O método que permite pagamentos instantâneos teve embrião durante o governo de Dilma Rousseff e só se concretizou no governo de Michel Temer em razão golpe de 2016

Afinal, quem criou o Pix? Entenda por que Bolsonaro não é o "pai" do sistema

Desde que o Pix, um sistema de transferência monetária imediata, se popularizou entre os brasileiros, o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou, sucessivas vezes, reivindicar o título de “pai do Pix”.

O ex-presidente, no entanto, está mais próximo do título de “pai da mentira” do que da criação do sistema – mais uma desinformação promovida por algum bolsonarista. O Pix só tem um “pai”: o Banco Central do Brasil.

Com discussões embrionárias ainda durante o governo de Dilma Rousseff, o “Pix” foi criado pelo BC em 2017, com total autonomia da instituição, sem qualquer interferência do Poder Executivo.

Fake news sobre a criação do Pix

Recentemente, uma ofensiva do governo dos Estados Unidos, por interferência direta do presidente Donald Trump, decidiu atacar o sistema de pagamentos Pix, no Brasil. O uso cada vez mais comum do sistema tem afetado o lucro de grandes bancos e bandeiras de cartões de crédito.

Logo em seguida, uma campanha de desinformação entrou em campo nas redes sociais brasileiras, de forma quase coordenada. Em resposta, o governo federal iniciou campanha de defesa, desmistificação e com esclarecimentos sobre o Pix. As mentiras vão desde a origem e “propriedade” da criação do Pix, falsamente atribuída a Jair Bolsonaro, a mentiras sobre taxas, mudanças e uso do sistema de pagamentos e transferência de divisas.

E por falar em verdade, quando o Pix foi lançado oficialmente, em 2020, durante a gestão de Bolsonaro, até o sexto mês de funcionamento, o presidente sequer havia utilizado o sistema. À época, o Sindicato dos Funcionários do Banco Central (Sinal) publicou nota indicando que o presidente, ao contrário, havia trabalhado para a não implementação do sistema, criando dificuldades.

A entidade ressaltou o trabalho técnico dos servidores e criticou o uso político do sistema. Hoje atacado por grandes corporações bancárias, defender o sistema, no entanto, é uma decisão política.

Bolsonaro desconhecia o Pix

Em 2020, durante uma “entrevista” no cercadinho que sua gestão construiu para atender – e apartar – jornalistas no Alvorada, o ex-presidente Jair Bolsonaro demonstrou desconhecer o Pix, quando um apoiador resolveu parabenizá-lo pela criação do sistema, que teve que lhe explicar do que se tratava.

“Não tomei conhecimento, vou conversar esta semana com o Campos Neto [presidente do Banco Central]”, disse o presidente, segundo reportagem do UOL. Ou seja, o próprio presidente deixou claro que não só não tem nada a ver com a criação, como sequer sabia do que se tratava.

Segundo a CNN, em abril de 2022, Bolsonaro disse que não tinha aderido ao novo sistema de pagamentos. “Mais de 100 milhões tem Pix no Brasil. Eu não tenho, tô afim de fazer um aí. Cai dinheiro na conta da gente de graça? Se pedir, o pessoal bota? Vou fazer meu Pix aí”, disse durante live transmitida nas redes sociais.

Recentemente, o ex-presidente afirmou que sustentava a família de seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal do PL de São Paulo, com o dinheiro que recebia de apoiadores via Pix. Eduardo é acusado de traição, e aliás, orgulha-se de trabalhar nos Estados Unidos contra os interesses do Brasil.

A verdade sobre a criação e o funcionamento do Pix

O “pai” do Pix é o corpo técnico do Banco Central do Brasil, que trabalha de forma autônoma. “As especificações, o desenvolvimento do sistema e a construção da marca se deram entre 2019 e 2020, culminando com seu lançamento em novembro de 2020”, explicou o Banco Central em nota em 2022, quando fake news sobre a criação do sistema começou a circular novamente – a primeira vez teria sido em 2020.

“A agenda evolutiva do Pix é permanente e prevê o lançamento de diversas novas funcionalidades a serem entregues nos vários anos à frente”, explicou a nota. À época, o presidente do Banco Central era Ilan Goldfajn, que iniciou os estudos e debates internos para a criação de um sistema que facilitasse transferências instantâneas de dinheiro, a qualquer hora do dia, sem depender de intermediários como DOC ou TED.

A proposta era criar uma solução de pagamento que atendesse às demandas da sociedade digital, aumentasse a competição no setor financeiro e promovesse a inclusão bancária. A ideia foi amadurecida, estruturada e oficialmente lançada como projeto no segundo semestre de 2019, já sob a presidência de Roberto Campos Neto no Banco Central, que havia sido indicado por Bolsonaro, mas manteve a agenda técnica já em curso.

O pagamento instantâneo foi lançado na gestão de Jair Bolsonaro, em 2020, mas começou a ser preparado no período do governo de Michel Temer (MDB). Nada disso liga o programa à personificação de sua criação e sucesso.

Embrião durante governo Dilma

As primeiras discussões sobre um sistema de pagamentos instantâneos no Brasil começaram ainda durante o governo de Dilma Rousseff, embora não esteja ligado diretamente à sua gestão.

Entre 2013 e 2015, o Banco Central já vinha observando o avanço das tecnologias digitais no setor financeiro e analisando alternativas para modernizar os meios de pagamento no país. Embora o projeto ainda não tivesse o nome “Pix”, documentos internos e reuniões técnicas da época já tratavam da necessidade de criar um sistema que permitisse transferências em tempo real, a qualquer hora, com baixo custo e ampla acessibilidade.

Esses debates iniciais foram fundamentais para embasar os estudos técnicos que seriam aprofundados anos depois, no governo Temer. O ambiente regulatório começou a ser preparado ainda durante a gestão de Dilma, mas o projeto só ganhou estrutura e cronograma formal a partir de 2018.

Lançamento em 2020

Após testes de desenvolvimento ao longo de 2019 e parte de 2020, o Pix foi oficialmente lançado em novembro de 2020. A popularização do recurso foi acelerada pela pandemia de Covid-19, quando cresceu a necessidade de meios digitais para transações financeiras.

Ainda em seu primeiro mês, o Pix movimentou mais de R$ 80 bilhões. Desde então, se tornou o principal meio de pagamento no país, superando TED, DOC e até mesmo o uso de cartões de débito em algumas faixas da população.