A última quarta-feira, 12, marcou a passagem do quinto ano do Golpe de 2016, que afastou Dilma Rousseff da Presidência da República e abriu a porta para a ascensão da extrema-direita e do governo Jair Bolsonaro. Além do ataque à soberania do voto popular, o impeachment fraudulento da primeira mulher eleita e reeleita da história da República – com 54,5 milhões de votos – permitiu a adoção da agenda neoliberal, derrotada nas urnas desde 2002. O predomínio da política econômica da austeridade fiscal e privatizante representou a retirada do pobre do Orçamento da União, com retrocessos graves nas políticas sociais.

A então presidenta Dilma Rousseff foi profética ao denunciar a manobra, em 12 de maio, logo após o Senado anunciar o seu afastamento do cargo. “O que está em jogo são as conquistas dos últimos 13 anos: os ganhos das pessoas mais pobres e da classe média, a proteção às crianças, os jovens chegando às universidades e às escolas técnicas, a valorização do salário mínimo, os médicos atendendo a população, a realização do sonho da casa própria, com o Minha Casa Minha Vida”, disse. “O que está em jogo é, também, a grande descoberta do Brasil, o pré-sal. O que está em jogo é o futuro do País, a oportunidade e a esperança de avançar sempre mais”.

O Orçamento da União é o instrumento político que reflete as escolhas e prioridades dos que estão à frente do governo federal e das forças políticas que os apoiam. Por isso, durante os 13 anos do PT no Palácio do Planalto, a parcela das receitas do Estado destinadas ao atendimento das demandas da população cresceu continuamente. Havia uma prioridade – colocar o povo no orçamento. A partir do golpe, tudo mudou.

Os limites aos gastos impostos pela Emenda Constitucional 95, aprovada pelo Congresso em 2016, logo após a consagração do impeachment pelo Senado – e as escolhas políticas dos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro mostram que o povo está sendo arrancado do Orçamento, paulatinamente, ano após ano. As demandas e interesses da população foram colocadas em segundo plano, subordinando os direitos sociais do povo às metas de ajuste fiscal e aos interesses do mercado financeiro. Nos cinco anos pós-golpe, impôs-se a redução dos recursos para políticas estruturantes que garantem direitos de proteção social e reduzem desigualdades sociais no Brasil.

Os dados são claros e os gráficos mostram a fotografia incontestável da trágica e bem sucedida estratégia dos conservadores de desconstrução de sistemas estatais de assistência e proteção e os retrocessos nos programas sociais, impostos pelos governos Temer e Bolsonaro. Crescentemente, o povo está sendo excluído do orçamento.

O congelamento dos gastos em saúde, ainda que em termos reais, imposto pela Emenda do Teto dos Gastos, tem duas implicações imediatas: diminuiu o gasto público per capita e dificultou a incorporação de novos equipamentos, processos e medicamentos. Em outras palavras, instituíram o desfinanciamento do SUS, tarefa executada com maestria nos cinco anos pós-golpe. A curva ascendente de investimentos em saúde chegou a um platô a partir de 2016 e não mais subiu – com exceção de 2020, quando houve o incremento do orçamento para o enfrentamento da pandemia. Ainda assim, o que se constata é paralisia dos investimentos.

Na educação, a situação é mais grave. A partir de 2016, os investimentos no ensino público passaram a decrescer. Em 2020, os gastos foram 5% menores que no último ano do governo Dilma. A previsão para 2021 é aprofundar tais perdas. O ano de 2019 foi fora desta tendência, devido ao aumento no complemento do Fundeb por causa do leilão do pré-sal e à alocação de quase R$ 1 bilhão de emendas parlamentares, mais que o dobro do ano anterior. Isso expressa um dos riscos da atual política de alocação orçamentária, que aumenta a incerteza quanto à continuidade do gasto.

Outra área diretamente afetada pelos cortes no orçamento é a assistência social. O Sistema Único da Assistência Social (SUAS) está sendo asfixiado em termos orçamentários. Entre 2016 e 2020, o volume de dinheiro diminuiu para menos da metade do empenhado em 2014. Em 2021, a Lei Orçamentária prevê apenas 21% daquele montante. Isso significa menos unidades públicas e serviços, menos profissionais atuando nos municípios e menos pessoas e famílias sendo atendidas na proteção e promoção de seus direitos.

Na área da cultura, os cortes foram mais agressivos e severos. No governo Temer, os recursos para a cultura permaneceram relativamente estáveis, mas entre 20% e 30% menor que em 2015, último ano antes do golpe. No governo Bolsonaro, o tamanho do desprezo pela cultura se expressou em um corte brutal no orçamento, que perdeu quase 80% em relação ao investido em 2015. O orçamento previsto na Lei Orçamentária de 2021 é do mesmo tamanho do valor investido no último ano do governo FHC, em 2002. Um retrocesso de vinte anos.

Outra área duramente atingida é a do trabalho. Excluídos os gastos obrigatórios com seguro desemprego e abono salarial, as despesas discricionárias da função trabalho estão em trajetória decrescente desde 2016. Isto significa asfixia de gastos com fiscalização do trabalho, enfrentamento ao trabalho escravo, entre outras políticas públicas. As despesas dos três primeiros anos do governo Bolsonaro correspondem ao total gasto em 2011, primeiro ano do governo Dilma.

No setor de moradia popular, também há uma política de desmonte. Uma das medidas mais importantes para garantir o direito à habitação foi a alocação, a partir de 2009, de recursos expressivos no Orçamento da União para apoiar a construção de moradias de interesse social. Assim nasceu o programa Minha Casa Minha Vida, que se tornou a maior política pública de construção habitacional da história do Brasil. Os governos Temer e Bolsonaro praticamente extinguiram os recursos para investimento em moradia de interesse social e mataram o Minha Casa Minha Vida.

Cada vez há menos recursos orçamentários para atender as necessidades da população e impulsionar o desenvolvimento sustentável. Depois de o golpe cassar ilegalmente o mandato de Dilma, disseram que era necessário fazer a reforma trabalhista. Depois, que era necessário fazer a reforma da Previdência. Mais adiante, que era necessário privatizar as empresas públicas, em especial as ligadas à Petrobras. Em seguida, que era necessário a independência do Banco Central. E, agora, que é necessário fazer a reforma administrativa.

A sucessão de desculpas tenta acobertar o descalabro. Os dados mostram um continuado processo de escolhas políticas cujo resultado é menos povo e mais juros e amortizações da dívida e gastos com defesa nacional no Orçamento da União.