Gleide Andrade: ‘Precisamos pautar a eleição com a vida do povo, é isso que devemos discutir’
Secretária Nacional de Finanças e Planejamento do PT, a mineira Gleide Andrade tem apresentado resultados favoráveis à saúde do Partido dos Trabalhadores em sua gestão. Enfrentando agora mais um início de processo eleitoral decisivo, Gleide conversou com a Focus Brasil sobre as expectativas do partido com relação às conquistas planejadas para 2024, estratégias eleitorais e um panorama sobre as finanças do partido
Fernanda Otero e Guto Alves
“Quando assumimos, a primeira coisa que fizemos foi uma reestruturação no PT, cortamos muitos custos”, conta Gleide Andrade, hoje Secretária Nacional de Finanças e Planejamento do PT, em conversa com a Focus direto de seu gabinete. O horário é exceção: a conversa seria às 20h, mas às 19h a agenda se abriu e adiantou-se: é período eleitoral, o tempo está curto.
Neste momento, diretórios petistas de todo o país discutem as já homologadas pré-campanhas, numa difícil equação de atender demandas e anseios de diversos quadros, desde as bases às candidaturas-chave. “Tudo foi discutido e aprovado de forma democrática”, garante a secretária, adiantando-se a possíveis contendas.
O otimismo é o tom de suas afirmações: para Gleide, o PT tem a frente um grande desafio, de um caminho aberto para ampliar atuação e se preparar para 2026, ativando, inclusive de forma mais ativa, a militância filiada ao partido.
“Uma política mais rígida, pois o PT nasceu da contribuição dos seus membros, e não podemos esquecer disso”, explica. ” Nós voltamos a fazer uma cobrança muito grande em cima dos filiados, sobretudo aqueles que ocupam cargos eletivos ou de confiança.”
Gleide também faz parte do Grupo de Trabalho Eleitoral, que começou a se organizar em 2023 e garante ter sido acertada a decisão de antecipar o debate eleitoral – mas olhando para o futuro. “Precisamos terminar a eleição e já virar a chave para 2026. Em 2026, não podemos esquecer que precisamos reeleger o presidente Lula”, determina.
Profissionalismo e resiliência
Reconhecida, como comum a mulheres que ocupam espaços de poder, pela chamada política de austeridade na condução das contas petistas e pela personalidade profissional, Gleide se apresentou determinada ao apresentar os resultados de seu trabalho e emocionada ao relembrar da colega de trabalho, a presidenta do partido Gleisi Hoffmann e do desafio de conduzir a militância e a máquina partidária com o presidente Lula preso, a perseguição política e Dilma golpeada. “As pessoas precisam entender o papel histórico dela”, diz sobre Gleisi.
Gleide Andrade de Oliveira nasceu em Carmo do Cajuru, centro-oeste de Minas Gerais. Passou parte da infância em São Paulo, mas retornou com sua família para Belo Horizonte. Cursou Filosofia na PUC-MG, onde se tornou presidenta do Diretório Central dos Estudantes e ajudou na reconstrução da União Estadual dos Estudantes. Em 1992, após o partido vencer as eleições municipais em Belo Horizonte, ela foi convidada a integrar a gestão de Patrus Ananias. Durante esse período, ela colaborou com importantes iniciativas como o Orçamento Participativo e o Conselho Municipal das Mulheres, ambas precursoras e fundamentais para a inclusão social e equidade de gênero na cidade.
No Diretório Nacional do PT, ocupou a vice-presidência do partido e a secretaria de Organização, onde coordenou campanhas nacionais como a pela Reforma Política. Durante o processo de “caçada ao partido”, ajudou na criação dos comitês Lula Livre, fortalecendo a militância.
Você fez parte desse grupo de trabalho eleitoral que começou a se reunir há mais de um ano, e tem muitas candidaturas, com possibilidades reais de vitória, principalmente em um momento onde precisamos tanto do projeto petista em prática. Queria que você começasse avaliando como foi essa construção e se você acha que o resultado das principais candidaturas ficaram dentro do que vocês planejaram.
