Noboa o Justo, por Pedro Henrichs

As eleições presidenciais de 2025 no Equador, agora em seu segundo turno, têm sido marcadas por tensões políticas e denúncias que colocam em xeque a integridade do processo democrático. O governo de Daniel Noboa enfrenta acusações de uso estratégico da máquina pública e de medidas que comprometem a equidade da disputa eleitoral. Neste contexto, as palavras de Abraham Lincoln ecoam com força: “O voto é mais forte que a bala”. No entanto, no cenário atual equatoriano, muitos se perguntam se o voto está realmente sendo respeitado como o instrumento legítimo para decidir o futuro do país.
Desde o início do ano, Noboa anunciou uma série de medidas que coincidem com o período eleitoral e que têm sido interpretadas como tentativas de influenciar diretamente os resultados das urnas. Foram emitidos 14 decretos executivos que concedem benefícios financeiros significativos à população, totalizando US$ 518 milhões em custos ao Estado. Entre os programas lançados estão incentivos ao empreendedorismo com bônus de US$ 1.000 e compensações econômicas de US$ 500 para membros das Forças Armadas e da Polícia Nacional. Embora tais ações sejam apresentadas como iniciativas sociais, a proximidade com as eleições levanta suspeitas sobre seu real objetivo. Como Winston Churchill afirmou: “A democracia é a pior forma de governo, exceto por todas as outras que já foram tentadas”. Mas quando as instituições são manipuladas, até mesmo essa pior forma parece ameaçada.
Além disso, o governo tem sido acusado de discriminar prefeituras opositoras ao atrasar ou cortar repasses constitucionais provenientes de impostos federais, enquanto aliados políticos recebem os fundos regularmente. Essa prática não apenas prejudica as administrações locais da oposição, mas também cria um ambiente desigual que favorece os interesses do governo central. Paralelamente, Noboa adotou uma retórica polarizadora ao afirmar publicamente que não reconhecerá os resultados caso perca as eleições, sugerindo fraude como única explicação possível para uma eventual derrota. Essa retórica lembra as palavras de Alexis de Tocqueville: “Em uma democracia, as pessoas têm o governo que merecem”. No entanto, quando o sistema é manipulado para favorecer um lado, cabe questionar se a escolha popular está sendo respeitada.
Outro aspecto alarmante tem sido o uso do sistema judicial como ferramenta política para perseguir adversários. Em 9 de abril, o Ministério Público solicitou a prisão preventiva do prefeito de Guayaquil, Aquiles Álvarez, sob acusações relacionadas ao caso “Triple A”. A defesa argumenta que o processo carece de justificativas legais sólidas e foi motivado politicamente. Da mesma forma, o Tribunal Contencioso Eleitoral reabriu um processo contra Pabel Muñoz, prefeito de Quito, baseado em uma infração eleitoral já julgada em 2023 e pela qual ele havia pago multa. Essas ações reforçam as suspeitas sobre o uso estratégico da justiça para enfraquecer lideranças opositoras em momentos críticos. Como Lord Acton sabiamente observou: “O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente”.
A destituição da vice-presidente Verónica Abad também exemplifica as violações constitucionais no atual cenário político. Alegando abandono de suas funções por três dias, Abad foi destituída e teve seus direitos políticos retirados por oito anos. Essa decisão contraria a Constituição equatoriana, que estabelece que apenas a Assembleia Nacional pode julgar presidentes e vice-presidentes. Além disso, sua destituição impede
que ela assuma o cargo caso Noboa se licenciasse para concorrer à reeleição. Essa manobra política lembra as palavras de Benjamin Franklin: “Aqueles que abrem mão da liberdade essencial por um pouco de segurança temporária não merecem nem liberdade nem segurança”.
O estado de exceção declarado pelo governo em várias províncias às vésperas do segundo turno adiciona ainda mais tensão ao cenário político. Sob justificativa de “grave comoção interna”, o decreto suspende direitos fundamentais como liberdade de reunião e trânsito em regiões estratégicas. Críticos apontam que essas medidas criam um ambiente intimidatório para eleitores e opositores políticos, restringindo ainda mais as condições para um processo eleitoral justo. Theodore Roosevelt certa vez disse: “A grandeza da democracia está na força dos cidadãos”. Mas quando os direitos desses cidadãos são restringidos por medidas autoritárias, a essência democrática fica comprometida.
A comunidade internacional também tem demonstrado preocupação com os acontecimentos no Equador. Organizações como COPPPAL, União Europeia (UE), Mercosul e OEA expressaram estranheza diante das manobras políticas realizadas pelo governo. Delegados estrangeiros foram impedidos de atuar como observadores nas eleições em última hora, levantando dúvidas sobre a transparência do processo eleitoral. Como John F. Kennedy afirmou: “O ignorante em uma democracia compromete a segurança de todos”. A exclusão de observadores internacionais apenas reforça os temores sobre a falta de transparência no processo.
Embora não se possa afirmar categoricamente que há fraude nas eleições equatorianas, os eventos descritos indicam um cenário onde as condições não são justas nem democráticas. O uso sistemático do sistema judicial contra adversários políticos (lawfare), o desvio estratégico dos recursos públicos para fins eleitorais e as restrições impostas por estados de exceção criam um ambiente desfavorável à competição política saudável. Além disso, a retórica oficial antidemocrática e as preocupações internacionais reforçam a percepção de que as eleições estão longe de ser transparentes ou livres.
O Equador enfrenta um momento decisivo em sua história democrática. As ações do governo Noboa comprometem não apenas a confiança na integridade das instituições eleitorais, mas também ameaçam os princípios fundamentais que sustentam uma sociedade livre e igualitária. Como Margaret Thatcher disse: “Todos os esforços para destruir a democracia falharão”. No entanto, garantir eleições justas exige vigilância tanto nacional quanto internacional para preservar os valores democráticos diante das práticas autoritárias que têm marcado este processo eleitoral.
* Mestrando em Relações Internacionais no IDP (Instituto Brasileiro de ensino Desenvolvimento e Pesquisa), gestor Público, CEO da Henrichs Consultoria, Sec. Executivo Regenera Brasil, Ex-presidente do Fórum de Juventude dos BRICS, Observador eleitoral há 15 anos, 18 países na América, 4 países na Europa, 1 na África, e 3 na Ásia.