Próxima etapa do Minha Casa, Minha Vida alcança população em situação de rua
Portaria interministerial deve ser assinada em breve; movimento popular defende conquista
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Um dos principais programas vitrine dos governos petistas, desde sua criação em 2009, o Minha Casa Minha Vida renasceu com a chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu atual mandato, após ter sido sucateado a partir do processo de impeachment sofrido por Dilma Rousseff.
Durante os anos de Michel Temer (MDB) na presidência, o programa sofreu um corte de 56% , enquanto o governo de Jair Bolsonaro (PL) emendou a redução de 42% do seu orçamento. Ou seja, sem recurso e vontade política, o MCMV, além de não avançar em novas contratações, ainda acumulou problemas de infraestrutura nas construções que já estavam em andamento durante o período.
O cenário pregresso de desmantelamento é bem diferente da movimentação atual nesses dois primeiros anos de governo Lula 3, que tem como meta alcançar a contratação de mais de 2,5 milhões de unidades em todo o território ao final do mandato.
“Nós temos batido ano a ano recordes de contratação”, disse em entrevista nesta sexta-feira (31), o ministro das Cidades, Jader Filho. Até agora, já foram cerca de 1,2 milhão de contratações de unidades habitacionais. “Em 2025 já superamos a meta de 600 mil novas unidades habitacionais”, completou o ministro.
Ampliação do programa
Conforme consta na portaria nº 725 do Ministério das Cidades, de junho de 2023, todas as casas e apartamentos construídos devem estar localizados em áreas urbanas consolidadas ou em expansão. Além disso, os imóveis devem ter acesso à rede elétrica, saneamento, educação, saúde, comércios e transporte público. As casas térreas devem ter no mínimo 40m², e os apartamentos ou casas sobrepostas 41,50 m² (área útil com varanda). Também há a descrição sobre equipamentos nos condomínios, como bibliotecas e outros espaços de convivência.
Apesar da boa notícia com relação à padronização da estrutura proposta com a retomada, um ponto que tem chamado bastante a atenção sobre as mudanças no programa é a inclusão de um segmento social bastante vulnerabilizado: a população em situação de rua.
A medida anunciada em dezembro de 2023 ocorre a partir de um acordo interministerial das pastas das Cidades, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social. E a expectativa é de que a portaria seja publicada nos próximos dias.
“A moradia é um pilar muito importante, não se ressocializa ninguém na rua. O primeiro passo para o início da ressocialização e retomada da vida das pessoas que estão na rua é a habitação. Com a entrega da habitação, outros serviços virão”, afirma Flávio Lino, secretário executivo do Movimento Nacional da População de Rua.
Lino é morador do Rio de Janeiro, segunda cidade com maior população em situação de rua, atrás apenas de São Paulo. Ele conta que o MNPR surgiu a partir “da força e resiliência” de um grupo após a chacina da Praça da Sé, que matou sete pessoas e deixou seis gravemente feridas, em 2004, com indícios de participação de policiais militares. Nos anos 90, outro evento semelhante também foi destaque no noticiário, a Chacina da Candelária, no Rio de Janeiro.
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Segundo relatório do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, 48% da população em situação de rua está concentrada em apenas dez cidades brasileiras: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Fortaleza, Curitiba, Porto Alegre, Campinas e Florianópolis.
Nesse sentido, a medida do governo está prevista inicialmente para atender 38 cidades, com foco justamente nas capitais. A previsão é de que 3% das unidades habitacionais do MCMV sejam destinadas a pessoas que não possuem um teto, com prioridade para famílias com crianças e adolescentes, pessoas com deficiência, mulheres, grávidas, idosos, pessoas trans e indígenas.
Critérios de inclusão
“Nas ruas, temos homens, mulheres, crianças, idosos, egressos do sistema prisional, população trans, na maior parte pobres e negros, e todos eles sofrem além do preconceito da sociedade, muita violência e omissão do Estado, são vistos com olhos desumanos”, define Lino, que também teve trajetória de rua, no Rio de Janeiro.
Para poder participar do programa, há alguns critérios estabelecidos, dentre eles: estar em situação de rua há pelo menos seis meses, possuir cadastro no sistema do CadÚnico, ser acompanhado pela rede socioassistencial do município e apresentar condições de transição para uma moradia definitiva a partir de uma avaliação de uma equipe intersetorial.
“Ficamos receosos com a questão do uso da base de dados do CadÚnico porque sabemos que boa parte dessa população não está lá, vamos precisar debater isso após o lançamento da portaria”, destaca o secretário-executivo do movimento. Segundo o Observatório da População em Situação de Rua, da Universidade Federal de Minas Gerais, a partir da base de dados desse sistema, houve um crescimento de 25% desde 2023 — o número ultrapassa 327 mil pessoas nessa condição.
“É um avanço para a nossa luta, com certeza. Queremos ter um bom engajamento para poder ampliar ainda mais, junto com essas pessoas que serão futuramente ex-moradores em situação de rua; estou muito feliz”, comenta Lino.
Políticas públicas
A iniciativa de integração ao Minha Casa, Minha Vida surgiu a partir da elaboração do “Plano Ruas Visíveis”, lançado em 2023, com o objetivo de efetivar a Política Nacional para a População em Situação de Rua, instituída via decreto em 2009, na segunda gestão de Lula.
“Hoje, os estados e municípios cumprem o decreto da forma que bem entendem, gostaríamos que o decreto pudesse virar lei para ter orçamento e ser cumprido o que está delimitado nele”, diz Flávio Lino.
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Em 2023, anterior ao lançamento do Ruas Visíveis, o ministro Alexandre de Moraes havia dado um prazo para que o governo organizasse um plano nacional no sentido de apresentar caminhos para a resolução do problema. Essa decisão do Supremo Tribunal Federal determinou ainda que os estados e municípios não podem realizar obras com arquitetura hostil, recolhimento forçado de pertences pessoais e remoção compulsória de pessoas, além da capacitação de agentes para dar tratamento digno e divulgação prévia dos horários de serviços de zeladoria.
Além de participar ativamente na luta que cobra mais efetividade nas ações do governo, o representante do Movimento Nacional da População de Rua apontou que o processo de diálogo sobre o tema foi bastante conturbado nas tratativas do G20 Social, do qual participou no ano passado. “Nós perdemos a oportunidade de dar o exemplo e mostrar algumas das nossas práticas para outras nações que também sofrem com o problema”, conta.
Para Flávio Lino, a temática da população em situação de rua pode ser enfrentada de maneira global. “Historicamente, a população em situação de rua foi deixada para trás nas ODS [Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da ONU]. Não há conscientização dessas pessoas sobre o porquê delas estarem nessa situação e isso é importante porque a sociedade civil precisa se aproximar dessas pessoas sem medo de ser assaltada ou agredida. Isso também é papel do governo, criar mecanismos de informação, inclusive para evitar que mais pessoas caiam nessa situação”, pondera.