Pepe Mujica, o herói da simplicidade
Ex-presidente uruguaio morreu nesta terça-feira (13) após luta de décadas contra diversos problemas de saúde
Num de seus depoimentos mais célebres, compartilhado à exaustão nas redes sociais, José “Pepe” Mujica defende o que sempre pareceu um contrassenso vindo de um líder progressista de grande influência nas últimas décadas:
“Inventamos uma montanha de consumos supérfluos. Descarta-se. Compra-se. Mas o que se gasta é tempo de vida. Porque quando compro algo, não compro com dinheiro. Compro com o tempo de vida que tive que gastar para ter aquele dinheiro. Mas tem uma diferença. Tudo se compra menos a vida.”
O depoimento é a síntese da vida que levou Pepe, eleito presidente do Uruguai entre 2010 e 2015. Foi nesse período que o pequeno país sul-americano passou a ganhar status de uma das mais expressivas forças de esquerda no mundo, ao colocar em prática medidas como a legalização do aborto, do casamento entre pessoas do mesmo sexo e do consumo de maconha — todas ainda inéditas até mesmo em países do hemisfério norte onde os temas já eram amplamente debatidos.
Luta contínua
José “Pepe” Mujica, ex-presidente do Uruguai e símbolo global de integridade política, faleceu nesta terça-feira, 13 de maio de 2025, aos 89 anos, em sua residência rural nos arredores de Montevidéu.
A causa da morte foi um câncer de esôfago diagnosticado em 2024, que evoluiu para metástase no fígado. Em janeiro deste ano, Mujica anunciou publicamente que não se submeteria a novos tratamentos, optando por cuidados paliativos e pedindo para ser deixado em paz: “O guerreiro tem direito ao seu descanso” .
A morte foi confirmada pelo atual presidente uruguaio, Yamandú Orsi, em comunicado oficial: “Com profunda dor comunicamos que faleceu nosso companheiro Pepe Mujica. Presidente, militante, referência, liderança. Vamos sentir muito sua falta, velho querido! Obrigado por tudo que nos deste e por teu profundo amor pelo seu povo” .
Um presidente ouvido pelo mundo
Não foi só pelo que fez na cadeira mais alta do Uruguai que Mujica fez história. Na juventude, integrou o grupo guerrilheiro de esquerda Movimento de Libertação Nacional-Tupamaros, sendo preso várias vezes durante a ditadura militar (1973–1985) e passando quase 15 anos na prisão.
Após a redemocratização do país, entrou para a vida política institucional, ajudando a fundar a coalizão de esquerda Frente Ampla. Foi eleito deputado, senador e, mais tarde, presidente.
Além da gestão pioneira, Mujica ficou conhecido por seu estilo de vida simples: doava a maior parte de seu salário e vivia com sua companheira em uma chácara modesta nos arredores de Montevidéu. Desde então, tornou-se uma referência mundial por sua humildade e seu discurso ético sobre o consumo, a justiça social e a política. “A política não é uma profissão para te fazer rico (…) Não sou pobre. Pobres são os que necessitam muito. Eu, com o pouco que tenho, me satisfaço”, afirmou em várias ocasiões.
Após deixar a presidência, continuou ativo na política e na promoção de valores humanistas, embora cada vez mais recluso.
Pepe Mujica revelou publicamente, em abril de 2021, que sofria de uma doença imunológica crônica chamada vasculite, que compromete o sistema imunológico e os vasos sanguíneos. Também era portador de lúpus, uma doença autoimune. Embora convivesse com essas condições há anos, só as tornou públicas ao renunciar ao cargo de senador em 2020, explicando que a pandemia de COVID-19 representava um risco maior para sua saúde, devido à sua condição e idade.
Pepe Mujica lutava contra a doença desde antes de 2020, mas o tempo exato do diagnóstico não foi amplamente divulgado. Faleceu na tarde desta terça-feira (13), em Montevidéu, com a simplicidade com a qual conduziu toda a sua vida. Como ele mesmo nos ensinou: “A vida escapa de você minuto a minuto, e não dá para ir ao supermercado comprar mais vida.”
Os detalhes sobre os serviços fúnebres ainda não foram divulgados pelas autoridades uruguaias.
