Bloqueio de contas de Eduardo, fuga de Flávio e declarações negacionistas de Jair Bolsonaro revelam isolamento e tensão entre os filhos do ex-presidente

Eduardo Bolsonaro afronta STF, Flávio foge do país e pai nega o óbvio: nova crise expõe desespero da família
Lula Marques/Agência Brasil


A sequência de eventos envolvendo Jair Bolsonaro e seus filhos nesta semana reacende a tensão no núcleo bolsonarista e evidencia um padrão já conhecido: o confronto com as instituições, o recurso ao vitimismo e o desprezo pela legalidade. 

Entre fugas estratégicas, bravatas calculadas e negações pouco críveis, o clã Bolsonaro volta a colocar o Brasil diante de uma crise política marcada por afrontas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e tentativas desesperadas de mobilização da base mais radical.

Tudo para salvar o inelegível 

O ministro Alexandre de Moraes (STF) determinou o bloqueio de contas bancárias e chaves PIX do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que atualmente vive nos Estados Unidos em meio a suspeitas de conspirar contra o Brasil em troca da anistia ao pai, Jair Messias Bolsonaro, hoje inelegível, e asseclas.

Na segunda-feira (21),  decisão do ministro Alexandre de Moraes determinou o bloqueio das contas bancárias e do sistema Pix do deputado federal Eduardo Bolsonaro, que também teve os sigilos fiscal e bancário quebrados. 

A medida foi autorizada após apurações sobre envio de recursos aos Estados Unidos. A decisão ocorreu um dia após o fim da licença do deputado, que expirou no domingo, 20 de julho, tornando-o novamente sujeito ao exercício pleno de suas obrigações parlamentares. 

A medida é parte de uma investigação que corre sob sigilo e que apura a movimentação financeira do parlamentar no contexto de possível financiamento ou articulação contra o Estado Democrático de Direito. 

Mesmo com os recursos congelados, Eduardo partiu para o ataque: afirmou que não irá renunciar e disse que “não existe nenhum elemento que justifique” as medidas determinadas por Moraes.

“Não existe nenhuma justificativa para bloqueio de bens ou quebra de sigilo”, declarou, tentando deslegitimar a decisão do Supremo. “Não renunciarei ao mandato. Tenho muito orgulho de estar aqui e de ter recebido quase 1,6 milhão de votos em 2018”, completou, em tom de desafio ao Judiciário.

O bloqueio financeiro e outras providências adotadas pelo STF indicam que as investigações avançam sobre os mecanismos de financiamento da rede de desinformação e de ataques às instituições democráticas. 

A medida contra Eduardo reforça que o cerco aos filhos do ex-presidente não se limita a investigações sobre a atuação de Jair Bolsonaro, mas envolve toda uma estrutura familiar e política.

Eduardo Bolsonaro afronta STF, Flávio foge do país e pai nega o óbvio: nova crise expõe desespero da família
O Senador Flavio Bolsonaro (PL)
Lula Marques/Agência Brasil

Flávio foge para a Europa no dia da operação

Enquanto Eduardo falava em resistência e bradava contra o Supremo, seu irmão, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), embarcava rumo à Europa. A viagem foi confirmada por sua assessoria, que alegou “compromissos pessoais previamente marcados”. A coincidência com a operação na casa do pai, Jair Bolsonaro, no mesmo dia, não passou despercebida.

A movimentação, no mínimo controversa, ocorreu horas após a deflagração de nova ação da Polícia Federal. Questionado pela imprensa sobre a operação e sobre o fato de estar fora do país, Flávio limitou-se a dizer que não há relação entre os fatos e que viajou para tratar de “questões pessoais”. 

Na prática, a ausência do senador no momento de maior pressão sobre a família reforça a percepção de que há uma tentativa de evitar constrangimentos e exposição.

A viagem não é ilegal, mas é reveladora. Mostra um comportamento recorrente: na hora do enfrentamento, a escolha é pela fuga, simbólica ou literal. Enquanto Eduardo se posta como mártir da liberdade de expressão, Flávio silencia e desaparece, repetindo a estratégia de desaparecimento já adotada em outros momentos delicados.

Bolsonaro nega o óbvio e tenta desviar foco

Já Jair Bolsonaro tenta negar o inegável. Neste fim de semana, o ex-presidente divulgou nota à imprensa negando que tenha descumprido a proibição de uso das redes sociais, medida imposta por Moraes no inquérito que apura sua conduta após os ataques golpistas de 8 de janeiro. O motivo da nova controvérsia foi a publicação de um vídeo em seu canal no YouTube, conteúdo removido logo após a repercussão.

Em nota, Bolsonaro alegou que o vídeo foi publicado por “erro operacional” da equipe e que ele “não tem ciência e nem participa da gestão de suas contas digitais”. 

O argumento é frágil. O canal utilizado pertence ao próprio ex-presidente e é uma de suas principais ferramentas de comunicação política desde que deixou o Planalto. A alegação de que não controla o próprio canal destoa de toda a sua trajetória pública, baseada justamente no uso intenso das redes para mobilizar sua base.

Além disso, a publicação do vídeo ocorreu dias depois de o ministro Moraes reiterar as restrições impostas a Bolsonaro. A reincidência levanta dúvidas sobre o grau de controle do ex-presidente sobre sua equipe e sobre a real disposição em seguir as ordens judiciais.

Isolamento crescente e tática do confronto

A postura de Eduardo, a fuga de Flávio e a negativa mal explicada de Bolsonaro ilustram a estratégia que o clã tem adotado: confrontar o Judiciário, vitimizar-se para manter o apoio da base radical e tentar deslegitimar as investigações como suposta perseguição política. No entanto, os sinais de desgaste são cada vez mais evidentes.

O Congresso, ainda majoritariamente conservador, já não se mobiliza como antes para blindar os Bolsonaro. Parlamentares do próprio PL e de partidos aliados demonstram desconforto com o acúmulo de escândalos e o impacto sobre a imagem pública. Fora do país, a imagem do ex-presidente e de seus filhos também está fragilizada, vide a repercussão negativa nos meios diplomáticos e empresariais sobre a tentativa de intervenção de Trump em assuntos internos do Brasil.

Mais do que uma nova crise familiar, os episódios da semana revelam o esgarçamento de uma estratégia política baseada na guerra permanente contra instituições. A retórica beligerante que antes mobilizava multidões começa a produzir mais ruído do que resultado. Com as investigações em curso, a Justiça avança, e o país observa. Desta vez, o desfecho pode não ser o mesmo.