Pesquisas e episódios recentes mostram que a esquerda brasileira aprendeu a disputar as redes, conquistando engajamento em pautas como a escala 6×1, a isenção do IR e a defesa da democracia

Do textão ao trending: como a esquerda avança na disputa das redes 
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Pesquisas e episódios recentes mostram que o campo progressista está ganhando fôlego no ambiente digital, aprendendo a disputar a atenção e até vencer debates antes dominados pela extrema direita.

Por muito tempo, a esquerda brasileira foi criticada por não compreender a lógica das redes sociais. Enquanto a extrema direita explorava os algoritmos com polêmicas, frases de efeito e desinformação, parte do campo progressista ainda tratava a comunicação digital como algo secundário. 

Isso começou a mudar. Pesquisas recentes e casos concretos mostram que a esquerda não apenas entendeu a importância do debate online, mas vem conquistando vitórias relevantes — sinal de que está no caminho certo para disputar de forma mais equilibrada a atenção da sociedade.

“Historicamente, a esquerda sempre defendeu pautas concretas na rua. Mas faltava essa concretude quando a principal arena de debate virou as redes sociais. E, neste ano, o tom foi finalmente acertado”, avalia a especialista em marketing político Martha Romano, da agência Caê. 

Para ela, temas como o fim da escala 6×1 e o imposto de renda zero para quem ganha até R$ 5 mil conseguiram furar a bolha ideológica e mobilizar pessoas que até então não se viam representadas pelo discurso progressista.

Um estudo da Nexus – Pesquisa e Inteligência de Dados em parceria com a CNN Brasil reforça esse movimento: no debate sobre a escala 6×1, 67% das publicações nas redes sociais foram favoráveis à proposta, chegando a 87% no X (ex-Twitter) e 86% no TikTok. 

Outro levantamento, feito pelo Projeto Brief em parceria com a Swayable, mostrou que 70% da população apoia a mudança, com adesão que vai muito além dos eleitores de esquerda. É um exemplo claro de quando uma pauta socialmente concreta transforma a forma como a esquerda é percebida.

Quando a esquerda venceu o debate

A consolidação desse novo cenário também apareceu em momentos de crise. Após as medidas cautelares do ministro Alexandre de Moraes contra Jair Bolsonaro, em 2025, a esquerda conseguiu dominar os trending topics da rede X. 

A expressão “Chuva de Lula” ultrapassou 1 milhão de menções e “Democracia Sempre” chegou a 411 mil, superando a reação bolsonarista em volume de engajamento. Foi uma demonstração de força que quebrou a narrativa da direita em um momento decisivo.

“Tem um pessoal da extrema direita que é muito criativo. Eles estudam como as plataformas funcionam e usam isso dentro do discurso deles. O que a gente tem que fazer é a mesma coisa: dominar as plataformas, testar formatos e ousar”, reforça Martha Romano. Para ela, ousadia não precisa ser confundida com radicalização: “É possível ser criativo, ágil e até usar humor, mas sem repetir as mesmas armas da extrema direita”.

“É possível ser criativo, ágil e até usar humor, mas sem repetir as mesmas armas da extrema direita”, afirma Martha Romano.

Influenciadores de esquerda para ficar de olho

O avanço também passa por influenciadores digitais que conquistam espaço com linguagem própria. A historiadora Laura Sabino, por exemplo, reúne mais de 450 mil seguidores no Instagram e 215 mil no YouTube. Perfis como @esquerdapensante (200 mil seguidores) e @sempreesquerda13 (125 mil) têm mostrado forte engajamento, especialmente no Instagram. 

Já o comediante Tiago Santineli cresceu de 388 mil para mais de 800 mil inscritos no YouTube em 2023 ao satirizar adversários da esquerda com humor ácido. No campo político, a deputada Erika Hilton aparece entre as lideranças com maior engajamento no Instagram, com média de 178 mil interações por post, segundo relatório da Zeeng.

“Percebo que ainda tem muita liderança que foca no ‘textão’, num formato que funcionava nos anos 1980. Nas redes, a linguagem é outra e precisamos saber nos adaptar”, conclui Martha Romano.

Os dados mostram que a esquerda não apenas compreendeu a importância da disputa digital, mas também começa a colher frutos dessa mudança de postura. O caminho é longo, como lembram especialistas, mas a trajetória recente indica que o campo progressista deixou de apenas reagir e passou a pautar. E, em uma sociedade cada vez mais conectada, isso pode fazer toda a diferença.

Momentos em que a esquerda venceu nas redes

Escala 6×1 — estudo da Nexus/CNN Brasil mostrou que 67% das publicações foram favoráveis à proposta, chegando a 87% no X e 86% no TikTok.

Medidas contra Bolsonaro — após decisão de Alexandre de Moraes, hashtags como “Chuva de Lula” (1 milhão de menções) e “Democracia Sempre” (411 mil) superaram a reação bolsonarista.

Debate tributário — a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil teve forte adesão e alcançou públicos além da esquerda tradicional.