Direitos LGBTQIA+ sob ataque: mais de 400 projetos tramitam no Congresso
Levantamento aponta ofensiva conservadora no Legislativo contra a população LGBTQIAPN+, enquanto parlamentares progressistas apresentam propostas por igualdade, reparação e proteção social

Reprodução: Câmara dos Deputados
Um estudo da Aliança Nacional LGBTI+ mapeou 437 projetos de lei em tramitação nas esferas federal e estadual com conteúdo considerado prejudicial à população LGBTQIAPN+. A maioria dessas propostas, justificadas sob o argumento de “proteção à infância”, carrega, segundo o relatório, motivação ideológica e segue um modelo conservador de ofensiva legislativa já identificado em outros países.
O presidente da Aliança Nacional LGBTI+, Toni Reis, afirmou que essas iniciativas refletem a influência crescente da extrema direita e do conservadorismo religioso no Legislativo brasileiro. “Tais projetos seguem modelos globais, adaptados ao contexto brasileiro”, disse em entrevista ao portal Congresso em Foco. Segundo ele, cerca de 98% dessas propostas são inconstitucionais.
Os projetos variam em escopo e impacto, mas têm em comum a tentativa de restringir a presença e a expressão da população LGBTQIAPN+ no espaço público. Entre eles, está o PL 106/2025, de autoria do deputado Coronel Chrisóstomo (PL-RO), que propõe a proibição do uso de símbolos religiosos em Paradas LGBTQIAPN+, com multa de R$ 50 mil e até suspensão do evento em caso de reincidência. Já o PL 906/2025, de Marcos Pollon (PL-MS), propõe impedir a presença de menores em eventos da comunidade, com sanções de até R$ 100 mil.
Outras propostas visam restringir a participação de atletas trans em competições públicas, como o PL 3.218/2024, da deputada Missionária Michele Collins (PP-PE), e proibir campanhas publicitárias com crianças em conteúdos LGBTQIAPN+, como o PL 3.813/2023, do deputado Maurício do Vôlei (PL-MG). Há ainda projetos antigos, como o PL 580/2007, que pretende regulamentar o casamento homoafetivo, mas segue parado na CCJ da Câmara.
Estatuto da Diversidade e cotas para população trans são destaque na Câmara
Apesar do avanço das pautas regressivas, iniciativas lideradas por parlamentares progressistas têm buscado ampliar os direitos e garantir o acesso da população LGBTQIAPN+ a políticas públicas e espaços institucionais. Um exemplo é o projeto da deputada Daiana Santos (PCdoB-RS), que propõe o Estatuto da Diversidade, inspirado no Estatuto da Igualdade Racial. A proposta reúne 28 artigos e trata de temas como reconhecimento de identidade de gênero, proteção contra discriminação familiar e acesso universal a serviços de saúde e trabalho.
Entre os pontos centrais, estão o direito à retificação do registro civil a partir dos 18 anos, o reconhecimento de vínculos familiares diversos e a adoção de medidas que assegurem o atendimento sem discriminação em equipamentos públicos de saúde e assistência social.
Outra proposta relevante é da deputada Denise Pessôa (PT-RS), que prevê a reserva de 2% das vagas em concursos públicos e seleções temporárias para travestis e transexuais. A cota seria aplicada sempre que houver vagas em disputa por ampla concorrência. Caso não haja candidaturas aptas, as vagas retornam ao sistema geral. A medida é apresentada como política de reparação frente à exclusão histórica da população trans no mercado formal de trabalho.
No Senado, foco é a proteção
No Senado, o protagonismo é do senador Fabiano Contarato (PT-ES), que apresentou projeto para garantir direitos básicos a travestis e transexuais em privação de liberdade. A proposta altera a Lei de Execução Penal para assegurar o uso do nome social, a alocação de pessoas em alas compatíveis com sua identidade de gênero e o acesso a serviços de saúde, higiene e segurança.
O projeto reconhece que a população trans é especialmente vulnerável à violência institucional e a abusos no sistema prisional brasileiro. Ao criar diretrizes para o respeito à dignidade dessas pessoas, o texto busca também prevenir violações e promover condições mais humanizadas de cumprimento de pena.
Brasil ainda lidera ranking de violência
O relatório anual do Grupo Gay da Bahia (GGB), divulgado em janeiro de 2025, apontou que o Brasil registrou 291 mortes violentas de pessoas LGBTQIAPN+ em 2024. O número representa um aumento de mais de 8% em relação ao ano anterior. Os dados incluem homicídios, latrocínios, suicídios e outros tipos de violência relacionados à identidade de gênero ou orientação sexual.
A média é alarmante: uma pessoa LGBTQIAPN+ foi morta de forma violenta a cada 30 horas no país. A maior parte dos casos foi classificada como homicídio (239), seguida de latrocínio (30), suicídio (18) e outras causas (4). O Brasil segue liderando o ranking de nações que registram esse tipo de crime, entre os países que monitoram de forma sistemática. Os dados foram coletados com base em notícias da imprensa, registros online e relatos enviados diretamente à organização. Em escala global, ainda não existem sistemas consolidados de monitoramento comparável.