Primeiro, acho que acertamos muito na tática ao antecipar o debate das eleições deste ano. Começamos o debate em setembro do ano passado, e em novembro já havíamos acertado várias candidaturas, ou seja, antecipamos o debate interno eleitoral do PT. Isso foi muito salutar para o PT. Primeiro, porque fizemos com que o partido começasse a definir com muita antecedência sua chapa de vereadores e vereadoras e suas candidaturas. Pudemos, então, testar essas candidaturas. Acho que o resultado foi muito bom, vamos disputar em torno de 13 capitais. Existem capitais onde estamos disputando com chances reais. O dado ainda pode mudar, tá? Eu diria, por exemplo, que em Teresina, devemos ganhar no primeiro turno. Estamos bem posicionados em Porto Alegre, Goiânia, Cuiabá, João Pessoa, Vitória, e disputando bem em outras capitais. Em Belo Horizonte, estamos disputando muito bem. Então, eu entendo que acertamos na tática quando antecipamos. Segundo, acertamos na tática quando decidimos que a estratégia para 24 não era lançar candidatos em todos os lugares como foi em 2020. Em 2020, saímos de um processo de caçada ao PT, de um enorme sofrimento, golpe, prisão do presidente, perseguição total, é o que eu chamo de caçada, e precisávamos então “desibernar o PT. Então, foi muito importante colocar candidatos em todos os lugares. Este ano, nossa tática foi o quê? Derrotar o bolsonarismo. Então, em várias capitais do país, estou falando mais das cidades grandes, com mais de 100 mil habitantes, foi uma política muito correta. Então, por exemplo, quando optamos por não ter candidato em São Paulo, no Rio, em Recife, é porque entendemos que o mais importante é derrotar o bolsonarismo, é derrotar o fascismo. Então, esse desprendimento também foi muito importante para o PT, muito importante para nós. E vale, descendo das capitais, para as cidades com segundo turno. Sacrificamos muitas cidades nossas, mas em nome de um projeto maior. Então, aquilo que as pessoas veem como um sacrifício não é um sacrifício; é que vamos perceber o resultado mais à frente. Eu poderia dizer, por exemplo, de Maceió. Retiramos a candidatura em Maceió para apoiar o MDB, mas é um MDB que sempre esteve conosco, é o MDB do nosso ministro. Então, isso também foi importante. É um exercício de democracia, é um exercício de desprendimento, não é fácil.
Essa fala sua sobre Maceió com o MDB, acho que ela é educativa. Essa aliança é educativa, no sentido de que o país é muito diverso e o PT é muito diverso, é importante a militância entender o porquê de certas alianças. Então, aliar-se ao MDB em São Paulo é uma coisa, em Brasília é uma coisa, lá em Maceió é outra coisa…
É outra pegada, exatamente. Então, acho que isso fará com que, no dia 6 de outubro, aquele mapa não seja mais PT e… Você se lembra? Antigamente, era a Estrelinha ou o Tucano. Agora será sobre quem defende a democracia e quem não defende, vai ser muito isso. Ou seja, vai ter o time do Lula e o time do Bolsonaro, porque as eleições também estão muito polarizadas. Veja que o Bolsonaro está fazendo um movimento de muita retirada de candidatura, para tentar concentrar também. A retirada do Kim Kataguiri, por exemplo, expressa esse movimento. Acho que se nossa tática foi derrotar o fascismo, a tática deles também… Eles pegaram nossa tática na antítese, parece que eles estão tendo essa mesma leitura. Então, será uma eleição muito polarizada no Brasil inteiro. Por isso, o PT ter antecipado seu calendário foi muito importante. Assim, nesse período, pudemos fazer muita pesquisa. Nós fizemos muita pesquisa em cidades com segundo turno, mais de 50 pesquisas, quantitativas. Então, eu diria para você que estamos entrando nesta eleição com um raio-x bem honesto. Acho que a direção nacional do PT sabe onde está disputando, sabe onde teremos possibilidade real de vitória, vitória eleitoral, e onde teremos vitória política, que também é muito importante. Acho que a nossa tática foi super acertada, e nas cidades menores onde não temos tanto controle, porque depende muito dos diretórios estaduais, eu acredito que o critério será o mesmo. Por exemplo, no meu estado, Minas Gerais, com 853 municípios teremos, no máximo, 250 candidaturas. É por falta de candidato? Não, não é. Em Minas, o PT está organizado em mais de 600 municípios. É porque houve essa compreensão. Nós retiramos agora, o que foi um trauma para nós, a candidatura de Ipatinga em detrimento de Governador Valadares, que é uma prefeitura que a gente lidera. É muito difícil não ganhar Governador Valadares, entendeu? Mas, enfim, eu acho que nós acertamos a tática e o que nós aprovamos foi correto.
