Letícia Delgado é uma entre os 3.130 vereadores e vereadoras que se elegeram no dia 6 de outubro pelo PT. Candidata pela primeira vez, obteve 3770 votos, e vai ocupar uma vaga na Câmara Municipal de Juiz de Fora.
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Letícia Delgado é uma entre os 3.130 vereadores e vereadoras que se elegeram no dia 6 de outubro pelo PT. Candidata pela primeira vez, obteve 3770 votos, e vai ocupar uma vaga na Câmara Municipal de Juiz de Fora

A candidatura de Letícia Delgado a veradora de Juiz de Fora no último pleito atendeu a um chamado especial: o da prefeita Margarida Salomão, a primeira mulher reeleita em Juiz de Fora (PT-MG). “Eu acho que você poderia ser candidata, porque você realiza um trabalho muito bom, as pessoas reconhecem, acho que vai ser muito importante para o PT” disse-lhe a prefeita em uma reunião. 

Ocupou a secretaria de segurança pública na gestão de Margarida e desempenhou um papel crucial na segurança pública de Juiz de Fora, adotando uma abordagem prática e de proximidade para resolver problemas complexos da cidade. 

Focada em estar presente nos locais que necessitavam de intervenção, Letícia construiu uma reputação positiva por sua capacidade de se envolver diretamente na resolução de questões. Durante sua gestão, ela adotou uma postura de debater a segurança pública de forma intersetorial, promovendo a ideia de “segurança como um direito”

A bancada do PT em Juiz de Fora terá quatro vereadores, três foram reeleitos. Letícia tomará posse em janeiro e pretende levar sua experiência e aprendizado da secretaria para o legislativo, fortalecer o diálogo com o PT e outras organizações, além de expandir a discussão sobre segurança para novos espaços. Ela explica nesta entrevista à Focus sua visão de colaboração e inovação, e seu compromisso em qualificar o legislativo e influenciar positivamente na governabilidade da cidade. 

A eleição da prefeita Margarida Salomão já no primeiro turno foi uma espécie de consagração da gestão em todos os níveis e você era a secretária de uma pasta que é problemática, quer dizer, ela conseguiu imprimir uma marca na cidade muito forte.

Sim, foi a primeira vez que a gente teve alguém que se reelegeu em Juiz de Fora, então simbolicamente é muito forte: uma mulher, uma continuidade da gestão com alta aprovação. Para o PT também fizemos quatro, a gente tinha três vereadores, os três foram reeleitos.  Eu fui a única que entrei agora de primeira, fiquei super satisfeita. É a primeira vez que eu sou candidata, uma chapa dificílima, dificílima, tinha candidato que estava com recall de deputado estadual, pessoas que estavam tentando outras vezes, ex-vereadores, então eu fiquei muito satisfeita, até porque a gente estava trabalhando uma pauta muito complicada. Por mais que a gente quisesse dar para a ideia da segurança essa percepção mais intersetorial e de que quando você discute segurança, você está discutindo a cidade, as pessoas ainda têm uma desconfiança quando você fala de segurança, sabe? Foi uma campanha muito boa de fazer, mas muito difícil em termos de comunicação, de como é que você ia lidar com isso, mas foi legal. Eu estou bem satisfeita, cansada, mas satisfeita.

Você saiu da academia, com uma carreira muito consolidada, vai para um cargo no executivo e faz um trabalho excepcional e, candidatando-se, você se elege com um número de votos bastante expressivo, Como foi esse chamado?

Então, por mais espantoso que possa parecer, foi um movimento muito natural. Eu sou formada em Direito e acabei entrando no mestrado e depois no doutorado na área de segurança pública por um chamado para compreender o problema da cidade. Sempre fui uma pessoa que, embora estivesse na academia, dando aula e tal, me preocupava muito com a dinâmica de Juiz de Fora: por que a violência estava aumentando ou não. Então, já entrei no mestrado e no doutorado pensando em como essas pesquisas e esse arcabouço teórico, que eu iria conseguir desenvolvendo pesquisa, poderiam me ajudar a compreender a dinâmica da violência, da insegurança ou da segurança na cidade. Sempre considerei minhas pesquisas de doutorado e mestrado como instrumentos para entender essas dinâmicas. E aí, quando a Margarida me chamou para ser secretária, foi um desafio, mas eu pensei: é a oportunidade que tenho para ver até que ponto esse arsenal teórico e essas pesquisas que eu fiz podem me ajudar a implementar uma política municipal de segurança, ajudando como gestora a resolver problemas reais. Foi dentro dessa dinâmica: como aliar o aprendizado teórico com os problemas reais de uma cidade como Juiz de Fora, que enfrenta problemas de insegurança, com muitas disputas de narrativa. Quando a Margarida me convidou para ser candidata a vereadora, inicialmente foi um susto. Eu pensei: será que é assim? Eu era secretária e achava que estávamos fazendo um trabalho que, mal ou bem, estava avançando como uma referência de um município que tinha conseguido estruturar uma política municipal. Mas percebi que precisamos ocupar esse espaço de poder no legislativo, já que, muitas vezes, é negligenciado, especialmente em âmbito municipal, como um ator que pode pensar em soluções para uma sociedade mais inclusiva e justa, onde, de fato, os direitos sociais, e a segurança é um direito social, sejam garantidos para todas e todos. Foi um desafio, mas eu gosto de desafios, então foi interessante.

