Com diagnóstico contundente e propostas estruturadas, o PT assume a pauta da segurança pública, disputa o senso comum sequestrado pela extrema direita e consolida bases para seu programa nacional

Segurança pública em disputa: PT assume o tema com projeto, acúmulo e estratégia nacional

Durante o seminário nacional sobre segurança pública organizado pelo PT e pela Fundação Perseu Abramo, no Rio de Janeiro, ficou evidente algo que por anos esteve diante de todos, mas raramente foi nomeado com clareza: o Brasil já produziu políticas de segurança que funcionam — e esse acúmulo está no centro da tradição petista. 

O encontro apresentou a cartilha Brasil Seguro, Família Protegida, sistematizando propostas e experiências reais de governos do partido, e recolocou o tema como eixo estratégico do projeto para o país.

Logo na abertura, José Dirceu sintetizou o movimento político inaugurado ali. “Erro político não é assumir a segurança pública; é deixá-la nas mãos da extrema direita.” Tarso Genro reforçou que a disputa passa pela vida cotidiana da população. “Segurança pública é um direito subjetivo universal. Não é uma pauta de polícia; é uma pauta de democracia.” 

Já Benedito Mariano, um dos formuladores do documento-base apresentado no seminário, advertiu para o desafio central: “Sem enfrentar o domínio territorial de facções e milícias, não existe política de segurança pública possível.”

A partir dessas intervenções, a mesa que tratou das experiências de gestão mostrou que o PT possui um repertório consistente — dados, políticas, resultados — capaz de orientar uma política nacional construída como política de Estado, baseada em inteligência, prevenção, integração federativa e presença territorial contínua.

O seminário foi, nas palavras do presidente nacional do PT, Edinho Silva, “o início da construção programática para o 8º Congresso do PT e para o programa que o partido apresentará em 2026”. Não se tratava de uma resposta episódica a uma tragédia recente, mas de uma inflexão estratégica em torno de um dos temas que mais preocupam o brasileiro.

Edinho foi direto: “Um partido como o nosso não pode se acovardar diante do senso comum. Existimos para disputar e hegemonizar o senso comum, não para segui-lo.” A deputada Benedita da Silva trouxe a dimensão racial e territorial da violência, lembrando que favelas são “quilombagens modernas” e defendendo uma política que coloque a vida no centro e reduza letalidade. Para ela, é preciso proteger civis e profissionais, revisar protocolos e garantir investigações independentes.

Paulo Okamotto, presidente da Fundação Perseu Abramo, ligou a segurança às disputas de projeto no país. “Segurança pública é também disputar os sonhos da juventude. Só é possível disputar esses sonhos construindo uma sociedade mais justa, mais igualitária.” Alberto Cantalice, diretor de Comunicação da FPA e coordenador da cartilha lançada no encontro, resumiu a mudança de patamar: “Ao enfrentar temática tão difícil, o PT dá um salto de qualidade na sua compreensão sobre a principal preocupação dos brasileiros, a segurança pública.”

Disputar o medo, disputar o território, disputar o senso comum

Ao longo de dois dias, especialistas e dirigentes identificaram um diagnóstico comum: a extrema direita capturou a pauta da segurança pública ao explorar o medo, banalizar a violência e oferecer soluções ilusórias — encarceramento em massa, flexibilização de armas, operações de extermínio. Essas práticas não reduziram criminalidade; ampliaram letalidade e deixaram comunidades inteiras vulneráveis.

José Dirceu contextualizou o cenário internacional, no qual crime organizado, narcotráfico e extremismo se combinam para desestabilizar democracias. “A segurança é instrumento político da extrema direita no mundo. Capturam a pauta, difundem medo, criam inimigos.” Tarso Genro reforçou que a disputa começa no cotidiano: “O que perturba a vida comum é a insegurança em público. E essa dimensão deve orientar nossa política.”

A mesa “Domínio Territorial e Soberania” consolidou esse eixo. Bruno Paes Manso explicou que “a criminalidade se expandiu porque o Estado não disputou o território nem a economia que o crime passou a controlar”. Nicole Reis denunciou o uso político da inteligência no governo Bolsonaro e lembrou que “inteligência é ferramenta de Estado, não de governo”. Luiz Eduardo Soares reafirmou que não há enfrentamento possível sem atacar desigualdade, racismo estrutural e necropolítica. Marcelo Freixo trouxe o alerta comunicacional: “Qual é a nossa capacidade de conversar com os trabalhadores da segurança?”