Qual o panorama atual para as eleições em Belo Horizonte e em Minas Gerais. Você acha que o Nikolas Ferreira vai encabeçar a disputa em 2026?
Sou formada em filosofia e acredito que em Belo Horizonte está ocorrendo um fenômeno do ponto de vista da fenomenologia. O candidato do Bolsonaro e do Nikolas Ferreira é o Bruno Engler, e uma parte significativa da direita migrou para o Mauro Tramonte. Para surpresa de todos nós, o Alexandre Kalil, que todos achavam ser um democrata, foi para lá também. Agora há uma disputa dentro do Novo, estão em uma grande crise, porque acho muito difícil conseguirem retirar um candidato em detrimento do outro. O Carlos Bolsonaro entrou na defesa do Bruno Engler e o Romeu Zema está apoiando o Tramonte. Então há uma grande disputa entre eles, e ainda tem o senador Carlos Viana, que também é um bolsonarista mais moderado. Então acho que temos uma avenida ali para avançar. Honestamente, sentimos muito que a Duda Salabert não veio para a nossa aliança no primeiro turno. Mas também compreendemos e esperamos que todos se alinhem no segundo turno. Acredito que há uma briga de titãs entre o time do Nikolas e o time do Zema. O que está em jogo é o futuro da disputa para o governo de Minas, cujo candidato, a princípio, parece ser o senador Cleitinho. E não sabemos efetivamente o que Nikolas irá fazer. Eu acho que não é possível que eles venham com um… Não é possível que Nikolas… Eu considero tão inadmissível ele poder ser candidato ao governo. Mas enfim, de fato, ali é o foco desse grupo… Temos o Nikolas, o Cleitinho… O Zema, quer dizer, é um cenário muito conturbado. A extrema-direita está muito enraizada ali. Por isso também a campanha do Rogério Corrêa é muito importante para o PT.
O PT tem feito esse exercício de dialogar com outros partidos, enquanto eles não conseguem dialogar entre si. Será que não conseguimos explorar isso de alguma forma e mostrar para as pessoas a grande diferença que existe entre a democracia que praticamos e a maneira como eles não conseguem se entender nem dialogar?
Eles estão mostrando as vísceras deles. Se tem uma palavra que não existe no dicionário deles é cordialidade, educação. Então, é tudo muito visceral. As relações deles são uma excrescência. E quem acompanhou os jornais neste final de semana viu um pouco isso… Porque também, vamos combinar, que coisa feia para o Kalil, não é? Eu acho que essas contradições, elas aparecem e acho que tem coisa que o eleitor não entende, pois são coisas difíceis de entender. Por exemplo, eu acho que o eleitor não entenderá uma aliança entre Zema e Kalil. Espero que a nossa campanha consiga mostrar isso para o eleitor, o eleitor tem que saber disso. Eu acho que tem coisas que o eleitor não consegue assimilar. Também acredito que a nossa campanha, a campanha do Rogério, precisa ter em Belo Horizonte um papel pedagógico, educativo e informativo, mostrando à população o que realmente está em jogo, o que está efetivamente em disputa. A eleição de Belo Horizonte, assim como a de São Paulo, é uma eleição nacionalizada. Aliás, acredito que a grande maioria das eleições nas capitais será bastante nacionalizada. Isso é diferente das eleições em municípios menores, onde as pessoas discutem mais o território e se concentram em temas como obras, saúde e educação. Nas capitais, a abordagem é diferente. Por isso nossa tática de enfrentar o fascismo foi correta, porque muitas eleições municipais serão guiadas pela pauta de costumes que eles tentarão trazer para o debate, além das pautas nacionais. Assim, será uma eleição muito nacionalizada.