Gostaria que você desenvolvesse o que é o “sentimento de segurança” que você defende, dentro do conceito de segurança pública que você trabalha.

Eu acredito que precisamos falar mais sobre segurança; essa é uma questão que defendo e mencionei muito durante a campanha. O grande desafio hoje é democratizar a segurança pública, mas democratizar a segurança pública parte da premissa de que a gente tem que começar a falar sobre segurança pública fora também das esferas que discutem isso institucionalmente, falar só de segurança pública para as instituições policiais, têm o seu lugar, mas não resolve o problema. Precisamos incluir os cidadãos na discussão sobre segurança pública, por quê? Porque o medo, a insegurança é um sentimento, correto? Eu me sinto insegura ou me sinto segura a depender de várias variáveis que não são, necessariamente, objetivas. Eu posso estar numa cidade onde os indicadores de violência estão diminuindo e me sentir insegura porque eu tenho um vizinho que passou por um fato específico. Então precisamos entender que o medo afeta as pessoas de uma forma que, muitas vezes, não tem uma racionalidade ou não condiz com aquilo que está acontecendo na cidade. Quando você é gestor de segurança pública e não compreende essa variável emocional, pode se perder um pouco. Precisamos entender que, mesmo em uma cidade com indicadores de violência em queda, o sentimento de insegurança pode ser influenciado e construído de várias maneiras. Isso pode acontecer pela forma como a imprensa aborda os temas de segurança, pela percepção pessoal das pessoas ou devido a uma representação nacional de insegurança que faz com que se sintam inseguras na cidade. Quando a gente começa a criar espaços democráticos e abertos à população para discutir segurança pública, nós temos, enquanto gestores ou pessoas que fazem política ou se interessam pela temática, mas que têm responsabilidade social com as suas falas, a possibilidade de explicar para as pessoas o que é insegurança, tá certo? Podemos ajudar as pessoas a entender que um ou dois episódios não tornam necessariamente uma cidade  insegura, promovendo assim uma racionalização do medo. É essencial ser honesto sobre a situação: reconhecendo que, se não está bom, precisamos perguntar o que podemos fazer para melhorar. Trabalhar com segurança pública envolve entender que a insegurança mexe com os afetos, especialmente o medo, e é necessário abordar isso sem julgar as pessoas. Por isso, sou tão fã dos conselhos municipais de segurança pública e acredito na importância de regionalizar esses conselhos e realizar conferências de segurança. Além disso, capacitar lideranças nos bairros para que possam discutir segurança e interagir com o poder público é fundamental. Isso ajuda a interpretar os indicadores e explicar a realidade para a população, fortalecendo o vínculo com a comunidade. É crucial perceber que, para jovens e negros, a sensação de insegurança envolve fatores adicionais, muitas vezes relacionados às instituições policiais. Precisamos criar espaços de diálogo para construir narrativas que façam sentido para a sociedade. Sem isso, as pessoas podem não entender nossas mensagens, especialmente quando são afetadas pelo medo, que dificulta a racionalização. A insegurança mexe com uma coisa muito séria para a gente, que é a previsibilidade. Porque, mal ou bem, quando a gente fala de segurança, o que eu quero? Eu quero ter previsibilidade. Previsibilidade que eu vou sair de casa, vou trabalhar, vou voltar e minha casa vai estar ok. Que meu filho vai para a escola, vai voltar da escola e vai estar tudo tranquilo. Então, a ideia de insegurança, ela mexe com uma coisa que é muito cara para todos nós, que é a previsibilidade que a gente vai estar vivo, de que os nossos filhos vão estar bem.  Compreender esses elementos relacionados à segurança pública é essencial para, como gestores e políticos, desenvolver políticas que realmente façam sentido na vida cotidiana das pessoas.

