Mino foi responsável por redefinir a linguagem jornalística e por construir veículos que marcaram gerações de leitores e profissionais

Morre Mino Carta, um dos maiores nomes do jornalismo brasileiro
Mino Carta alertava que “a imprensa está sendo engolida e escravizada pelas novas mídias”, uma visão crítica sobre os impactos da revolução tecnológica Foto: Carta Capital


O jornalismo brasileiro perdeu nesta terça-feira, 2 de setembro de 2025, um de seus personagens mais marcantes. Demetrio “Mino” Carta, fundador de algumas das principais revistas e jornais do país, morreu em São Paulo aos 91 anos, após semanas de internação. 

Dono de uma trajetória que atravessou mais de seis décadas de imprensa, Mino redefiniu a linguagem jornalística e construiu veículos que formaram gerações de leitores e profissionais.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva manifestou pesar pela morte do amigo e decretou três dias de luto oficial. “Recebi com profunda tristeza a notícia da morte do meu amigo Mino Carta. 

Um dos maiores jornalistas da história do nosso país. Corajoso, dono de espírito crítico e inovador, fundou ou ajudou a fundar algumas das principais revistas e jornais brasileiros (…). Sua trajetória foi marcada pelo compromisso com a democracia, pela busca da verdade e pela defesa de um país mais justo e igualitário”, escreveu Lula.

Inovação e coragem diante do poder

Nascido em Gênova, na Itália, em 1933, chegou ao Brasil ainda jovem, em meio às consequências da Segunda Guerra Mundial. Logo cedo mergulhou no universo da escrita e encontrou no jornalismo sua vocação. 

Aos 16 anos publicou seus primeiros textos e, poucos anos depois, já estava envolvido em grandes projetos editoriais. Sua carreira foi marcada pelo espírito inovador e pela coragem de enfrentar os poderes constituídos, mesmo durante a ditadura militar brasileira, quando denunciou casos de tortura em Veja e sofreu interrogatórios por isso.

Colegas da redação também lembram sua presença imponente e capacidade de liderança. Em memória publicada pela CartaCapital, ficou registrado que “Mino ditava o ritmo, tocava e carregava o piano”, evocando o ambiente intenso de sua sala, onde jornalistas entravam apreensivos e saíam impactados pelo rigor e pela paixão com que ele conduzia o trabalho. Em 1960, fundou Quatro Rodas, revista que inaugurou uma nova forma de falar de automobilismo no Brasil.

Poucos anos depois, revolucionou o jornalismo impresso ao criar, com outros nomes, o Jornal da Tarde, considerado até hoje um marco pelo estilo moderno de diagramação e pelo texto mais literário. Em 1968, com a criação da Veja, tornou-se referência definitiva ao consolidar a ideia de uma revista semanal de informação no país.

Uma trajetória que moldou a imprensa

Nos anos seguintes, não parou de ousar. Foi um dos fundadores da IstoÉ, em 1976, e idealizou o efêmero, mas simbólico, Jornal da República. Em todos esses projetos, manteve-se fiel à defesa de um jornalismo crítico, atento à democracia e às contradições do poder. Essa postura o levou a embates com a ditadura militar, quando publicou reportagens sobre tortura e perseguições, enfrentando pressões e riscos pessoais.

Em 1994, lançou aquele que seria o projeto de sua vida: a revista CartaCapital. Ao longo de três décadas, transformou a publicação em espaço de resistência, análise crítica e cobertura aprofundada da política nacional. Sob sua direção, a revista produziu reportagens de grande impacto, sempre com independência editorial e compromisso com a verdade factual.

Além da atuação jornalística, Mino se aventurou na literatura, com romances como O Castelo de Âmbar e A Sombra do Silêncio, nos quais levou para a ficção seu olhar atento sobre o Brasil. Recebeu diversas homenagens e prêmios ao longo da vida, mas seu maior legado foi a influência sobre gerações de jornalistas, que aprenderam com ele a valorizar a ética, a coragem e a clareza diante dos fatos.

Mino Carta deixa não apenas uma obra editorial robusta, mas também a lembrança de um jornalista que ousou sonhar com uma imprensa livre, crítica e comprometida com a democracia. Sua morte encerra um ciclo, mas sua trajetória permanece como referência incontornável da história da comunicação no Brasil.