Focus Brasil reproduz a entrevista de Alberto Cantalice ao site Criativos. Cantalice é autor do livro “Qual socialismo?” (Ed. Hucitec) lançado na última sexta (19), no Rio de Janeiro

Entrevista: Alberto Cantalice lança livro e discute os caminhos de uma nova Utopia em “Qual socialismo?”
Alberto Cantalice faz estreia com o livro “Qual socialismo?”
Foto: Reprodução

Reprodução: Criativos

Alberto Cantalice nasceu em 1964, no início dos anos de chumbo. É formado em Direito e tem curso de formação de quadros no Instituto de Estudos Sociais, em Moscou, na antiga da União Soviética. Militou no Partido Comunista Brasileiro (PCB) até 1990, e participou representando o partido na juventude do MDB, quando da ilegalidade. 

Participou do movimento estudantil secundarista na cidade de Nova Iguaçu (RJ), de onde é originário, refundando a União Iguaçuana de Estudantes Secundaristas  (UIES), extinta pela ditadura, atuou no movimento associativo urbano, no Movimento Amigos de Bairro (MAB) e na Federação das Associações de Moradores do Estado do Rio de Janeiro (FAMERJ).

Nesse período, no PCB, foi membro das direções de base e intermediárias. Por entender que estava esgotado o ciclo de partidos de quadros descolados da vida cotidiana do povo, entrou no Partido dos Trabalhadores (PT), em 1991. E nele, ocupou a presidência do Diretório Municipal de Nova Iguaçu (RJ), e, por dois mandatos, a presidência do Diretório Regional do Rio de Janeiro. 

Entrevista: Alberto Cantalice lança livro e discute os caminhos de uma nova Utopia em “Qual socialismo?”
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É membro do Diretório Nacional do PT. Foi secretário de comunicação e vice-presidente do PT Nacional de 2013 a 2020. Atualmente é diretor de comunicação da Fundação Perseu Abramo (FPA), órgão do Partido dos Trabalhadores responsável pela formação política e produção de conhecimento. É também na FPA, um dos coordenadores do Núcleo de Apoio às Políticas Públicas (NAPP) de Segurança Pública, desde 2021.

Alberto, já muito jovem, você militava no Partidão (PCB), chegando a estudar na antiga União Soviética. Você nasceu em uma família politizada, certamente, e qual, ou quais foram suas inspirações ainda quando menino?

A minha opção pelo PCB começou nas minhas idas à sede do antigo MDB, em Nova Iguaçu, em 1976 na campanha de Francisco Amaral para prefeito. No início a candidatura foi impugnada pelo juiz eleitoral, dizendo ser Chico apoiado por comunistas. Foi a primeira vez que ouvi diretamente essa palavra: comunista.

Antes já tinha ouvido esparsamente que o meu tio – já falecido – Arthur Cantalice teria sido preso em 1973, por vinculações com os comunistas. Foi a partir das reuniões do MDB que em contato com os velhos comunistas de Nova Iguaçu, que acabei me vinculando.

O fim da União Soviética, motivou sua entrada no Partido dos Trabalhadores, em 1991, ou foi só uma coincidência, pois você já costurava a mudança, como disse, para um partido mais envolvido com a vida cotidiana do povo?   

O fim da União Soviética, o isolamento do PCB, e a proposta de criação do então PPS. Sem base orgânica e descolado do povo me fez buscar um caminho alternativo. Percebi que só com vínculos efetivos com as classes trabalhadoras, se poderia vislumbrar mudanças substantivas na política e na vida brasileira. Por isso a opção pelo Partido dos Trabalhadores.

Sendo um dirigente destacado do PT, passando por várias instâncias importantes do partido mais consistente entre as agremiações progressistas do continente, como você vê comentários, de que o partido abandonou suas origens, se distanciando das bases?

O PT que no seu início tinha uma visão exclusivista e até sectária quanto a política de alianças, passou por um “agiornamento”. Foram essas alianças, cujo ápice foi o 2° turno das eleições de 1989, que permitiu que Lula virasse presidente da República em 2002.

Quanto às críticas, algumas procedem. Houve uma certa burocratização das instâncias dirigentes; uma incompreensão das mudanças no mundo do trabalho e uma institucionalização exacerbada. Entretanto, 550 mil petistas participaram da recente eleição interna. O PT está presente em todas as grandes comunidades periféricas do país. Retomou seus laços com o mundo da cultura. O país mudou. O PT não ficaria imune a essas mudanças.

Num mundo que parece se inclinar para a extrema direita como se voltasse aos anos 20, 30, do século passado, uma nova utopia parece urgente, mesmo. Há esperança? O modelo chinês pode ser um alento? 

O PT defende o socialismo democrático. Defende a alternância de governo e é contra partido único. Tal qual os chineses dizem que o socialismo deles é de características chinesas, o nosso tem que ser autenticamente brasileiro. É preciso, no entanto, superar os limites do capitalismo predador. O capitalismo neo e ultraliberal, hoje plataformizado e que inverteu a própria lógica do capitalismo da época de Marx: o circuito: mercadoria, dinheiro, mercadoria. Não há futuro para as novas gerações. É o socialismo com mercado, ou então a barbárie.

Fale algo que seja de seu interesse e eu não perguntei. Comente também sobre o livro, se quiser – sem spoiler, claro. 

Fiz esse livro com o título Qual Socialismo: a busca incessante por uma nova utopia, como uma tentativa de dialogar com os ativistas políticos. Principalmente os jovens. Tracei uma breve trajetória das ideias socialistas e proponho o desafio por um novo modelo. Já que tanto o capitalismo, quanto o velho modelo socialista estão esgotados.