Você pode dar exemplos concretos de projetos que foram bem sucedidos? 

A primeira coisa que consegui foi sensibilizar a Margarida, que se mostrou uma parceira e líder neste processo, por isso conseguimos implementar em Juiz de Fora uma política municipal de segurança bem-sucedida, resultando na redução dos indicadores de violência. Tivemos agora um cenário muito específico, onde os dois principais concorrentes de Margarida tinham a segurança pública como pauta principal: uma candidata era delegada e o outro era deputado, marido de uma delegada. Assim, segurança foi o tema central da campanha, e nós tínhamos resultados concretos para apresentar e criar contra-argumentos dentro da campanha. Desde que assumi a secretaria, sempre discutia com Margarida que precisávamos parar de temer falar sobre segurança. Não adianta se esconder e dizer que segurança pública é apenas responsabilidade do Estado, porque o cidadão, que vive na cidade, não compreende o pacto federativo dessa forma. Se nos escondêssemos atrás desse arranjo federativo, acabaríamos perdendo. Essa percepção foi algo que eu trouxe do mestrado e doutorado. Os prefeitos precisam se apropriar da questão da segurança, mas de uma forma que tenha responsabilidade argumentativa. A primeira coisa que fizemos foi estabelecer que teríamos uma secretaria de segurança para gerenciar essa pauta com responsabilidade, sem entrar na competência, mas sem medo de falar sobre segurança e investindo, principalmente, em políticas de prevenção que fizessem sentido para a população. Uma das coisas que você ouvia na rua era: “como a Letícia mudou a Guarda”. A gente tinha uma guarda que não andava, uma guarda que não tinha identidade, uma guarda que não cumprimentava os cidadãos, uma guarda cujo papel era incompreensível. Então, um dos grandes desafios que tivemos foi construir uma identidade civil para a Guarda Municipal. A partir do momento em que roteirizamos o trabalho, fizemos protocolos de atuação e levamos a Guarda Municipal para os locais mais centrais da cidade para realizar um patrulhamento de proximidade, o que eu sempre entendi que fazia sentido para a guarda: a guarda é o Estado fardado na rua, entende? Então, a ostensividade da guarda deve ser utilizada para o fortalecimento da cidadania dentro de uma análise intersetorial. As pessoas começaram a notar como se sentiam mais seguras simplesmente pelo fato de haver mais guardas na rua, que agora cumprimentavam, ajudavam e sabiam explicar onde eram os serviços públicos da cidade. Assim, começamos a alterar totalmente a forma de trabalho da guarda municipal na cidade, criando algo que desse visibilidade, sentido e que não competisse com a polícia militar. E não foi nada fácil. Se vocês têm uma ocorrência mais complicada, precisam acionar a PM, não tentar resolver sozinhos. Então são essas questões mais sutis que implementamos. Uma outra coisa que funcionou muito bem para a gente foi que, como sempre tivemos um efetivo pequeno e ainda temos um efetivo reduzido, criamos um projeto de cultura de paz e prevenção de bullying junto às escolas municipais. Isso é tão importante para nós que talvez vocês não saibam, mas Juiz de Fora hoje é o projeto de referência do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O projeto que será replicado pelo Ministério nesse sentido é o que desenvolvemos aqui, em Juiz de Fora. Assim, começamos a nos aproximar das escolas, que tinham uma demanda significativa por segurança, mas que não sabiam exatamente como organizar o que precisavam. Muitas vezes, elas chamavam a guarda para questões de regulação pedagógica, como alunos indisciplinados, e assim fomos descobrindo diversas fissuras em relação ao conflito escolar, que acabavam gerando problemas externos, como bullying, racismo e falta de pertencimento racial. Isso se transformou em um projeto muito grande, que é o “Nossa Escola”, que depois virou o “GAP”. A partir daí, começamos a realizar muitas articulações intersetoriais na prefeitura. Estabelecemos parcerias com a Secretaria de Educação, o que me rendeu muito apoio nas escolas. Muitos diretores de escola me apoiaram na campanha, pois isso se tornou um suporte importante para a educação. As escolas perceberam: “se tivermos um problema e ligarmos para a Secretaria de Segurança, não virá alguém armado; virá uma equipe disposta a entender a dinâmica do conflito e a nos ajudar a oferecer ferramentas para solucioná-los”. Muitas vezes, a solução não está na repreensão, mas sim em uma capacidade de organização e diálogo. Essa abordagem se mostrou fundamental, e hoje temos uma agenda voltada para as escolas, que cresce de uma forma impressionante. Outra ação que