PL da Devastação avança no Senado e Marina Silva aponta retrocesso
Ministra do Meio Ambiente defende que a legislação para o licenciamento ambiental pode ser modernizada, porém sem flexibilização na proteção ambiental

Neste domingo (1), manifestantes contrários ao Projeto de Lei 2.159/2021, conhecido como PL da Devastação, estiveram nas ruas de oito capitais. Em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Manaus, Porto Alegre, Florianópolis e Curitiba, milhares de pessoas participaram de atos puxados por ambientalistas com cartazes que pediam o veto do presidente à proposta.
Além disso, os atos demonstraram apoio e solidariedade à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, alvo de ataques de senadores em uma sessão recente da Comissão de Infraestrutura do Senado, que tratava sobre a criação de unidades de conservação na margem equatorial. A votação do PL da Devastação no Senado, que ocorreu em 21 de maio, teve 54 votos favoráveis e 13 contrários. O projeto da Lei Geral de Licenciamento Ambiental, discutido no Congresso desde 2004, foi aprovado em 2021 na Câmara dos Deputados.
Na casa alta, a relatora Tereza Cristina (PP/MS) aponta que o objetivo é uniformizar os procedimentos para emissão de licença ambiental no país e simplificar a concessão de licenças para os empreendimentos de menor impacto. Já os movimentos ambientalistas afirmam que o PL, na verdade, se trata da “mãe de todas as boiadas” – em referência a uma fala do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, que queria aproveitar brechas para “passar a boiada” em áreas de floresta na Amazônia.
Na etapa seguinte, agora, o projeto retorna à Câmara dos Deputados devido às mudanças que foram feitas pelo Senado e, se aprovado, será encaminhado para sanção ou veto do presidente Lula.
O projeto
O ponto focal da crítica dos ambientalistas é a criação da Licença por Adesão e Compromisso, a LAC. O novo dispositivo permite que empreendimentos de até médio porte sejam licenciados de maneira automática, bastando ao empreendedor preencher um formulário autodeclaratório, o que elimina a fase de estudos prévios de impacto ambiental e as definições de medidas compensatórias. Entidades apontam a inconstitucionalidade da medida.
Dessa forma, empreendimentos em unidades de conservação passam a poder ser licenciados sem a manifestação obrigatória prévia do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), o que abre margem para atividades econômicas em áreas de proteção ambiental.
Além disso, o mecanismo esvazia significativamente a atuação dos órgãos como o SISNAMA (Sistema Nacional do Meio Ambiente) e o CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente), além dos conselhos estaduais.
Na votação no Senado, um ponto de alerta foi a inclusão da emenda 198, de autoria do presidente Davi Alcolumbre (União Brasil), para a criação da Licença Ambiental Especial, a LAE.
Com a licença, fica possível o licenciamento simplificado também de grandes empreendimentos considerados estratégicos para o governo, como é o caso da exploração de petróleo e mineração. Atualmente, para um projeto deste porte são necessárias três etapas: prévia, instalação e operação.
O que pensa o Ministério do Meio Ambiente
Mesmo sob holofotes, em um contexto de ataques, a ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, Marina Silva, segue em alerta para articulações sobre a tramitação do PL. Isso porque a ministra se declarou contrária a pontos do projeto e disse que vai trabalhar, especialmente, para a derrubada da emenda proposta por Alcolumbre, relacionada aos empreendimentos estratégicos.
Segundo divulgado pela imprensa nesta segunda-feira (2), Marina Silva irá apostar no diálogo com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos), e com líderes partidários para tentar adiar a votação na casa.
O desafio de Marina não é pequeno. Além dos empreendimentos, como as médias e grandes obras, o agronegócio, que possui uma bancada expressiva no Congresso, também deverá se beneficiar bastante com a aprovação, pois as atividades agropecuárias em grandes áreas também serão dispensadas das etapas do licenciamento. O que pode acarretar no avanço desenfreado do desmatamento, incluindo o uso de agrotóxicos em áreas protegidas.
Sobre o assunto, a pasta divulgou um posicionamento contrário ao PL. “(…) representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país”, diz um trecho da nota oficial.
Nesta segunda-feira (2), após participar de um encontro de mulheres do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a ministra falou sobre o assunto aos jornalistas.
“O licenciamento pode ser aperfeiçoado, claro, para que a gente ganhe mais agilidade, mas isso não significa flexibilizar regramentos, não significa perda de qualidade. Os empreendimentos precisam passar por todas as fases do licenciamento para que a gente evite vários problemas como já tivemos no passado, inclusive em Mariana e Brumadinho”, disse Marina Silva. E completou: “a sociedade está dizendo para os seus representantes que é preciso um tempo para debater”.

O Observatório do Clima, uma coalização de organizações que tratam das pautas ambientais, soltou uma nota técnica com um parecer negativo ao projeto, detalhando ponto a ponto os riscos em caso de aprovação. “Em vez de estabelecer regras claras, juridicamente coesas e efetivas, como se espera de uma Lei Geral, o projeto abre caminho para o caos regulatório e o aumento da degradação ambiental”, destaca a entidade.