Do ponto de vista de estratégia eleitoral, o PT vai defender ou, digamos, entrar nessa pauta de costumes? Como articular e municiar o eleitor e o militante para lidar com esse tipo de disputa de discurso nas redes?
A nossa orientação, do PT e da Fundação, que prepara muito conteúdo, é que não podemos ser fisgados por essa pauta; não podemos escorregar nessa casca de banana. Precisamos pautar a eleição com a vida do povo, é isso que devemos discutir com as pessoas. Por isso digo que nossa eleição cumpre um papel pedagógico, de mostrar para as pessoas como a vida melhorou: o aumento real do salário mínimo, o crescimento do emprego formal, os programas sociais, quantas pessoas eram atendidas e quantas são hoje. Por exemplo, temos feito algo muito interessante no PT, que vou descrever para vocês entenderem. É um material que queremos usar na campanha, uma ideia do presidente Lula, só para vocês terem um exemplo. Isso aqui é um boneco (mostrando um material impresso) não serão essas fotos. A ideia é mostrar o Lula e o Rogério e dizer: vejam o que o governo Lula já fez por Belo Horizonte. Queremos, do outro lado (virando o material) colocar as propostas que temos para a cidade. De um lado, o que já foi feito, e do outro, as propostas que o Rogério vai apresentar. Queremos preparar esse material para todas as capitais.
Como foi esse processo na sua gestão à frente da secretaria, de equacionar as dívidas anteriores, inclusive dívidas eleitorais, e colocar o PT saudável dessa maneira que está se colocando agora? Ainda sobre esse tema de finanças, tivemos muitas queixas na eleição anterior de que o dinheiro não chegou e etc, de que volume de recursos estamos falando para esta eleição e como os recursos serão distribuídos?
É importante dizer que, quando assumimos o PT, o partido tinha muitas dívidas. Dívidas oriundas de um sistema eleitoral inadequado, em que o peso do CNPJ era muito grande. Assim, tínhamos doações milionárias, porque as doações eram de empresas, e também acumulávamos dívidas milionárias. Em 2016, foi proibido o financiamento empresarial, e o financiamento público só chegou em 2018. Ou seja, o PT herdou um montante significativo de problemas, com passivos e dívidas das campanhas anteriores. Isso também é resultado da necessidade de termos um novo sistema eleitoral no Brasil. Os partidos não sobreviverão ao modelo atual. É tudo muito judicializado, as nossas prestações de contas são muito complicadas. O órgão, a ASEPA (Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias), é bastante burocrático, e os partidos são severamente punidos; eu diria que existe um excesso de punição sobre eles. Portanto, precisamos de um novo sistema eleitoral brasileiro, uma nova reforma política, algo que provavelmente, nós não teremos. Trabalhamos muito todo esse tempo para quitar essas dívidas e limpar as contas. Quando assumimos, a primeira coisa que fizemos foi uma reestruturação no PT, cortamos muitos custos. Aqui mesmo, em Brasília, quando chegamos, ocupávamos cinco andares, e passamos a usar apenas dois. Realizamos todo tipo de economia que você possa imaginar, da menor à maior, inclusive nas viagens de dirigentes, cortamos muitos gastos para equalizar as contas. Também implementamos uma política mais rígida para com os filiados, pois o PT nasceu da contribuição dos seus membros, e não podemos esquecer disso. Nós voltamos a fazer uma cobrança muito grande em cima dos filiados, sobretudo aqueles que ocupam cargos eletivos ou de confiança. Agora, para a eleição deste ano, realizamos uma campanha de arrecadação com os filiados, especialmente com os candidatos; apertamos os gastos e instauramos uma política colaborativa. Recriamos a lojinha do PT, voltamos a promover jantares por adesão, festas unidas, esse tipo de evento que arrecada, movimenta e unifica, pois as pessoas passam a conviver.