realizamos e que considero muito importante, especialmente para a campanha, foi a criação de um observatório municipal de segurança e violência na cidade. Essa ideia surgiu em função da minha formação teórica como pesquisadora, já que fiz mestrado em Ciências Sociais. Para mim, não consigo desenvolver políticas públicas sem indicadores; isso me parece muito desorganizado. Sempre enfrentamos dificuldades em ter um fluxo consistente de compartilhamento de informações com as polícias. A integração no Brasil ainda é muito dependente de pessoas específicas, variando conforme quem é o comandante. Por isso, trabalhamos para ter uma autonomia mínima para a produção de indicadores na prefeitura, a fim de termos argumentos sólidos. Assim, estabelecemos um observatório em parceria com a Universidade Federal e a Secretaria de Saúde. Usamos dados do SIN (Sistema Interligado Nacional) e do SINAN (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), que são dados de notificação compulsória sobre alguns tipos de violência, além de dados abertos da Secretaria de Justiça e Segurança Pública. Isso se tornou especialmente útil durante a campanha, pois quando as pessoas diziam que a cidade estava insuportável e cheia de violência, nós podíamos responder: “Deixa te mostrar algo; os indicadores não refletem isso.” Com o observatório, conseguimos ganhar autoridade argumentativa para enfrentar o discurso de medo e insegurança generalizada que surge em qualquer campanha, uma tática da extrema-direita. A extrema-direita instrumentaliza o medo e, na minha hipótese, que posso estar errada, isso ocorre porque muitas vezes as forças progressistas não estão preparadas para lidar com essas informações. Precisamos de um arsenal argumentativo para sustentar nossos pontos de vista, pois creio que o eleitor, ao ouvir um argumento, muitas vezes reage dizendo: “Não, peraí, não é bem assim.” Os vídeos que gravei rebatendo informações incorretas e distorções eram os que mais geravam visualizações, pois as pessoas começavam a perceber: “Não, espera, não é exatamente isso que está acontecendo.” Portanto, é fundamental que o município invista nessas iniciativas. Outra ação que realizamos e que foi muito importante foi o fortalecimento do uso da tecnologia para a segurança. Juiz de Fora é uma cidade grande, próxima do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, e enfrentamos, de fato, problemas com facções criminosas. No entanto, não tínhamos nem câmeras de videomonitoramento funcionando corretamente; eram 54 câmeras, mas cerca de 30 não estavam operacionais. Em uma conversa com a Margarida, disse a ela que precisávamos investir em tecnologia. Hoje, temos 333 câmeras na cidade, todas com capacidade de inteligência artificial, abrangendo entradas e saídas em locais que antes estavam descobertos. Sempre pensamos em uma construção conjunta com as Forças de Segurança e investimos muito em espaços de integração. Precisamos ouvir essas forças e saber o que elas pensam, mas sem ceder. Eu sempre dizia: “Eu trabalho com as forças policiais, eu não trabalho para as forças policiais; eu trabalho com as forças policiais.” Esse entendimento foi crucial para as ações que implementamos. Recentemente, conseguimos um convênio para Juiz de Fora, com um investimento de 17 milhões do PAC, destinado a uma área de alta vulnerabilidade social. Identificamos essa área por meio dos projetos nas escolas, o que também foi uma descoberta importante em nosso trabalho.  Nós sempre priorizamos a implementação de projetos de prevenção e também trabalhamos em iniciativas com as penitenciárias para criar protocolos para egressos, o que considero extremamente importante. Assim, seguimos fazendo várias ações nesse sentido. Outro ponto fundamental que sempre ressalto é nosso investimento em comunicação estratégica, algo que Margarida apoiou. Eu dizia a ela: “Precisamos falar sobre segurança.” Na prefeitura, eu era a secretária que mais se preocupava com a comunicação. Tudo, absolutamente tudo, que fazíamos virava notícia. Produzíamos notícias positivas sobre qualquer ação, por menor que fosse. Sempre fiz questão de que essas informações fossem divulgadas na imprensa e nas páginas da prefeitura, porque acreditava que precisava criar uma narrativa positiva sobre segurança. Se deixássemos a segurança ser abordada apenas de uma perspectiva negativa, nunca conseguiríamos vencer o jogo da narrativa. Portanto, divulgávamos tudo, desde uma festinha na escola em que um guarda participava até a implementação de novas câmeras. Queríamos que tudo fosse noticiado para criarmos uma visão otimista da segurança. Segurança enquanto um direito que garante outros direitos.

