STF torna Bolsonaro réu por tentativa de golpe: um marco na Justiça brasileira
É a primeira vez que um ex-presidente eleito é colocado no banco dos réus por crimes contra a ordem democrática estabelecida com a Constituição de 1988

O Supremo Tribunal Federal (STF) fez história nesta quarta-feira, 26 de março de 2025, ao tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) réu por crimes contra o Estado de Direito, uma decisão sem precedentes que marca o exato momento em que o Brasil reconhece a tentativa de golpe de Estado como uma ameaça concreta contra a democracia. Pela primeira vez, um ex-presidente da República será julgado por crimes que atentam diretamente contra o funcionamento das instituições democráticas.
A decisão unânime dos ministros da Primeira Turma do STF — composta por Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin — marca um divisor de águas no sistema jurídico e político do país. Com a aceitação da denúncia pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o processo agora avança para uma ação penal, com a expectativa de que o julgamento do ex-presidente e seus aliados seja concluído até o final deste ano.
A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) detalha os crimes cometidos, como organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e danos ao patrimônio público. O total das penas pode ultrapassar 40 anos de prisão, caso sejam condenados em todos os itens imputados.
A denúncia é robusta, apontando cinco crimes graves relacionados à tentativa de golpe de Estado, incluindo organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, e danos qualificados ao patrimônio público. A pena máxima somada para todos os réus pode ultrapassar 43 anos de prisão.
Votos dos ministros
O julgamento, presidido pelo ministro Alexandre de Moraes, foi um marco de contundente afirmação da justiça contra a tentativa de subversão democrática que culminou nos atos violentos de 8 de janeiro de 2023. Ao votar, Moraes apresentou vídeos de eventos que evidenciam a conexão direta entre o governo Bolsonaro e os atos golpistas, reforçando a materialidade das acusações.
Em seu voto, Moraes afirmou que “há indícios razoáveis de que Bolsonaro liderou uma organização criminosa com o objetivo de desestabilizar a democracia”, citando, entre outras ações, o ataque contínuo às urnas eletrônicas e a disseminação de fake news. O ministro também destacou o uso das milícias digitais e o famigerado “gabinete do ódio”, ferramentas usadas para espalhar desinformação e minar a credibilidade do processo eleitoral.
O ministro Flávio Dino, que seguiu Moraes, argumentou que a violência e a ameaça de violência, com a apreensão de armas e outros materiais, são provas claras da gravidade das ações dos acusados. “Estamos tratando de uma escalada que, desde 2021, culminou no 8 de janeiro”, afirmou Dino, ressaltando que, sem o ataque à democracia naquele dia, a situação teria se desdobrado de maneira ainda mais catastrófica.
A ministra Cármen Lúcia, em seu voto, fez um contundente apelo à preservação da memória histórica do Brasil, citando o livro de Heloisa Starling para reforçar a ideia de que o golpe não é um ato isolado, mas um processo que se desenrola ao longo do tempo. “O que vimos no 8 de janeiro foi a tentativa de destruir o que levamos séculos para construir: uma democracia sólida”, declarou Cármen.
O ministro Cristiano Zanin, por sua vez, destacou que a denúncia não se baseia apenas em delações premiadas, mas em uma série de provas documentais e vídeos que sustentam as acusações. Para Zanin, é irrefutável que Bolsonaro e seus aliados participaram ativamente da articulação golpista, desde o ataque às urnas eletrônicas até o evento de 8 de janeiro.
Próximos passos e consequências
Agora, com o ex-presidente e seus aliados como réus, o processo entra na fase de ação penal. Nesse estágio, os réus poderão apresentar suas defesas, produzir provas, e indicar testemunhas, enquanto a PGR terá a responsabilidade de comprovar a participação de cada um na tentativa de golpe. Em paralelo, o impacto político de uma condenação de Bolsonaro é inegável, afetando não só sua imagem, mas também o cenário eleitoral de 2026.
Aliados do ex-presidente já discutem a antecipação da escolha de um candidato para a corrida presidencial, enquanto a definição de uma sentença pode reforçar a pressão sobre o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que assumiu a presidência no contexto dessas turbulências.
Esse julgamento representa não apenas uma resposta judicial aos ataques ao sistema democrático, mas também um marco simbólico de resistência à autoritarismo, reafirmando o compromisso do Brasil com a democracia, a justiça e a preservação das instituições fundamentais. O desfecho desse processo terá repercussões profundas na política nacional e será fundamental para a construção de um futuro mais sólido para as próximas gerações.