça-feira (23), a Fundação Perseu Abramo, em parceria com o Sesc, lançou a pesquisa “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado”, que está em sua terceira edição. 

A abordagem do levantamento é dividida em seis eixos: 1) Imagem das mulheres; 2) Corpo, sexualidade e saúde. 3) Violência contra as mulheres; 4) Proteção social e política de cuidados; 5) Trabalho remunerado e não remunerado e 6) Cultura política e participação. 

O evento pode ser acompanhado pelo YouTube aqui.

A apresentação dos dados foi feita no auditório do Centro de Formação e Pesquisa do Sesc, em São Paulo, pelas pesquisadoras Vilma Bokany, que coordenou os trabalhos, e Sofia Toledo, analista do Núcleo de Opinião Pública, Pesquisas e Estudos da fundação, o NOPPE. Ambas trouxeram informações no âmbito comparativo entre as duas pesquisas anteriores, que foram realizadas em 2001 e 2010. 

O diretor da Fundação Perseu Abramo Carlos Árabe participou do evento e comentou que os indicadores mostram “o retrato de mais da metade da população do Brasil” e que fazer o debate a partir da estatística ajuda na compreensão da realidade. 

Árabe também falou da importância da parceria com a rede Sesc que, segundo o diretor, tem uma grande afinidade editorial em “debater e conhecer o nosso país”. 

Os dados

Assim como a segunda, a edição recém-lançada contou com a participação masculina, traçando também as percepções dos homens sobre as desigualdades de gênero na sociedade brasileira. 

Foram ouvidas 2.440 mulheres e 1.221 homens, nas macrorregiões em 25 estados, tanto na zona urbana, quanto rural, com uso de metodologias quantitativas e qualitativas. A pluralidade de raça, escolaridade, renda familiar e orientação sexual e de gênero de mulheres na faixa etária a partir dos 15 anos foi levada em consideração no estudo. 

A terceira edição de “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado” trouxe o retrato das impressões de mulheres a partir de entrevistas realizadas no período entre 2021 e 2023. 

Na visão das entrevistadas, a atual situação da mulher no Brasil piorou significativamente. Em 2001, a percepção de que a situação das mulheres no Brasil era melhor que no passado era de 65%. Em 2010, 74% das entrevistadas tinham essa opinião e, atualmente, 54% acreditam que a situação das mulheres nos dias de hoje está melhor que no passado. Uma em cada quatro avalia que há mais pontos negativos do que positivos em ser mulher. 

A maternidade, listada em todas as pesquisas como ponto positivo da condição de ser mulher, registrou uma queda significativa. Em 2010, 57% das mulheres colocaram os filhos como o principal ponto positivo de suas condições; em 2023, o índice caiu para 43%. Na lista de piores coisas da experiência feminina na sociedade, seguem: violência, machismo e desigualdades no mercado de trabalho.

O reconhecimento da importância da política entre as mulheres recuou de 80% para 70%, entre 2010 e 2023 (a classificação de que a política é “muito importante” recuou de 52% para 47%), enquanto a não importância atribuída à política subiu de 17% para 24% no período. No mapeamento, foi identificada a participação política feminina, principalmente, a partir de associações de bairro e em pautas ligadas às temáticas de saúde e educação.  

Sobre a presença da mulher no mercado de trabalho, foi observada uma renda salarial 40% inferior na comparação com os homens. A informalidade e a falta de renda segue maior entre as mulheres. 

Políticas Públicas, participação e diálogo 

Três referências no campo da pesquisa e das políticas públicas voltadas às mulheres, Laís Abramo (secretária nacional de Cuidados e Família), Lívia Sant’Anna Vaz (promotora de justiça do Ministério Público da Bahia e escritora) e Jaqueline Teixeira (doutora em Antropologia pela USP, onde coordena pesquisas a partir do recorte das mulheres negras e evangélicas) participaram do evento com comentários. 

“Os dados são fundamentais para a elaboração de políticas públicas”, diz Laís Abramo. De acordo com a gestora do governo federal, “a organização dos cuidados no Brasil é injusta e desigual, baseada, principalmente, no trabalho não remunerado das mulheres dentro de casa”, explica. 

Laís Abramo destaca o número de horas que as mulheres passam em tarefas de cuidados, seja de crianças, idosos ou da casa, e que, quando o trabalho é exercido fora do âmbito familiar ele é feito por uma mulher em situação precarizada. “Isso que queremos colocar no centro da política pública com a Política Nacional de Cuidados”, afirma. 

A promotora Lívia Sant’Anna Vaz pontua que a raça segue como principal marcador de desigualdades, que perpassam todas as áreas da vida social, desde o nascimento até a morte. Neste sentido, ela diz que “a interseccionalidade é muito importante para a produção de políticas públicas”. “Nós, mulheres negras, somos o maior segmento social no Brasil e nos espaços de poder quase não existimos”, destaca a promotora. 

A pesquisadora Jacqueline Teixeira trouxe relatos de sua pesquisa com mulheres negras e evangélicas a partir da relação delas com diversos temas, entre eles, o feminismo. E ressaltou a importância da apresentação dos dados. “Essa pesquisa ajuda a gente a mapear a cartografia das possibilidades de diálogos”.