Fazia exatamente cinco anos do Golpe de 2016 e da derrubada de Dilma Rousseff da Presidência da República quando a Fundação Perseu Abramo promoveu o lançamento do livro “Brasil: Cinco Anos de Golpe e Destruição”, na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. A principal personagem do evento, ocorrido na terça-feira, 31, Dilma fez uma refinada análise sobre aquilo que chamou de processo do golpe, anterior ao próprio impeachment e que se prolonga na ascensão do presidente Jair Bolsonaro.

Por sua vez, Lula, em quem se depositam as esperanças para a interrupção desse processo, fez uma previsão otimista para 2022. “A gente pode voltar. E nossa vingança vai ser mais educação, mais salário, mais cultura, mais oportunidades, fazer mais e melhor”, afirmou o ex-presidente, na frase com que encerrou seu discurso na cerimônia de lançamento do livro.

Para Dilma, a obsessão em impedir que o PT caminhasse para uma quinta eleição consecutiva, e com isso mantivesse o processo de romper as amarras do Estado e do país ao projeto neoliberal, fez com que a oposição desse “um tiro no pé”. Para ela, o impeachment esfacelou o centro político e até mesmo a direita, o que torna inviável o sonho de alguns de construir a chamada terceira via. E, fez uma ironia: quem será chamado para recompor o tecido político e social, esgarçado pelo golpe, será o PT. “O mesmo que quiseram destruir”, lembrou.

“Houve uma corrosão do centro, da centro-direita e da direita. Por isso é tão difícil viabilizar uma candidatura da terceira via. Como efeito secundário do combate ao PT, atingiram eles mesmos. E elegeram um candidato fora da esfera, embora estivesse havia séculos no Congresso”, disse. Para Dilma, a confluência do projeto neoliberal com a pauta neofascista representada pelo bolsonarismo é uma consequência trágica e inesperada, até mesmo para ela, que em 31 de agosto de 2016, quando o Senado confirmou seu afastamento, afirmara que o golpe era contra o povo e os direitos sociais.

“O desdobramento do golpe muda a conjuntura: o neofascismo por tendência busca a radicalização, e o Bolsonaro não tem nenhuma proposta de gestão. Como ele mesmo disse nos Estados Unidos, ele veio para destruir”, denuncia a ex-presidenta. “É uma gestão de destruição, para inviabilizar qualquer retomada futura. É um processo aterrador. Não é um processo eventual”.

Dilma identificou três etapas do golpe: a não-aceitação de sua vitória em 2014, inclusive por parte da imprensa, com seu posterior impeachment fraudulento; a condenação e prisão ilegais de Lula; e, por fim, o jogo sujo contra Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência em 2018, em substituição a Lula. “Haddad também foi objeto de um golpe”, disse Dilma. “Jogaram sobre seus ombros uma tonelada de fake news”.

Como pano de fundo da campanha sistemática contra o PT, Dilma identifica o que chamou de “algo genérico”, uma série de acusações que tentava esconder as reais motivações. “A razão é que o algo genérico que há contra nós é que somos aqueles que impediam a adoção da agenda neoliberal”, advertiu. “Lula usou os mecanismos que um governo tem para gerar uma agenda de desenvolvimento com inclusão social. Não nos encaixamos na unipolarização representada pelos EUA. E, enquadrarmo-nos significava acabar com as políticas sociais”.

Para Lula, cuja fala encerrou a cerimônia de lançamento do livro, a perseguição ao PT foi a morte da racionalidade. “O impeachment começou quando a gente fundou o partido. É muito difícil que uma sociedade com a mentalidade escravagista aceite que uma trabalhadora doméstica almoce no horário que todas as pessoas têm o direito de almoçar e não precise esperar os patrões terminarem”, exemplificou.

“Tudo isso é uma atitude irracional de parte da elite econômica e não tem jeito de explicar de forma racional essa atitude irracional. Tudo foi baseado numa mentira. E 2018 foi a coroação da mentira. E essa mentira só não permaneceu porque a nossa militância, com a ajuda dos partidos aliados e da imprensa internacional, não deixamos dizer que aquilo era impeachment. Era golpe”, completou o futuro candidato a presidente.

O presidente da Fundação Perseu Abramo e ex-ministro da Casa Civil e da Educação do governo Dilma, Aloizio Mercadante, destacou em seu discurso: “O golpe ocorreu para impedir futuro e para restaurar os retrocessos. O golpe foi contra a esperança e pelo ódio, para o ódio. O golpe instaurou a intolerância e a discriminação. Criminalizou a política, que hoje agride e ameaça as instituições democráticas. O golpe foi, sobretudo, contra a cidadã e o cidadão”.

O livro “Brasil: Cinco Anos de Golpe e Destruição” traz um inventário dos retrocessos no Brasil desde a derrubada de Dilma. Com 324 páginas e colaboração de centenas de especialistas dos Núcleos de Acompanhamento de Políticas Públicas (Naaps) da Fundação, a obra abrange diversos segmentos da economia, política, cultura, meio ambiente e políticas sociais. O livro pode ser baixado gratuitamente no site da Fundação Perseu Abramo.