Você levantou um ponto importante sobre o policiamento de proximidade, especialmente em grandes cidades como Juiz de Fora, Rio de Janeiro e São Paulo. A guarda municipal desempenha um papel essencial não apenas na segurança, mas também na resolução de conflitos e na inibição de crimes comuns. A colaboração entre municípios e a interligação com as polícias são fundamentais.. Eleger pessoas comprometidas com a segurança é crucial para educar nosso partido, que ainda reluta em discutir o tema. É vital ouvir as necessidades da população, já que a sensação de segurança gerada pela extrema-direita é fácil de criar. Ter representantes que estão nas ruas, como você, é essencial para nossa causa. Gostaria que você compartilhasse mais sobre sua experiência.

Eu acho que você trouxe uma questão muito importante que eu ia mencionar, mas acabei esquecendo. Desde que o Lula ganhou, sempre investiu em uma relação com o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Estive em Brasília algumas vezes, pois também tenho uma proximidade grande com o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Segurança. Fui vice-presidente do Conselho, mas agora vou ter que sair. Fiz muita questão de cultivar essa relação próxima com o Ministério da Justiça, porque acredito que o papel desse ministério é induzir políticas de segurança. Assim, o papel de uma política nacional de segurança pública é estruturar, em termos macro, o que se pretende para a política nacional de segurança e induzir políticas em âmbito municipal. E você pode induzir políticas de várias formas, inclusive por meio do financiamento daquilo que se entende como importante. Por exemplo, nós aqui aderimos ao Cortex e ao SineespAC, e preciso dizer uma coisa para vocês: não temos noção do que o Sinesp CAD, através do Ministério da Justiça, significa para a gestão de segurança pública em nível municipal. Isso representou uma economia significativa para nós, é uma organização no trabalho da Guarda. Eu diria que a Guarda Municipal de Juiz de Fora passou por um antes e um depois da implementação do SinespCAD, que é uma plataforma gratuita do Ministério da Justiça e Segurança Pública e que é extremamente importante. Então, esse sentimento que eu tinha de que precisávamos nos aliar à política nacional de segurança e aproveitar o que o Ministério da Justiça oferece foi fundamental. Conseguimos conquistar alguns recursos nesse sentido. No entanto, acredito que o Ministério da Justiça deve assumir a responsabilidade de pautar a política em âmbito nacional e induzir, em nível municipal, algumas políticas estratégicas, inclusive com financiamento. Sabemos que os municípios são extremamente dependentes de repasses do Governo Federal e que a política de segurança é cara e complicada. Muitas vezes, os prefeitos não têm condições de arcar com esse tipo de tecnologia e investimento. Por isso, é essencial que pensemos, em termos estruturais, como o Governo Federal pode abordar essa questão. Uma coisa que venho aprendendo, e que a campanha me ensinou muito, é que precisamos combinar nosso conhecimento teórico e prático com a percepção que a rua nos traz. Para quem está interessado em fazer política, seja com mandato ou não, ouvir as pessoas é fundamental. Resolver problemas apenas na teoria pode levar a soluções que não funcionam na prática.  Assim, acredito firmemente que o processo de democratização da segurança pública passa pela escuta ativa da população. O sistema de justiça criminal também precisa se aproximar mais das pessoas, e aqui eu coloco a Defensoria Pública, o Ministério Público e o Poder Judiciário eles também precisam se aproximar mais da população e devem criar espaços de escuta real, para que possamos desenvolver soluções coletivas. Afinal, boas soluções que não consideram os problemas reais muitas vezes não trarão resultados eficazes.

Em Minas Gerais, de um modo geral, o desempenho da segunda e terceira geração de petistas foi muito bom. Temos o sobrinho da ex-presidenta Dilma Rousseff, Pedro Rousseff que se elegeu, o filho do Patrus Ananias e Luiz Dulci também. Temos duas prefeitas reeleitas no primeiro turno. Como é que essa experiência pode ser aproveitada nacionalmente, como ela pode ser usada para contrapor o discurso de que a esquerda fracassou?

