ENTREVISTA | JOÃO PAULO RODRIGUES – “A maior tragédia do Bolsonaro foi a destruição das políticas públicas”
João Paulo Rodrigues é integrante da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, o MST. É um agricultor assentado da reforma agrária, formado em Ciências Sociais e oriundo de uma família de pequenos agricultores. Ele se diz estar indignado com os retrocessos sociais adotados no Brasil após o Golpe de 2016. Conta que a própria família foi afetada pelo desmonte das políticas de proteção social.
Os retrocessos que abandonam milhões de brasileiros à própria sorte são o alvo da luta que está levando milhares de pessoas às ruas das principais cidades do Brasil. O coordenador do MST afirma que os protestos contra o governo são fundamentais para fazer com que a sociedade brasileira entre no debate político e reflita sobre o que está acontecendo e sobre o futuro do país. A grandeza das mobilizações nas ruas o surpreendeu. Ele acredita que a ocupação dos espaços públicos será permanente daqui em diante.
Embora a luta contra Jair Bolsonaro seja a prioridade, João Paulo afirma ser necessário que as esquerdas reflitam sobre como se comunicam com as suas bases e com a sociedade em geral. A reflexão sobre qual mensagem será propagada é importante para que seja possível promover profundas mudanças no Brasil.
Nesse aspecto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é considerado como um eficiente “microfone”, sendo um dos únicos da esquerda com capacidade para dialogar com todas as diferentes parcelas da sociedade.
O coordenador do MST considera que a liderança de Lula será fundamental para o Brasil. Sobre o cenário político para as eleições de 2022, João Paulo afirma que é preciso se preocupar com a tal terceira via, que tem como objetivo exclusivo derrotar Lula e prejudicar uma candidatura do campo popular. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Focus Brasil — O Brasil vive uma tragédia sem precedentes. São quase 600 mil mortos pelo coronavírus e uma crise social absurda. O empobrecimento de grande parte da população é evidente. A lista de problemas é infinita. Como viver neste Brasil sob Bolsonaro? Qual é seu o sentimento?
— Olha, eu não imaginei que viveria e passaria por uma conjuntura como essa de ter uma combinação, para nossa geração, de um Bolsonaro no governo, uma pandemia e, o que é mais grave, um Bolsonaro com bolsominions. Com uma base social que apoia e acredita em coisas nas quais ele fala. Eu acho que o que me perturba mais de tudo isso não é só a pandemia, não é só a figura do Bolsonaro, é que nós estamos em 2021 numa sociedade ainda escravocrata e, além de machista, conservadora.
Ou seja, aquilo que eu aprendi e vi a vida inteira com o latifúndio, eu vejo em tamanho Brasil. E é um sentimento que é uma combinação de tristeza, porque não precisávamos enfrentar uma conjuntura como essa, mas ao mesmo tempo de responsabilidade coletiva porque temos culpa nisso. Não é só culpa deles. Cabe a nós a tarefa política de continuar fazendo o que nos propusemos a fazer que são as transformações sociais que o Brasil precisa.
Não basta fazer distribuição de terra, não basta fazer uma reforma agrária, não basta ganhar uma eleição. É necessário fazer transformações profundas. Eu acho que esse é o sentimento que tenho agora. É um sentimento de indignação pelo que estamos passando. Este é o momento que eu vivo e, ao mesmo tempo, um sentimento de responsabilidade coletiva. Temos o que fazer nesse país para que dê certo. Não dá para fugir para a Europa.
— Você falou de uma questão importante que é a realidade de parcelas da população conservadoras. O país é consideravelmente fragmentado. Existe um desafio da comunicação? A elite financeira domina os grandes meios de comunicação de comunicação há muito tempo. Você enxerga esse desafio da comunicação? Como superar esse problema?
— Sobre esse problema da comunicação, acho que existe uma confusão na esquerda que é, em vez de pensarmos o conteúdo da comunicação, existe uma preocupação demasiada com os instrumentos e os veículos de comunicação. E, claro, a cada hora surge um Instagram novo, uma TV nova, um jornal novo e assim por diante. Já patinamos há um bom tempo sobre o que é o conteúdo de comunicação que deveríamos tratar para discutir em três níveis: o primeiro, é com a nossa militância, com os ativistas que precisam de uma comunicação rápida e com linha política do que fazer, é muita confusão nesse momento, são basicamente os usuários de Twitter, Instagram e outras coisas. É a nossa “classe média” que está envolvida no dia a dia. A segunda questão é nos comunicarmos com nossa base social. Por exemplo, o MST, nossa base social são aproximadamente 2 milhões de pessoas, como estamos nos comunicando com ela? Isso vale para o PT, para a CUT, para todas as entidades e organizações. Qual é a melhor forma de comunicar com os seus, que já está na sua “turma” e precisa fazer a luta econômica, a luta política todos os dias. O terceiro é com a sociedade, esse conjunto de pessoas que não está muito aí para a política, ainda – exagerando – lê CUT como C-U-T e precisa de comunicação.
