Desenvolvida a partir dos trabalhos de grupo de especialistas da região, publicação subsidia debate sobre modelo econômico local e sustentabilidade

Cartilha sobre COP30 e desenvolvimento da Amazônia está disponível para download
Cartilha aborda 13 pontos para o desenvolvimento econômico do bioma

Em funcionamento desde o início do ano, com a realização de reuniões, seminários e debates, o Grupo de Trabalho da Amazônia da Fundação Perseu Abramo lança agora a publicação “COP 30 e o Desenvolvimento na Amazônia”.

O objetivo é subsidiar as discussões sobre o assunto, não só no âmbito do evento internacional que irá ocorrer em novembro, na capital paraense, mas na perspectiva de promover conversas aprofundadas sobre o modelo econômico na região com centralidade na melhoria de vida para a população local.

“Trabalhamos para atualizar o nosso discurso perante a sociedade. Precisamos articular o tema do meio ambiente com o desenvolvimento, a preservação das florestas com uma perspectiva de futuro. Isso é fundamental, queremos dialogar com as pessoas que estão nas cidades da região Norte”, diz Paulo Okamotto, presidente da fundação. 

Com o lema “floresta em pé, com os brasileiros da Amazônia também em pé”, a cartilha aborda 13 pontos para compreensão de um discurso que alia a preocupação com as questões climáticas com a necessidade de desenvolver economicamente a região a partir de pilares como: a importância da integração regional com os países que compõem o bioma, a consolidação de um mercado por meio de produtos locais, o uso da ciência e das novas tecnologias, a segurança das fronteiras e o protagonismo do povo amazônico.

Sociobioeconomia no centro

Para entender o que está em jogo e as possibilidades de atuação, a publicação traz o conceito da sociobioeconomia, que é um campo interdisciplinar que estuda as interações complexas entre fatores sociais, biológicos e econômicos na formação e funcionamento de uma sociedade, buscando compreender como esses fatores influenciam e são influenciados uns pelos outros. 

O conceito-chave ganhou força como um contraponto a um modelo de destruição da floresta, comenta Pedro Silva Barros, que coordena os trabalhos do grupo e é conselheiro da FPA. Pesquisador do IPEA, na liderança do projeto “Integração Regional: o Brasil e a América do Sul”, ele fala sobre a equação entre preservação e desenvolvimento. 

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Manejo sustentável do açaí no Marajó / crédito: Ronado Rosa – Embrapa

“O modelo de mineração, que é muito importante e cresceu nas últimas décadas no Pará, e também o da produção de soja e pecuária não podem ter a mesma velocidade de crescimento nas próximas duas décadas porque isso implicaria em uma destruição de áreas muito maiores de florestas. O que temos como desafio é diversificar a produção e desconcentrar, não só em minério, gado e soja, mas também com produtos da bioeconomia”, afirma Pedro Silva Barros. 

O pesquisador destaca que atualmente, uma fração muito pequena de produtos compatíveis com a floresta é produzida na Amazônia, então, ainda existe um espaço muito grande no mercado mundial. “Ficamos anestesiados em ciclos econômicos como o da borracha e do agronegócio, com pouca diversidade de produção”, pontua. 

Para exemplificar, ele cita o caso da castanha-do-Brasil, que é mais conhecida como castanha-do-Pará. O país produz o equivalente a 5% do mercado mundial, enquanto a vizinha Bolívia abocanha cerca de 50% das exportações. 

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Castanha-do-Brasil / crédito: Pedro Guerreiro – Agência Pará

A saída para a ampliação da variedade de produção local passa por questões fundiárias, segundo Esther Bemerguy, integrante do GT da Amazônia. “A sustentabilidade na Amazônia está relacionada à posse e gestão da terra. Essa precisa ser a nossa questão. Se conseguíssemos considerar isso como crucial para as mudanças climáticas e para a economia na Amazônia, já poderíamos nos dar por satisfeitos”, comentou em evento sobre Justiça Climática realizado no Encontro Nacional do PT no mês passado. 

A economista, com atuação na gestão pública, e, assim como Pedro Silva Barros, conselheira da fundação, apontou que a diversidade biológica da região é fruto da inovação tecnológica de comunidades tradicionais como indígenas, quilombolas e ribeirinhos extrativistas. 

Outro ponto de atenção para entender o contexto econômico atual está relacionado à distribuição das pessoas no território. No período entre 2010 e 2022, a região Norte foi a que apresentou o maior aumento na taxa de urbanização no país. Isso ocorre, segundo Pedro Silva Barros, devido a problemas de infraestrutura, comunicação e serviços públicos no interior dos estados da região. 

De acordo com o último censo do IBGE, o Norte apresenta a maior fatia dos que vivem em favelas no Brasil, 19% da população. A taxa de favelização nas capitais Belém (PA) e Manaus (AM) supera os 50%. 

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Porto de Manaus – Divulgação

COP30 em Belém

Segundo o texto da cartilha, “a realização da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, em Belém do Pará, representa muito mais do que a escolha de uma sede: trata-se de uma oportunidade histórica para posicionar a Amazônia como centro de uma nova agenda global de desenvolvimento sustentável”. 

Na síntese do grupo sobre o tema, aparece que “ao sediar a COP30, o Brasil assume o papel de líder na agenda de enfrentamento da crise climática e nas propostas para transição energética, buscando soluções que rompam com a histórica dicotomia entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental”. 

Para Pedro Silva Barros, é importante que apareça na discussão que, apesar da COP ser na Amazônia, as decisões sobre o futuro da região pertencem aos países que integram o bioma (Brasil, Peru, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Guianas, Suriname, Equador). 

Para que isso seja reafirmado, é importante fortalecer os instrumentos de governança com os países vizinhos, em especial, a OTCA – Organização do Tratado de Cooperação Amazônica. O último encontro do grupo ocorreu há duas semanas em Bogotá, na Colômbia. 

“O mundo se comprometeu a uma quantidade de recursos enormes para evitar o colapso climático, mas os dados indicam que menos de 25% do que foi acordado no Acordo de Paris foi desembolsado”, lembra o pesquisador, que destaca ainda a postura do presidente dos Estados Unidos no esvaziamento dos espaços de cooperação internacional e o papel do Brasil ao reafirmar os valores do multilateralismo.  

Sobre a proposta de congelamento total das emissões, Pedro Silva Barros aponta que o consumo per capita de energia na Amazônia, por exemplo, é muito abaixo da média mundial, e que é importante que seja construído um mecanismo que considere essa assimetria e traga o compromisso com a diminuição das desigualdades entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento. 

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crédito: Ronaldo Rosa – Embrapa

“Defendemos que a Amazônia não é um santuário, a questão não é deixá-la intocada, isso é fundamental para garantir vida digna para os brasileiros que vivem lá” e completa: “manter a floresta em pé na Amazônia para que o resto do mundo viva bem, mas quem vive na Amazônia não tenha acesso às oportunidades de desenvolvimento não é aceitável”.