Legado petista: segurança pública como política de Estado

A mesa sobre experiências de gestão desmontou definitivamente o mito de que “o PT não tem projeto para a segurança pública”. Diadema, Piauí, Araraquara e Maricá foram apresentadas como políticas consolidadas, testadas e estudadas, que reduziram homicídios, reorganizaram instituições e ampliaram presença territorial do Estado.

José de Filippi, ex-prefeito de Diadema, recordou a queda de 68% dos homicídios nos anos 2000. “Política pública se faz com diagnóstico”, disse ao descrever mapeamento territorial, regulação de bares e integração entre saúde, educação, urbanismo e assistência. “Não existe segurança sem presença do Estado.”

No Piauí, Chico Lucas e Jean Uema detalharam a reorganização do sistema prisional, a centralidade da inteligência e a integração entre polícias, Ministério Público, Receita e Justiça. “Segurança pública não é mágica. É método, diagnóstico e integração”, afirmou Chico. Uema foi taxativo: “Não existe política de segurança pública bem-sucedida com sistema prisional desorganizado. Nenhuma.”

Edinho apresentou a “municipalização silenciosa” da segurança, exemplificada por Araraquara, onde tecnologia, gabinetes integrados, prevenção social e reinserção de egressos estruturam uma política territorial. Washington Quaquá trouxe a dimensão social e urbana da disputa: “Territórios fortalecidos produzem menos violência. Município forte é política de segurança pública.”

Dessas experiências, emergem sete eixos estruturantes: retomada territorial com presença contínua, inteligência baseada em dados, municipalização de fato, prevenção com adolescentes e egressos, repressão qualificada com redução de letalidade, modelos já comprovados e coordenação federal via PEC da Segurança Pública.

A disputa do projeto nacional

A cartilha Brasil Seguro, Família Protegida, apresentada pela Fundação Perseu Abramo, consolida esse acúmulo. Cantalice resume: “A cartilha enfrenta os nós que entrelaçam a segurança pública: sistema penitenciário, feminicídio, cadeias econômicas do crime, ocupação dos territórios, roubos e furtos.”

O documento defende SUSP fortalecido, ciclo completo, desmilitarização constitucional, policiamento de proximidade e valorização dos profissionais. Benedito Mariano qualificou o relatório Derrite como “aberração jurídica e política” e alertou para tentativas de desfigurar o PL antifacção “ao enfraquecer instituições e retirar recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública”.

O debate sobre criação de um Ministério da Segurança expôs divergências legítimas no campo progressista. Dirceu e Benedita defenderam estrutura própria; Marivaldo Pereira ponderou riscos de fragmentação. “Criar um Ministério da Segurança pode comunicar muito, mas entregar muito pouco – e custar caro ao país”, afirmou.

O que está em jogo é mais do que uma engenharia administrativa: é a disputa de como o Estado brasileiro recupera o monopólio legítimo da força, enfrenta economias criminais e reconstrói laços com territórios submetidos ao domínio armado.

Conhecimento técnico, disputa política e 2026 no horizonte

Na mesa de encerramento, Edinho Silva e Paulo Okamotto costuraram o sentido estratégico do encontro. Okamotto destacou a centralidade da formação e do conteúdo qualificado: “A cartilha é só o começo. Precisamos produzir conhecimento para convencer a sociedade.” Edinho completou: “Agora é transformar formulação em ação política real. Cabe ao PT defender uma concepção de segurança pública inspirada em um direito real da sociedade, não na lógica da repressão.”

O seminário terminou com uma convicção compartilhada: o PT tem acúmulo, tem dados, tem experiências e tem formulação para apresentar ao país uma alternativa democrática, eficiente e humanista ao caos produzido por décadas de improviso, operações midiáticas e populismo penal.

A partir do Rio de Janeiro, a mensagem ficou clara: a segurança pública entra, definitivamente, no centro do projeto petista — como política de Estado, compromisso com a vida e campo prioritário da disputa com a extrema direita em 2026.