Essa narrativa – que é a palavra que aprendemos no último período – não está dando conta de se comunicar com todo mundo. Tem dificuldade. Parece a mim que o grande conteúdo de comunicação que temos hoje, conteúdo e forma, é a figura do Lula. Ele foi o que deu conta de fazer isso até agora. Ele expressa no gesto, na fala. Dá conta de comunicar com os três níveis, o que é muito difícil. Agora, a esquerda está nesse limite. E diante disso, dou como exemplo o MST que, do ponto de vista de conteúdo, avançou em três níveis na sua história. Veja como é difícil. Como nós nos comunicamos? A ocupação de terra, por si só, fala. Depois, aquelas marchas que fizemos, fomos à Brasília, rodamos o Brasil inteiro. Foi onde o MST teve o seu maior nível de popularidade. E agora, com a comida agroecológica, orgânica. Foram os três momentos de comunicação do MST. Mas eu pergunto, e qual será o quarto? Eu não sei. E eu pergunto, o que a esquerda está pensando de comunicação com a sociedade? É a nossa pauta economicista e econômica que é essencial? É entrarmos para uma pauta delicadíssima de costumes e valores para fazer um contraponto ideológico? Então, esse é o desafio que está colocado. Fora isso, claro, o desafio de saber lidar com a tecnologia e com uma nova geração que tem outros mecanismos de se comunicar. Eles se entendem por um Tik tok “da vida”, é uma geração que se vê muito em símbolos de tecnologia que são coisas que a nossa tradição da década de 80, que é quem dirige a luta política até os dias de hoje, ainda não tem tanta familiaridade. Por isso, o desafio da comunicação não é simples. Termino dizendo que a comunicação tem que ser vista como a disputa ideológica na sociedade. E quem melhor fez isso foi o Bolsonaro, utilizando da sua maldade de fake news, mas ele conseguiu se comunicar do jeito dele, com o público dele.
— E ocupar as ruas em protesto contra o governo?
— É fundamental. Não temos outra opção. Temos que fazer esse protesto porque estamos em uma conjuntura adversa em que a pandemia nos tirou completamente das ruas e eu acho que tirou porque houve uma compreensão coletiva das esquerdas de que não deveríamos fazer aglomeração, respeitando as orientações dos cientistas, dos prefeitos e governadores. E, ao mesmo tempo, tínhamos claro que não poderíamos passar para a História que negligenciamos a situação de pandemia. Diante disso, o bolsonarismo cresceu nas ruas. Fizeram atos importantes em Brasília, ato na Paulista, no Rio de Janeiro. Isso criou uma situação em que estavam na rua sem máscara, sem nada e nós desaparecemos. [Estávamos] só fazendo live e batendo panela. Por isso houve essa construção coletiva a partir de três pontos de pauta – eu acho que mais essencial do que a ocupação da rua foi a unidade de conteúdo – no “Fora, Bolsonaro”, “vacinas já” e auxílio emergencial que nos permitiu fazer essas grandes manifestações. E olha, fiquei surpreso porque as manifestações vieram para valer. Foram 45 dias, fizemos atos em três grandes camadas diferenciadas da população. A primeira, com mais jovens. Uma segunda, mais popular e uma terceira que foi para o interior do país. Eu acho que isso foi uma riqueza. Tenho muito ânimo de que nós fomos para a rua e de lá nós não vamos sair.
— O impeachment do Bolsonaro é importante, mas levaria o Hamilton Mourão a assumir a Presidência. Talvez não consigamos, imediatamente, mudar a conjuntura.