O militante quer fazer parte, ele quer ajudar o partido…
Ele quer estar nessa vida orgânica. Voltamos a ter uma política de contribuição e cobrança muito forte em relação aos cargos eletivos. Então, por exemplo, pegamos o deputado e toda a sua assessoria, intensificamos essa cobrança, inclusive nos governos. Isso tudo ajudou muito na nossa situação financeira. Acredito que é uma política mais austera de finanças e sou muito criticada por isso; pela minha austeridade, sou bastante exigente, mas se não fosse assim, não teríamos conseguido tirar o PT do vermelho e recuperar o partido. Hoje, o partido tem as contas saneadas, respira melhor, não temos problemas. Não estamos, de forma alguma, dizendo que somos um partido rico, mas todas as nossas contas estão em dia. Pagamos muitas multas e outras despesas, então as contas estão equalizadas. Com relação ao fundo, quero dizer que primeiro, as pessoas precisam entender o seguinte: olhamos o valor total do fundo e falamos em R$ 619 milhões, é muito dinheiro. Mas é um recurso para um partido que tem 32 mil candidatos a vereadores e vereadoras e quase 1.300 candidatos a prefeito e prefeita. Então, esse dinheiro passa a ser muito pouco. É importante ver o fundo à luz da resolução do TSE. Como você analisa esse dinheiro? Divide em quatro quadrantes: homem branco, mulher branca, homem negro e mulher negra. E esses recursos não se comunicam. Então, qual é o problema? O problema é que não posso dizer que, por exemplo, sou candidata a deputada num contexto de 619 milhões. Na verdade, sou candidata a deputada no meu quadrante, que é o quadrante de mulher branca, temos que considerar isso. E nós fizemos isso este ano; aliás, gostaria de destacar que as nossas resoluções foram todas aprovadas por uma expressiva maioria no Diretório Nacional, e estou indo para o terceiro fundo que vou executar. Nós temos um grau de transparência no PT que poucos partidos têm. A nossa distribuição do fundo é toda feita pelo Grupo de Trabalho Eleitoral. Este ano, nós inovamos na forma como operamos. Agora, mandamos o recurso para as nossas cidades com mais de 100 mil eleitores. Contudo, quem decide e qualifica as chapas são os municípios. Em Belo Horizonte, que estamos usando como laboratório, é o diretório municipal que nos informa quem é o candidato G1, quem são os candidatos do primeiro, segundo e terceiro grupos. Assim, também aumentamos muito a nossa democracia interna na distribuição dos recursos. Discutimos isso e trouxemos a bancada federal e do Senado para nos ajudar nas decisões. Então, quando alguém diz que o candidato a prefeito de tal cidade está reclamando porque recebeu pouco, temos que entender que, se ele ganhou pouco, quem errou foi o grupo de trabalho eleitoral, o diretório estadual ou a bancada federal. Compreende? Nós ampliamos a instância de decisão. E nenhum partido faz o que o PT fez. Nós dividimos o recurso com base em 48% de votos na chapa de deputados federais e 52% de eleitorado. Veja, São Paulo, obviamente, tem o maior recurso, certo? Lá há mais eleitores e mais votos na chapa de deputados federais. Depois vem Minas, que é o meu estado, também correto. Assim, quem pode mais, recebe mais. Está certa a distribuição. E os recursos de um estado para outro não se comunicam. Compreende? Portanto, São Paulo ficou com uma fortuna, mas o dinheiro de São Paulo é de São Paulo. O de Minas é de Minas. E isso estimula os estados a se esforçarem mais nas próximas eleições. Compreende? Eu quero ter mais votos na chapa de deputados federais, quero eleger deputados. Isso impulsiona não apenas o fundo eleitoral, mas também o fundo partidário. Portanto, penso que nosso critério de distribuição do fundo, ainda que extremamente trabalhoso, é o critério mais democrático da história da democracia deste país em relação ao financiamento público. Não há outro partido que faça o que nós fazemos. Cabe recurso, a pessoa pode recorrer; se alguém não aceitar, ele recorre. Nós distribuímos assim, na proporcionalidade do que você contribuiu. É importante lembrar também que quem vota pelo fundo são os deputados federais. Compreende?
É muito estimulante ver duas mulheres com a sua personalidade e da presidenta Gleisi Hoffmann, principalmente no último período, ocupando cargos tão importantes. Queria que você avaliasse como está o protagonismo feminino, pois o número de candidaturas femininas com possibilidade de vitória esse ano é extremamente positivo.
