Repensar fazendo e refazendo, por Jonas Paulo
“Cabe a análise sobre as razões da diminuição da nossa inserção nas áreas mais proletarizadas e nas periferias das cidades”, escreve o ex-presidente do PT da Bahia
Enfrentamos mais uma eleição municipal onde pudemos testar a nossa capilaridade política nacional e medir a nossa força e presença nos principais centros políticos nacionais e regionais, além de medir como estão chegando as obras, serviços e programas do governo do presidente Lula em cada comunidade, vila e bairro deste imenso e diverso país.
O diferencial desta eleição de 2024 é que, agora, voltamos ao Governo Federal; depois de participarmos, em 2016, numa conjuntura desfavorável do pós-golpe contra a Presidenta Dilma e, em 2020, com a extrema direita no governo federal eleito dois anos antes; em ambos os casos, estávamos em situação de extrema dificuldade e no isolamento político, pois foi uma conjuntura de resistência e sobrevivência política.
Agora, na volta ao governo federal, o quadro permaneceu difícil e complexo, pois as heranças e os entulhos da passagem da direita no Governo estão muito presentes e são de difícil remoção, como, por exemplo, o Orçamento Secreto e as famigeradas Emendas Pix, que permaneceram fazendo do Congresso Nacional sócios do ordenamento de despesas do Orçamento Público Federal, com os parlamentares fazendo investimentos em obras diretamente nos municípios, o que é uma anomalia administrativa e uma inversão grotesca da lógica de governo, além de ser uma imoralidade.
A eleição foi atípica, com os atuais prefeitos endinheirados, seja pelas emendas Pix para gastar ao bel-prazer, ou ainda pelo FPM turbinado, o FUNDEB atualizado e os precatórios liberados, um verdadeiro derrame de dinheiro público que tomou conta das eleições. Como nunca visto, foi estabelecido o império dos gastos não contabilizados nas campanhas, e o financiamento público, via FEFC, foi reduzido a um mero instrumento contábil.
De todas as formas, o nosso desempenho eleitoral ficou muito aquém do nosso potencial político. Se considerarmos que os Estados mais populosos e importantes do País, como São Paulo, o PT elegeu apenas três prefeituras, o Rio de Janeiro também apenas três prefeituras, o Paraná elegeu três prefeituras e o Pará, duas prefeituras petistas; todos Estados grandes e com estrutura partidária forte e líderes nacionais petistas, um resultado acanhado, mesmo que ainda estejamos disputando o 2º turno em três cidades paulistas.
Além disso, Estados que tinham tradição de governos municipais de referência, como o RS, baixamos para 19 prefeituras petistas, mesmo estando no 2° turno em POA, e mesmo MG, que manteve a liderança em duas grandes cidades como Juiz de Fora e Contagem com as prefeitas reeleitas. O crescimento de 28 para 35 prefeituras no universo de 853 municipalidades ainda ficou longe do patamar histórico de liderança nacional de Minas em Prefeituras do PT.
O resultado eleitoral do PT no País reproduziu mais uma vez uma nítida supremacia do Nordeste, seja na eleição de bancadas parlamentares municipais, seja na eleição de prefeituras petistas, e fomos bem nas reeleições como nas sucessões, mas também na conquista de novos mandatos de prefeituras na região Nordeste, sendo 68% das conquistas do Partido com destaque aos Estados que mantemos a hegemonia política nas últimas duas décadas, como: Bahia, Ceará e Piauí, que governamos com êxito administrativo e força política e eleitoral há quase duas décadas.
Cabe a análise sobre as razões da diminuição da nossa inserção nas áreas mais proletarizadas e nas periferias das cidades, onde estão as maiorias eleitorais e as populações mais pobres e vulneráveis, que hoje são muito pressionadas e disputadas pela presença da ação acolhedora do conservadorismo religioso e pela força da economia do ilícito e suas estruturas de ação paramilitar.
Além disso, também perdemos bases sociais históricas com a fragilização do movimento sindical e popular, resultante das profundas mudanças no mundo do trabalho, com a modernização tecnológica e automação, fortalecendo a economia dos serviços e o trabalho autônomo, que alterou a nossa relação política clássica com os trabalhadores com carteira assinada e sindicalizados, que foi o nosso diferencial e a principal matriz organizativa histórica do PT.
Sem dúvidas,está aceso um imenso sinal amarelo, exigindo de nós uma análise mais profunda para buscar fazer a correção de rumos e a requalificação da estratégia e das movimentações táticas para possibilitar a construção dos palanques vitoriosos em 2026, para as disputas estaduais e nacional, visto que o atual governo Lula, envolto numa correlação de forças congressual amplamente desfavorável, representa a transição democrática necessária para isolar o neofascismo e consolidar o Estado de Direito Democrático. Este é o seu principal objetivo na presente conjuntura.
Entendemos que, vencida esta etapa de reconstrução democrática, deveremos manter uma ampla frente política para viabilizar a sucessão do Presidente Lula e, em outra correlação de forças, buscar avançar mais na linha do projeto democrático e popular na nova gestão a ser conquistada pelo PT e seus aliados.
Enfim, o resultado eleitoral nos chama à reflexão sobre o papel do Partido como força política que dirige a coalizão de centro-esquerda que governa o País e sobre o caráter nacional do Partido, principalmente pela necessidade de expressar a diversidade do País e de ter capacidade de levar as nossas políticas públicas até a ponta, onde está o cidadão, e disputar os espaços de poder na base da sociedade. Para tal, precisamos de alianças políticas e sociais fortes e representatividade para operar o enraizamento do nosso projeto democrático que transforma o País.
Jonas Paulo é ex-presidente do PT da Bahia