Dias melhores virão

Mais que um lançamento oficial de candidatura, ato que consagrou a chapa Lula-Alckmin, na aliança política Vamos juntos pelo Brasil, significa a perspectiva de um país menos desigual e de vida mais digna para o povo brasileiro

 

Não foi só um lançamento de candidatura. Havia muita coisa envolvida no ato de sábado, dia 7, que oficializou a chapa Lula-Alckmin à Presidência da República. Lula estava voltando, afinal, agora com seus direitos políticos inquestionados.

As marcas do Golpe de 2016 que derrubou Dilma Rousseff e levou à prisão do ex-presidente, tirando-o de forma fraudulenta das eleições de 2018, ainda se fazem sentir no cotidiano da população, impactada pelo cenário de degradação gerado pelo atual governo. Mas o clima de esperança foi mais forte entre os presentes no pavilhão do Expo Center Norte, na capital paulista.

“É um dia diferente. Eu me sinto como se estivesse numa final de mundial, com meu time em campo, depois de muito tempo de espera. Agora, a bola começou a rolar. A esperança ressurge”, comentou o deputado federal Carlos Veras (PT-PE), diante do palco que aguardava o protagonista do encontro.

Na área lateral, Cristina Américo, 40 anos, interrompeu a varrição para também falar de suas expectativas. “Olha, eu nunca vou mudar minha opinião. Sempre votei no Lula”, contou. Ela mora na cidade litorânea de Itanhaém e trabalha para uma empresa de organização de eventos. Sempre que chamada, faz parte das equipes de limpeza em feiras e exposições.

“No tempo do Lula estava tudo mais barato, né?”, lembra. Evangélica, frequentadora da Assembleia de Deus, Cristina é casada e mãe de seis filhos. “Olha, eu acho que mudar mesmo, só Deus. Espero muito em Deus. Mas a gente tem que votar certo”. Sobre o fato de Bolsonaro dizer que representa os crentes, ela dispara: “Crente ele não é não, ele é fanfarrão. Xinga as mulheres, atrapalha a vida das pessoas”. Cristina garante que o marido, pedreiro, e os filhos em idade de votar também vão de Lula em outubro.

“É o dia de renovar o orgulho de ser brasileiro e brasileira. Para mim, esse é o significado maior desse lançamento e talvez seja a maior contribuição do Lula nesses últimos anos: o Brasil voltar a sonhar”, opinou a drag queen Ruth Venceremos. Ela milita no MST desde que foi viver com a família em um acampamento sem-terra, em meio a uma infância de escassez e dificuldades. Pedagoga, é uma das organizadoras do coletivo LGBT Sem Terra, do MST, e é pré-candidata à Câmara dos Deputados pelo PT-DF.

Para Jandira Feghali, deputada federal (PCdoB-RJ), o ato de sábado foi diferente de todos que já participou. “Porque é a consolidação da retomada dos direitos políticos do Lula. Agora ele pode dizer, de fato, ‘voltei’. E ele vem pra disputa mostrando ampliação. E o nosso desafio é ampliar, esta pode ser uma eleição de um único turno”, explicou. “Essa eleição vai decidir se nossa Constituição ainda está em vigor”.

No palco, à espera de Lula, dirigentes de sete partidos que compõem a aliança Vamos Juntos pelo Brasil, artistas, parlamentares, governadores e representantes de movimentos sociais, advogados, líderes religiosos e acadêmicos foram saudados à medida em que seus nomes eram anunciados. O público reservou os aplausos mais calorosos e demorados até então para a ex-presidenta Dilma.

O discurso do candidato a vice, Geraldo Alckmin, transmitido pelo telão, foi acompanhado em silêncio atento. Mas Alckmin, que não foi ao encontro por ter contraído covid, arrancou aplausos e gritos entusiasmados após frases como: “Não é a primeira, nem a segunda ou terceira, Lula é a única via da esperança”.

Quando Lula iniciou a leitura de seu discurso, Carla Patrícia Cândido e Inês Silva apoiaram-se nas vassouras para acompanhar. As duas trabalham na mesma empresa de organização de eventos e frequentam a mesma igreja batista, no bairro do Jabaquara, na capital. “Estou orando para Deus pela eleição do Lula”, disse Carla. “Já chega de Bolsonaro”, disparou Inês.

Carla, que ainda não tinha idade para trabalhar quando Lula foi presidente, reclama do preço do leite, do gás, e do abandono do sistema de saúde. Hoje, é mãe de quatro filhos pequenos. Inês, que já trabalhava à época, lembra de que havia mais empregos nos tempos do PT. Um de seus três filhos, que tem 21 anos, costuma trabalhar com ela em feiras e eventos. Sobre a suposta religiosidade de Bolsonaro, Inês não tem dúvidas. “Ele não pratica a bondade. Cristão tem que ajudar, não atrapalhar”. “Nem autorizar armas”, complementou Carla.

Ali no gargarejo, a atriz e cineasta Maria Ribeiro anunciou que estava iniciando a produção de um documentário sobre o processo eleitoral e a caminhada da chapa Lula-Alckmin. Ela deseja que o novo filme represente um “final feliz”, em contraponto ao angustiado “Outubro”, que dirigiu às vésperas da temida eleição do atual presidente.

“Estou feliz, emocionada. Isso não é só um ato do Lula. É um ato pela retomada do Brasil”, comentou. Mas não deixa de se colocar cautelosa: “Não dá para achar que o jogo está ganho. Acho que a gente aprendeu alguma coisa desde 2018”. Sobre a luta pela conquista de votos, que ela retratou no filme anterior, a atriz e diretora tem fé. “Com o Lula vai ser diferente, as pessoas têm orgulho dele. Isso vai mudar a chave”.

Mas não basta a presença de Lula. “A gente demorou muito para conversar com as pessoas em 2018. Eu tenho falado de política com todos que posso, desde então”, conta. “Isso tem que ser nosso modus operandi de vida, daqui pra frente. Mesmo depois das eleições. Até porque a extrema-direita está organizada”.

Como se respondesse a esses e outros anseios que circulavam pela plateia, Lula encerrou o discurso com a promessa de uma revolução que chamou de pacífica: “A esperança de um povo que sabe que pode voltar a ser feliz”. No fundo do palco, sobre o telão, uma enorme bandeira do Brasil fora estendida.

Aproveitando a autoironia feita antes por Alckmin, o ex-presidente garantiu que lula com chuchu será “prato de sucesso em Brasília”. Ele disse ainda que pede a Deus para abençoar o Brasil – “o país está precisando da graça” – e se despediu sob chuva de pedaços de papéis platinados e ao som de uma releitura do jingle “Lula Lá”, bastante fiel ao espírito do original, feito em 1989. “Não tem como não se emocionar”, dizia um apressado José Genoíno, ex-ministro e ex-deputado, na saída do encontro. É o começo de uma jornada de luta e de sonhos. •