Olha, eu acho que essa gestão do PT ficará marcada na história por várias razões, especialmente em relação às finanças. Nós atualizamos as finanças e entregaremos o PT com as contas saneadas. Realizamos o financiamento eleitoral da forma mais democrática possível. A pessoa pode reclamar, não tem problema, mas instituímos o fórum mais democrático que se pode ter; tudo é discutido de forma aberta. Além disso, do ponto de vista da representação feminina, foi muito importante. Pela primeira vez na história, os principais cargos do PT estão ocupados por mulheres. Veja só, antes de eu ser tesoureira, fui secretária de Organização. Tenho muita dúvida se a secretaria de Organização não é a principal do PT, muito mais do que Finanças, porque ela é o coração do partido e organiza tudo. Então, temos uma mulher na secretaria de Organização, uma na de Finanças, uma mulher na secretaria de Formação Política. A Maria do Rosário, por exemplo, inovou a formação política no PT, quando ela entrou, ela deu outra cara e outra dinâmica; seu trabalho foi espetacular. Acredito que foi uma oportunidade histórica para nós. (pausa na entrevista pois a secretária se emocionou ao começar a falar da presidenta Gleisi Hoffmann). Eu me emociono ao falar da Gleisi, porque estamos aqui hoje por causa da resiliência dela. Vocês estão entrevistando alguém que participou de uma gestão antes dela e viveu duas gestões com ela. Quando o presidente foi preso, a Gleisi virou um grilo falante: “Lula Livre, Lula Livre!” Ela fez disso a vida dela, e as pessoas precisam compreender esse papel histórico dela. E isso é dela, uma resiliência imensa dela. Acredito que nós conseguimos dar outra dinâmica ao PT, nós instituímos uma nova dinâmica no PT, com muito mais democracia interna, com força para os setoriais, muitos encontros e debates, Trazemos os católicos de volta para dentro do PT; voltamos a trabalhar com os evangélicos, realizamos conferências eleitorais e temos 22 núcleos internacionais. Assim, o PT se tornou um partido de efervescência e tem uma agenda muito ampla. Isso tudo tem muito a ver com a maneira como a Gleisi conduziu o PT. Eu lembro que, quando eu era secretária de Organização, fizemos uma campanha de filiação maravilhosa. Nós viajávamos para vários lugares, estimulando as pessoas. Foi muito bonito como ela conduziu esse processo. Eu diria que ela oxigenou o PT; essa gestão deu uma verdadeira renovação, sabe? Tudo isso foi muito positivo e acho que tudo isso devemos à liderança dela.
Eu acho bonito saber que duas mulheres fizeram isso com o PT…
Aquela questão do maternar, eu acredito que cuidamos com muito afeto e carinho, não só eu e a Gleisi, mas também a Sônia, enfim, todas as mulheres que compuseram nossa direção nacional, todas lideradas por ela. Foi uma experiência muito legal. Por isso, acho que as mulheres estão tão engajadas e unidas neste processo, por isso essas palavras de ordem… e nós vamos eleger muitas prefeitas. Vamos reeleger em Minas a Margarida Salomão e a Marília Campos, e vamos ter grandes chances nas capitais. Não sei se conseguiremos eleger todas, mas, por exemplo, temos a Natália Bonavides, a Adriana, a Maria do Rosário e a Camila Jara. Temos a Denise de Caxias do Sul, que tem tudo para ser eleita, e a nossa Ana Paula de Blumenau, que está muito bem posicionada. Em São Paulo, em Catanduva, temos mulheres emergindo, como a Dandara, que é uma jovem negra, compreende? Eu acho que o fato de o PT ter sido dirigido por mulheres deu certo. Eu não gosto da palavra empoderamento, mas isso trouxe mais autoestima para as mulheres, deu mais confiança para elas poderem se afirmar, um sentimento de “opa, eu posso, eu vou, eu quero me colocar.” Isso é muito legal. Acho que foi muito bom, muito saudável para todos nós. Tem também a questão da comunicação do PT, que também foi um marco. Nós retornamos com a TV PT; antes, o PT contava apenas com uma agência, mas hoje temos uma estatal. Brincamos que a comunicação do PT é uma estatal. Nesta eleição, vamos realizar uma campanha muito forte pelo 13. O PT nacional vai investir um recurso significativo chamando o voto no 13, no time do Lula, uma campanha institucional. Durante a campanha eleitoral, enquanto acontece a campanha dos majoritários, ao lado teremos a campanha do ‘Vote 13!’, ‘Vote na estrela’, ‘Vote no time do Lula!’. Estaremos presentes nas redes sociais, com material e também em programas de TV. Vamos destinar uma parte significativa dos recursos para fortalecer ainda mais o time do Lula e falar sobre o PT de maneira geral. Isso é um investimento nas candidaturas; não se trata apenas de fundo, é um grande investimento.