— Tudo depende da correlação de forças. Eles, [a direita], faziam uma conta do lado deles em que derruba a Dilma, vem o Temer e para eles deu tudo certo. Se tivéssemos uma conjuntura em que para nós desse tudo certo, como deu para eles, seria ótimo com relação ao impeachment. Mas não é bem assim. Por isso que eu digo, depende da correlação de forças. Temos que tirar o Bolsonaro de lá e sinalizar isso para a população. Não é pouca coisa. Então, com qual gesto que você sinaliza para a população que você vai tirar o Bolsonaro: o primeiro é pelas eleições. Estamos dizendo que vamos fazer isso em 2022. E o segundo gesto é que vamos tomar medidas emergenciais de urgência contra ele. Tem um “fato concreto”: 500 mil pessoas morreram por causa de uma política pública do governo Bolsonaro. Se nós não sinalizarmos para a sociedade que queremos tirar ele em 2022, mas se possível tirá-lo antes, podemos chegar a 2022 com dúvida. Porque Bolsonaro tem capacidade de ter no ano que vem um governo sem pandemia e com taxa de crescimento. E você não tem como cobrar lá na frente a fatura da tragédia que foi agora.
Por isso, o impeachment tem que ser para valer. Pode ser que nós não tenhamos correlação de força para tirá-lo. E pode ser também que tenha uma unidade da direita que possa tirar o Bolsonaro e deixar o Mourão. Eu não acredito nessa possibilidade e, por isso, não me preocupa que o Mourão entre agora. Ele só entraria se eles tivessem unidade em um candidato muito forte para derrubar o Lula e eles não têm. Enquanto não tiverem um nome forte para enfrentar o Lula, não vão tirar o Bolsonaro. Por isso, temos que ir para a rua: “impeachment, impeachment, impeachment”… “Fora, fora, fora”. E tem que construir um debate político com a sociedade para tirar esse homem de qualquer forma. Ou com impeachment, ou ele pede demissão do cargo, ou perde nas urnas. Agora, uma das três alternativas tem que ter.
— O Brasil voltou ao Mapa da Fome. O que piora esse quadro é que o governo parece trabalhar para disseminar a fome, como atuou para disseminar o coronavírus. Quais as ações do MST para ajudar quem sofre com a fome?
— Olha, eu desconfio, ainda é cedo para dizer isso, mas [desconfio] que a maior tragédia do Bolsonaro vai ser a destruição de políticas públicas, desde o SUS, que ele tentou, e a todos os mecanismos de proteção social previstos na Constituição de 1988. O que o Bolsonaro fez junto com o Temer vai ser muito difícil de reorganizarmos. Teto de gastos, reforma da Previdência, reforma do mundo do trabalho… É uma tragédia. Estamos vendo a fome das pessoas desempregadas, uma situação mais grave, mas tem todo um conjunto de outras situações. Vou dar um exemplo. Eu tenho um irmão mais novo que é especial e tinha acesso a um benefício. E o governo, em uma das reformas, fez uma conta [da renda] do meu pai que é agricultor. Ele vendeu dois alqueires de mandioca no ano passado e na nota do produtor teve uma renda maior. Logo, o benefício do meu irmão foi cortado. Então, ele não tem mais acesso. Ele tem 20 anos, é uma pessoa especial, não pode trabalhar. Minha mãe tem uma aposentadoria, meu pai tem uma aposentadoria e tem dois alqueires de mandioca que colheu. Eu falei: “Isso não pode, como isso aconteceu?” Isso não existe.
Fomos descobrir que há 150 mil crianças especiais na mesma situação do meu irmão: o pai conseguiu um “bico” diferenciado e, por isso, perderam acesso aos seus benefícios e a esse “colchão” que dava segurança a essas pessoas. Estou dando esse exemplo porque isso vale para as empregadas domésticas, empregados, isso vale para o conjunto da sociedade que ao final de quatro anos de governo vai estar com a situação econômica completamente desorganizada, sem proteção pública do Estado e, o que é mais grave, com uma geração de pobres e miseráveis que dificilmente em um outro governo de quatro anos se consegue recuperar isso. Você se lembra o que foi o trabalho dos governos Lula e Dilma para conseguir ter uma sociedade num patamar mínimo em que não existem pessoas sem comer.
Hoje, para se ter noção, temos 50 milhões de pessoas que estão abaixo da linha da pobreza, em situação de fome. É muito: 27% da população está em situação, literalmente, de fome. E isso não é pouca coisa, estou falando de pelo menos uma Argentina ou três [vezes a população de] Portugal. Por isso que a situação da fome é gravíssima. E o que é pior, não se resolve isso com política de assistencialismo ora das igrejas, ora dos movimentos. Isso tem que ser política pública.
