Governo federal articula ‘operação de guerra’ contra incêndios e endurece resposta
O país tem hoje em campo 3.245 brigadistas, uma estrutura que mobiliza 22 aeronaves, 1.148 viaturas, 73 embarcações, mais 700 fiscais em campo. “A disposição do governo federal é de não ficar fazendo jogo de empurra. Nós queremos trabalhar em conjunto”, destacou a ministra do Meio Ambiente Marina Silva
Um dos maiores portais de notícias do país publicou em uma rede social uma série de imagens chocante, que mostra cenários de incêndios em biomas e retratos da seca severa que atingiram o Brasil na última semana. “Cenas que deixam o Brasil parecido com o apocalipse”, dizia a legenda. Não era um exagero.
Até o momento, a Polícia Federal instaurou mais de 50 inquéritos para identificar e responsabilizar os autores do que a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, definiu como “terrorismo ambiental”.
Nos jornais, essas foram algumas das manchetes que povoaram o noticiário na última semana: “Distrito Federal enfrenta a terceira maior seca de sua história”, “Defesa Civil alerta para chance de ‘chuva preta’ em São Paulo”, “Ibama flagra fazendeiro colocando fogo na própria terra em Tocantins”, “Queimadas custam ao menos R$ 2 bi em SP, e seca deve aumentar prejuízos no Brasil”, “Delegado da PF diz que há indícios de ação coordenada em incêndios”, “Ibama acredita que houve ordem para ‘Dia do Fogo’ em florestas do RJ”.
A resposta do governo federal tem sido imediata e sem rodeios. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve na segunda-feira (16), um dia de reuniões para discutir medidas em relação à grave emergência climática do país, agravada pela ação de criminosos ambientais.
Pela manhã, Lula discutiu o tema com o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, e os ministros Marina Silva (Meio Ambiente), Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), além de representantes do Ibama e ICMBio e o secretário executivo da Saúde, Swedenberger Barbosa. À tarde, o presidente voltou a se reunir com Marina e também Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República), Márcio Macêdo (Secretaria-Geral) e Rui Costa (Casa Civil).
O presidente Lula conversou ainda com os chefes dos Poderes, signatários do pacto com relação à questão climática. Ele se reunirá nesta terça-feira, às 16h30, com o presidente do Superior Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.
Durante as reuniões desta segunda, foi apresentado um diagnóstico detalhado da situação do país e propostas de medidas para aprovação.
Em Brasília, o presidente Lula e a primeira-dama, Janja, sobrevoaram no domingo (15) a Floresta Nacional de Brasília, afetada por um incêndio de grandes proporções que cobriu de fumaça parte da capital federal. A Polícia Federal (PF) instaurou inquérito para investigar o incêndio que atinge o Parque, próximo à Granja do Torto, residência oficial da Presidência da República.
Ministra defende endurecimento
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, classificou como inadequadas as penas previstas nas leis brasileiras para crimes ambientais como o uso do fogo para causar incêndios criminosos. “Porque a pena de dois a quatro anos de prisão é leve e quando a pena é leve, às vezes ela é transformada em algum tipo de pena alternativa e ainda há atitude de alguns juízes que relaxam completamente essa pena”, questionou.
A ministra reforçou ainda que, neste momento, qualquer incêndio florestal se caracteriza como criminoso e representa ameaças ao meio ambiente, à saúde pública, ao patrimônio e à economia brasileira.
Para a ministra, os criminosos se aproveitam da mudança climática, que tem causado altas temperaturas e eventos climáticos extremos, para atear fogo e causar a atual situação de incêndios no Brasil. “Há uma aliança criminosa entre ideologias políticas que querem negar a questão da mudança do clima”, observou.
“O presidente [da República] Lula ligou para o presidente [do Supremo Tribunal Federal] ministro Barroso para que haja suporte legal para que essa investigação possa acontecer com mais velocidade e temos toda uma articulação que vem sendo feita pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski”, diz.
Para Marina Silva, o serviço de inteligência tem sido fundamental para solucionar crimes de fogo intencional em áreas florestais. A Polícia Federal instaurou 52 inquéritos que investigam os pontos de ignição do fogo em diferentes regiões do país.