Eu acompanhei de perto os resultados em Belo Horizonte, Juiz de Fora e Contagem, e, sinceramente, Marília e Margarida deram um show. Elas foram reeleitas dentro de um contexto de cidades muito estratégicas para Minas Gerais, e isso precisa ser muito, muito valorizado no PT. Essas reeleições são muito simbólicas. Em Juiz de Fora, nunca tivemos um prefeito reeleito, e a Margarida conseguiu se reeleger no primeiro turno, mesmo enfrentando dificuldades, como competir com uma deputada federal, um ex-deputado federal e o filho de um político muito tradicional. Além disso, no PT de Juiz de Fora, formamos a maior bancada da Câmara, o que é um grande feito. Minha sugestão é que o partido organize um pouco esse saldo positivo que conquistamos. Precisamos estruturar esse reconhecimento para termos um discurso mais uniforme e, assim, colaborar de maneira conjunta, além de refletir sobre os desafios que ainda nos aguardam. Eu sempre digo que estamos aqui pensando hoje, mas também olhando para o amanhã. Temos um grande desafio em 2026, e sabemos disso melhor do que ninguém. Essa data está se aproximando rapidamente, e precisamos pensar na reeleição do presidente Lula, além dos deputados e deputadas federais e estaduais. É importante lembrar que a política começa nas cidades. Acredito que o Partido dos Trabalhadores precisa nos ajudar a organizar esse saldo positivo para que essas alegrias, para que nossas conquistas não fiquem dispersas ou se transformem em projetos pessoais. Precisamos ter uma visão coletiva, porque esse é o nosso desafio: fortalecer o PT. Eu penso assim e a minha eleição foi um resultado do meu esforço, mas não é um projeto individual; é um projeto coletivo de um partido que acredita em um modelo de sociedade construído por meio da colaboração. Um projeto de partido que a gente acredita num modelo de sociedade que é construído por um partido. E a gente precisa organizar isso. 

O que você destacaria do seu trabalho como secretária e como ter sido secretária impacta sua ação como vereadora?

Ser secretária me ensinou muito sobre gestão. Tentei, enquanto ocupava o cargo, manter uma gestão muito próxima dos problemas que precisava resolver. As pessoas que trabalhavam comigo sabem que eu nunca fui uma secretária de gabinete. Se havia um problema, eu ia até o local para entender a situação. Isso me ensinou bastante, pois os problemas da cidade são complexos e exigem um olhar específico para aquilo. Isso me ajudou muito na campanha, pois conheci muita gente. Muitas pessoas passaram a ter uma referência positiva de mim durante meu tempo na secretaria de segurança, porque sempre que havia um problema, por exemplo, em uma escola, a Letícia estava lá no sábado de manhã para resolver, minha gestão como secretária me ensinou bastante. Foi, de fato, minha primeira experiência como gestora e foi extremamente importante, especialmente para perceber que preciso estar próxima dos problemas, entende? Esse tipo de gestão, mais próxima, definitivamente me ajudou na campanha também. Não foi uma campanha nada fácil; foi uma campanha bastante complicada. Como eu disse, era uma chapa muito forte do PT e, ao mesmo tempo, sabemos que podemos ajudar a eleger um colega, mas também entramos na disputa com a intenção de vencer. E eu senti muito na campanha como as pessoas ainda têm uma incompreensão da segurança.  Muitas vezes pensam: “Ah, Letícia foi secretária, então vai defender o uso de armas” ou coisas do tipo. Creio que esta eleição teve um papel pedagógico importante, proporcionando um debate sobre segurança de forma intersetorial, abrangendo diversos ramos das políticas sociais, e destacando que segurança pública não se resume a “tiro, porrada e bomba”. Podemos, sim, discutir a segurança como um direito. Na Câmara, os desafios serão diferentes, obviamente, mas meu objetivo é permanecer próxima das pessoas, da cidade, e levar essa dinâmica adiante. Também quero fortalecer meu diálogo com o PT de Minas, que ainda não é tão próximo, e tentar ajudar o Partido dos Trabalhadores a organizar e ampliar o debate sobre segurança, claro, se houver espaço para isso.

Você volta para a secretaria?

Não, quero ser vereadora. Acredito que precisamos qualificar o legislativo. Para garantir a governabilidade na próxima gestão da Margarida, também precisamos de apoio na Câmara. Confesso que, quando me lancei como candidata, havia dúvidas, como “Será que você volta?” Mas a campanha me mostrou que as pessoas votaram em mim para ser vereadora. Para mim, isso ficou muito claro. Quero ter essa experiência no legislativo, pensar em levar esses debates com mais tranquilidade para outros lugares. Também quero fazer essa interlocução com vocês, dialogando com o PT e com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que é uma instância com a qual tenho bastante contato, levando o debate sobre segurança para outros espaços possíveis.

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