Vencidas as eleições, como você vê a participação e o êxito dessas eleições como substrato para os dois próximos anos seguintes, nos conduzindo às eleições nacionais? Vocês fizeram esse cálculo visando 2026? Tem participação do presidente Lula nessa estratégia?
A gente espera, então, que nesta eleição, se não conseguirmos derrotar todo o fascismo, pelo menos consigamos derrotar parte dele. Quando ganhamos uma eleição, seja com o PT, de preferência, ou com partidos aliados, o programa federal desce para o território de uma maneira honesta. Isso facilita muito para nós, pois o programa chega à cidade com a verdade: quem fez isso foi o PT, foi o governo do PT, foi o Lula. Isso é diferente de quando a prefeitura não é nossa; o prefeito se apropria das conquistas e afirma que foi ele quem fez, e a população nem sempre está ciente disso. Portanto, ganhar eleições, seja em pequenos ou grandes municípios, é muito importante para nós, para conseguirmos cada vez mais restabelecer a verdade e combater as fake news, especialmente aquelas que atacam o que fazemos para melhorar a vida do povo. Entendemos que, terminado o processo eleitoral, entraremos em um período de eleição interna do PT. Nós teremos que “trocar o pneu do carro com o carro andando” porque precisamos terminar a eleição e já virar a chave para 2026. Em 2026, não podemos esquecer que precisamos reeleger o presidente Lula, e teremos que apoiar muito, mas muito mesmo, o presidente Lula. Assim, o PT vai precisar da sabedoria de realizar a eleição da sua nova direção ao mesmo tempo em que combate o inimigo externo e se prepara para a reeleição do presidente Lula. A história exigirá de nós, petistas, muita sabedoria e cumplicidade para entendermos que não podemos entrar no PED (Processo de Eleições Diretas) como já entramos em outros momentos, precisamos ter cuidado com as guerras internas. Por isso, digo que é necessário muita sabedoria, muito desprendimento e um espírito colaborativo. Eu tenho a tendência de dizer — e não quero especular sobre o debate interno — que precisamos fazer um PED no próximo ano que, pela primeira vez, seja a maior aliança possível. Hoje, temos pouca divergência na política; é verdade que as forças políticas internas dentro do PT divergem muito pouco. Por isso, é necessário um grande desprendimento para compreender que o momento do PED do ano que vem exigirá essa sabedoria, cumplicidade e solidariedade, especialmente em relação ao presidente Lula. Se pararmos o PT para entrar em uma disputa interna, como já vivemos em outros momentos, podemos colocar em risco o país. Vamos precisar de maturidade política, o Brasil precisa muito de nós. Nós não podemos titubear em relação à possibilidade de perder as eleições de 2026; isso deve estar fora do nosso horizonte. Por isso, teremos que cuidar deste processo eleitoral de 2026 como se cuidássemos de um recém-nascido, com muita atenção, muito jeito e carinho. Precisamos encerrar 2024 virando essa chave. Eu acredito que o Brasil espera isso de nós, e nós precisamos fazer isso pelo Brasil, pela América Latina, pelo Caribe e pelo mundo. A extrema-direita é o fantasma da vez, e não podemos permitir que o Brasil seja capturado novamente por esse fantasma, por essa coisa horrenda que nós vivemos durante quatro anos.