“Está sendo feito o monitoramento das imagens de satélite, que podemos retroagir para saber onde começou a ignição e chegar ao criminoso de origem”, explica. “A disposição do governo federal é de não ficar fazendo jogo de empurra. Nós queremos trabalhar em conjunto. Estamos trabalhando dentro das áreas estaduais, dentro das terras indígenas, dentro de propriedades privadas e em cooperação com o Corpo de Bombeiros”, salienta.
“Estrutura de guerra”
O presidente do Ibama Rodrigo Agostinho destacou em declaração na segunda-feira (16) que o governo federal montou uma verdadeira “estrutura de guerra” para conter e prevenir os incêndios criminosos. Disse que, neste início de semana, foram contabilizados 106 incêndios de grandes proporções no país, que estão sendo combatidos por bombeiros e brigadistas.
“A estrutura de combate a incêndio no Brasil é dividida numa estrutura dos estados, que são os bombeiros, e do governo federal para as áreas federais, os brigadistas do Ibama e do ICMBIO. Nós estamos hoje com 3.245 brigadistas, uma estrutura de guerra, uma estrutura que está mobilizando 22 aeronaves, 1.148 viaturas, 73 embarcações, mais 700 fiscais que estão fazendo um trabalho de fiscalização”, declarou Agostinho.
Segundo afirmou Agostinho, os danos ambientais provocados pelos incêndios são “realmente assustadores”, algo em torno de 2 milhões de hectares na região do Pantanal, o equivalente a 15% do bioma, e algo em torno de 4 milhões de hectares na Amazônia, o correspondente a 3% da floresta.
“São números que realmente nos assustam. Infelizmente, em algumas regiões as pessoas estão utilizando o fogo como forma de ampliar a ocupação do território, notadamente ao longo da BR 230 (Transamazônica), no começo da 319. A BR 163 concentra uma grande parte dos incêndios da Amazônia, uma área de franca expansão da atividade agrícola”, detalhou Agostinho.
Autoridade Climática
No dia 10 de setembro, durante visita a Manaus (AM), Lula anunciou a criação de uma Autoridade Climática e de um Comitê Técnico-Científico para apoiar e articular as ações do governo federal de combate à mudança do clima.
A declaração foi realizada após o presidente percorrer áreas afetadas pela seca e pelos incêndios no estado do Amazonas. Segundo o presidente, políticas públicas serão guiadas pelo Plano Nacional de Enfrentamento aos Riscos Climáticos Extremos.
“O nosso objetivo é estabelecer as condições para ampliar e acelerar as políticas públicas a partir do Plano Nacional de Enfrentamento aos Riscos Climáticos Extremos. Nosso foco precisa ser a adaptação e preparação para o enfrentamento a esses fenômenos. Para isso, vamos estabelecer uma autoridade climática e um comitê técnico científico que dê suporte e articule implementação das ações do governo federal”, disse Lula.
Manejo Integrado do Fogo
O presidente também assinou decreto que regulamenta a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo. A medida define as responsabilidades do Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo e do Centro Integrado Multiagência de Coordenação Operacional Federal (Ciman).
O grupo será responsável por atividades consultivas e deliberativas de articulação, propor mecanismos para detecção e controle dos incêndios florestais, análise e acompanhamento das demandas referentes ao combate aos incêndios, entre outras medidas.
Houve também o anúncio de editais para quatro obras de dragagens de manutenção nos rios Amazonas e Solimões. Em cinco anos, serão investidos R$ 500 milhões para garantir a navegabilidade e o escoamento de insumos.
(Com informações da Secom e da Casa Civil)
“A reunião é para que façam um diálogo a partir desse diagnóstico e possam pensar de forma conjunta um compartilhamento de responsabilidades, à medida que existem ações que vão além da responsabilidade do Governo Federal”, detalhou o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta. “A ideia é tratar esse tema não como um tema do governo, mas como um tema do Estado brasileiro, com participação de todos os chefes de poderes”, disse.
O estado de São Paulo registrou 2.191 focos de calor em 48 horas, que correspondem a cerca de 42% dos focos no estado em 2024. Ao todo, 46 municípios paulistas estão em alerta máximo para incêndios.
As condições climáticas também anteciparam em dois meses a temporada de incêndios no Pantanal. Segundo boletim semanal da sala de situação criada em junho para coordenar as ações federais de prevenção e combate aos incêndios, há 959 profissionais do governo federal em campo na região, apoiados por 18 aeronaves.