Morde e assopra

Bolsonaro volta a atacar as urnas eletrônicas e toma invertida do TSE, que exclui coronel da fiscalização e nega ao Ministério da Defesa acesso a dados das eleições de 2014 e 2018

 

O presidente Jair Bolsonaro mantém a tática de ataques frenéticos e recuos estratégicos em relação às instituições do Poder Judiciário. Na mesma semana que aceitou o convite do ministro Alexandre de Moraes para a posse à frente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ex-capitão do Exército mostrou que vai continuar a colocar a Justiça Eleitoral em xeque. Ele não se emenda. Mas levou dessa vez uma invertida.

Na segunda-feira, 9, em reunião com banqueiros e empresários na Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em São Paulo, Bolsonaro voltou a atacar as urnas eletrônicas. Ele ironizou que o setor financeiro não deveria gastar dinheiro com defesa cibernética, mas pegar a tecnologia do TSE que é “intransponível, impenetrável, inexpugnável”. Desde o início do voto eletrônico no Brasil, em 1996, nenhum caso de fraude foi identificado.

“Temos lá em Brasília, tem (sic) um órgão intransponível, impenetrável, inexpugnável. Vão para lá, para pegar a tecnologia deles. É isso que está causando aqui esse ‘burburinho da democracia’”, disse cheio de ironia em referência à Carta pela Democracia, assinada pela Febraban e lida na quinta-feira, em dezenas de atos realizados em todas as capitais brasileiras.

“O voto é a alma da democracia e nós lutamos por transparência, nada além disso. E se as Forças Armadas foram convidados a participar da comissão e apresentaram sugestões, deixa as equipes técnicas discutir. Quem sabe as Forças Armadas estejam equivocadas, mas não impedir essa aproximação e essa conversa”, ironizou.

A reação da Justiça Eleitoral veio no mesmo dia. O TSE anunciou que estava excluindo o coronel Ricardo Sant’anna do grupo de fiscalização do processo eleitoral. O TSE tomou a decisão depois que Sant’anna foi flagrado espalhando fake news sobre as urnas eletrônicas. Em nota, o Ministério da Defesa afirmou que o trabalho de fiscalização do sistema é “técnico” e “estritamente institucional”.

O TSE ainda negou parcialmente um pedido das Forças Armadas de acesso a arquivos das eleições de 2014 e 2018. A resposta foi enviada ao ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira. O recado foi direto: as entidades fiscalizadoras não têm “poderes de análise e fiscalização de eleições passadas, não lhes cumprindo papel de controle externo do TSE”.

Bolsonaro tem sustentado que as eleições de 2014, em que Dilma Rousseff foi consagrada nas urnas com 54,5 milhões de votos pela sua reeleição, e a de 2018, em que ele próprio foi eleito, teriam sido fraudadas. Pura teoria da conspiração.

Na sexta-feira, 12, o TSE acatou uma ação do Ministério Público Eleitoral contra Bolsonaro por conta dos ataques proferidos ao sistema eleitoral durante a reunião com embaixadores convocada no início de julho. O tribunal deu a ele o prazo de dois dias para apresentar uma defesa, a contar da data de sua intimação.

A ação foi protocolada pelo vice-procurador-geral eleitoral Paulo Gustavo Gonet Branco. Ele aponta para o fato de Bolsonaro ter convocado embaixadores para lançar dúvidas sobre o sistema eleitoral, mas também para a forma como o fez: apontou alegações já desmentidas anteriormente de forma pública pelo TSE, sem apresentar as respostas do tribunal ou dar qualquer chance de contraditório, inclusive por parte dos próprios embaixadores presentes.•