Deboche na Câmara: oposição exibe bandeira de Trump em protesto contra proibição de homenagem a Bolsonaro
Ato da oposição escancara contradição bolsonarista ao defender Trump em meio ao tarifaço contra o Brasil. Gesto gerou racha no grupo e vergonha no plenário
Um protesto inusitado e revelador ocorreu na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (22). Em meio ao recesso informal do Congresso, parlamentares da oposição exibiram uma bandeira de apoio ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, justamente o responsável pela ameaça de sobretaxar produtos brasileiros em 50%.
A cena se deu durante uma entrevista coletiva convocada em resposta à decisão do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que proibiu reuniões de comissões no período de 22 de julho a 1º de agosto.
A faixa com o rosto de Trump foi estendida por Delegado Caveira (PL-PA) e Sargento Fahur (PSD-PR), ambos aliados de Bolsonaro. A manifestação era uma tentativa de protesto contra a proibição de homenagens a Jair Bolsonaro (PL), alvo de novas medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal. Mas a escolha do símbolo evidenciou um paradoxo: em vez de empunhar a bandeira do Brasil, os deputados usaram uma bandeira de campanha de um presidente estrangeiro que acaba de anunciar medidas duras contra o país.
Divisão interna no bolsonarismo
O gesto foi imediatamente repreendido por outros membros da própria oposição. O deputado Zucco (PL-RS), líder da bancada, pediu que os colegas recuassem: “Estou te pedindo por favor para não fazer isso. Pode prejudicar”. O presidente da Comissão de Segurança Pública, Paulo Bilynskyj (PL-SP), também ordenou a retirada da faixa, afirmando que a ação estava fora do foco da reunião.
A cena expôs uma rachadura interna no bolsonarismo. Em entrevistas recentes, Bolsonaro tem negado qualquer envolvimento com a imposição da tarifa de Trump: “Não tem nada a ver com a gente. Querem colar na gente os 50%. Mentira”. Mas seu filho, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), admitiu que o tema foi tratado em reuniões com autoridades americanas, fato que enfraquece a linha de defesa do pai e sustenta a narrativa de que a oposição tem agido contra os interesses do Brasil.
Tentativa frustrada de criar fato político
A coletiva, realizada no Salão Verde da Câmara, pretendia ser um ato de força da oposição. Além da faixa com Trump, parlamentares levaram uma placa com o nome de Bolsonaro, tentando simular uma sessão simbólica. A ideia era deliberar moções de apoio ao ex-presidente, que havia prometido comparecer, mas recuou após alertas do STF sobre o risco de prisão por descumprimento de medidas cautelares.
O líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), classificou como “ilegal e antirregimental” a decisão de Hugo Motta de suspender as reuniões. Já o deputado Filipe Barros (PL-PR), presidente da Comissão de Relações Exteriores, prometeu retomar os trabalhos em agosto e anunciou mobilização de base e ações em organismos internacionais. Em sua fala, atribuiu o “tarifaço” de Trump a uma suposta falha diplomática do governo Lula: “Tudo que o presidente Trump faz é uma resposta ao trabalho da diplomacia do presidente Lula”.
Para quem ainda acha que pendurar a bandeira de outro país é patriotismo…
Dica de leitura: Complexo de vira-lata, de Marcia Tiburi
Calha ser oportuno ler (ou reler) este ensaio da filósofa Marcia Tiburi ao ver deputados brasileiros hasteando, com fervor, a bandeira de uma potência estrangeira no plenário da Câmara.
No livro, Tiburi disseca o “complexo de vira-lata” como sintoma profundo de uma elite submissa, que rejeita o Brasil enquanto idolatra seus algozes, ainda que estejam taxando nossas exportações em 50%.
A autora analisa como essa mentalidade colonizada se manifesta em discursos políticos, nos meios de comunicação e até no inconsciente coletivo, impedindo a construção de um projeto de país autônomo. Uma leitura indispensável para entender por que, diante de uma crise, há quem prefira gritar “Trump” em vez de defender os interesses nacionais.
Complexo de vira-lata
Autora: Marcia Tiburi
Editora Record | 192 páginas
Disponível nas principais livrarias