Nesse sentido, eu acho que o trabalho realizado pelo Movimento dos Sem Terra até agora cumpriu um papel de solidariedade muito grande no que é possível. Doamos 5 mil toneladas de alimento. Isso é muita coisa ao longo do último ano. E alimento de verdade, não é o que sobrou. É o que nós tínhamos, comida da melhor qualidade. Distribuímos marmitex, comida in natura, arroz orgânico no país inteiro. E isso é um gesto que melhorou a vida das pessoas que receberam, foi muito importante. Isso foi bom para a nossa turma elevar o nível de consciência da importância do que é a reforma agrária e a importância do gesto de solidariedade. Aprendemos isso muito com os cubanos, dividir o que tem e não o que sobra. Então, estou convencido de que o gesto de solidariedade que o MST fez não foi para melhorar a vida das pessoas que receberam, foi para melhorar a vida dos nossos que deram essa contribuição à sociedade num período muito difícil.
Este é o debate que nós vamos ter que fazer nesse próximo período. Um debate da esperança, que temos de combater a fome e debate que nós precisamos agora ir para um degrau de cima. Não é somente a distribuição de renda. É a distribuição de riqueza. E isso significa termos um projeto um pouco mais – abre aspas – “radicalizado” do ponto de vista da economia. Em que o Estado cumpra essa função e, de fato, [seja capaz de] impedir que se mudar de governo, não possamos voltar completamente a uma situação de miséria que se tinha no passado. [Esse processo de retrocesso] é muito rápido. Estamos falando de seis anos em que se foi toda uma política pública construída ao longo de 15 anos. Não podemos ter um Estado tão frágil que não tenha instrumentos para segurar uma situação como essa. Por isso eu acho que agora temos outras tarefas para tratar o tema da fome e da miséria.
— Os governos Temer e Bolsonaro se comportaram como antagonistas da agricultura familiar. Parece que eles operam para derrotar este setor.
— Eles são contra. É inacreditável. Porque não é só “não vou fazer” ou “vou fazer só um pouquinho”. Não. Eles são contra. Não acreditam nisso. E é uma irresponsabilidade o posicionamento deles porque eles podiam dizer assim: “Ah, eu sou liberal”. Pô, mas mesmo num governo liberal precisa ter produção de comida para a população, para os trabalhadores. Eles podiam ter criado algum mecanismo de ter pelo menos crédito. Não se propuseram a isso. Se é um governo que se diz “sou capitalista e quero trabalhar com a meritocracia”, ele podia ter criado isso no campo: “Vou trabalhar com os melhores, vou criar política…” Nada, nada. Entregou toda a política agrícola para o Ministério da Agricultura produzir soja, soja e soja. E mais nada. Isso foi tragédia anunciada.
O que eu acho que foi o principal que eles prejudicaram o campo, vamos chamar de as cinco grandes maldades do Temer e do Bolsonaro para o campo: primeiro, as reformas trabalhista e previdenciária. A trabalhista pega pesado os trabalhadores do café, da cana e assim por diante. E a reforma previdenciária deixa a população muito mais empobrecida no campo. Depois, o fim das políticas públicas construídas no governo Lula. E, em especial, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Pronaf, que foram alterados completamente, mudando sua função. E o Minha Casa, Minha Vida e todos os outros programas.
Outra grande dificuldade e um problema que criaram para nós foi a destruição da função do Incra. Hoje o Incra é dirigido por um ex-presidente da UDR [União Democrática Ruralista] que não tem o que fazer na sua fazendinha e foi cuidar de questão fundiária para os ricos. A quarta grande medida deles que foi para destruir, foi a violência no campo com armamento de fazendeiro e criando essa ideia de que “ocupou, vou resolver na bala”. Então, isso é terrível.
E, por fim, foi destruir toda perspectiva de assentamento de novas famílias pelo instrumento de desapropriação de latifúndios improdutivos. Essas cinco medidas foram terríveis. Eu poderia dizer uma sexta, que não é só para o campo, que é mais complexa, que é a entrada de 500 novos agrotóxicos liberados por esse governo. Esse é o resultado de seis anos de tragédia do governo Bolsonaro com o governo Temer.
— Qual é a importância da possibilidade da volta de Lula inocente e como possível candidato à Presidência da República?
— Só a possibilidade de termos o Lula candidato já mudou muito o cenário. Lula conseguiu fazer três feitos em um espaço muito pequeno de tempo. Primeiro, falar com o povão. Isso é importantíssimo. Lula consegue fazer isso. Ele é um dos únicos nossos que tem essa capacidade de dialogar com as pessoas dos três níveis diferentes da sociedade. O segundo componente da entrada do Lula foi a capacidade dele de interlocução internacional. O mundo quer saber o que o Lula está pensando. E funciona. Talvez seja o melhor microfone que temos para denúncias e para dizer o que está acontecendo aqui no Brasil. O terceiro foi a capacidade de animação da militância, dos movimentos do campo e da cidade e dos partidos. Lula projetou a esperança na vida das pessoas que estão fazendo luta e das que não estão fazendo luta. Por si só isso já é um golaço de placa.
Agora, vamos para a segunda etapa que é o Lula líder num Brasil com todas as dificuldades. Ele precisa reafirmar sua liderança num governo trágico como esse, num período de crise social de toda natureza e num período com mais de 500 mil mortes. Então, precisamos de um Lula líder. E a terceira fase, que combina com essa segunda, que é Lula candidato. O resultado da candidatura vai depender muito da capacidade do que vamos fazer ainda em 2021.
Eu brinco que não tem jeito se a gente quiser plantar maxixe e achar que vamos colher uva. Não tem jeito. Só vamos colher uva se plantarmos uva. E para isso tem que fazer luta, tem que organizar a sociedade e tem que ter comando. O comando é o compartilhado da esquerda e nisso o Partido dos Trabalhadores vai ter que ter muito carinho nas suas relações de construção unitária, sabendo o seu tamanho, a sua força, a sua história etc.
E ao mesmo tempo, o Lula vai ter que dosar a sua posição política da figura de liderança. Ora nas manifestações, ora para não misturar com a eleição, nas defesas implacáveis das bandeiras referentes ao tema do combate à fome e da classe trabalhadora que é quem ele liderou ao longo desses 35 anos e que precisa dessa figura hoje mais do que nunca.
Estou muito animado porque acho que temos condição de ganhar essa eleição. Não será fácil. Nós vamos ter uma conjuntura no Brasil muito parecida com a dos EUA porque esses “caras” não fizeram um golpe para entregar para o Lula depois. Não é simples assim. Eles vão “caçar problema”. Agora, nós sempre brincamos na esquerda que nós queríamos uma tal de “luta de classes”, não queríamos a conciliação de classes. Portanto, bem-vindos a todos a uma verdadeira luta de classes.
— E a terceira via? Como você vê essa situação?
– Ela existe e é perigosa. Agora, terceira via vem para enfrentar o Lula, não o Bolsonaro. Se estão querendo construir uma outra via é porque não concordam com a ideia de que temos que derrotar o fascismo e a melhor figura, o melhor jogador que temos para derrotar o fascismo é Lula. Não acho que nós devemos brincar com terceira via nem muito menos achar que é natural ter uma terceira via. Temos que combatê-la porque ela só tem um objetivo: destruir a candidatura do Lula e do campo popular. Não vem com para destruir Bolsonaro. Por isso que eu sou contra qualquer sinal de terceira via, sou contra qualquer vacilação do campo progressista e acho que o Ciro Gomes vai fazer e já está fazendo, um desserviço ao Brasil na medida em que se propõe a fazer esse tipo de política.
E claro que tem um monte de ensaio que nós temos chamado aí, já estamos na terceira onda. A primeira foi com o [Sérgio] Moro, por enquanto ainda não se confirmou. E o Ciro [Gomes]. Já estamos numa segunda onda com o [Rodrigo] Pacheco e o [Eduardo] Leite, que eu não sei se vai se firmar. Tivemos ainda na primeira onda o [Luciano] Huck. Eu acho que eles vão testar. O que está em jogo aí, e é importante que nós tenhamos clareza, é a figura da Globo, que não está convencida com as duas candidaturas e setores do grande capital, que têm dúvidas sobre a manutenção do Bolsonaro porque eles passam vergonha todo dia. A Faria Lima sofre com o Bolsonaro sendo seu líder. Ela tem lucro econômico, mas vê como um peso carregá-lo nas costas. É diferente do agronegócio. O agronegócio gosta do Bolsonaro, mas para a Faria Lima é indigesto ter uma figura que faz o que o Bolsonaro faz.