“É cada vez mais necessário dispormos de uma esquerda militante, organizada, formada ideologicamente, capaz de seguir agindo quando o vento não está a favor”, defende Valter Pomar

'Avante, ó esquerda festiva!', por Valter Pomar
Imagem da 46º Festa do Avante! na Quinta do Atalaia, em Portugal | Foto: Reprodução/Avante

Quem fizer uma busca nas redes supostamente sociais, já vai encontrar informações sobre a próxima edição da Festa do Avante, que será nos dias 5, 6 e 7 de setembro de 2025. Vide aqui: Festa do Avante! 2024 – 6, 7 e 8 de Setembro – Atalaia | Amora | Seixal (pcp.pt)

Avante é o nome do jornal do Partido Comunista Português (PCP). Sua primeira edição veio à luz em 15 de fevereiro de 1931. Depois da Revolução dos Cravos, exatamente no dia Primeiro de Maio de 1974, o Avante passou a circular legalmente. Hoje o jornal segue saindo impresso e, também, dispõe de uma página eletrônica, que pode ser acessada aqui: Avante! Já o PCP foi fundado em 1921.

A primeira edição da Festa do Avante aconteceu em 1976. Desde 1990, é realizado “na Quinta da Atalaia, na freguesia da Amora, no concelho do Seixal, num terreno junto à baía”, na margem sul do Rio Tejo. Terreno de propriedade do PCP, comprado depois que, em 1987, um governo de direita tentou impedir a realização da Festa, não cedendo o uso do terreno onde até então era realizada.

A Festa do Avante é importante no financiamento das atividades dos comunistas portugueses. O PCP também recebe recursos públicos, como os demais partidos, que entretanto não fazem festa. Aliás, no ambiente institucionalizado que tanto contribui para submeter os partidos de esquerda europeus ao famoso Estado burguês, já houve até quem quisesse impedir o PCP de autofinanciar-se através da venda das entradas da Festa e do que se vende nela.

Detalhe curioso: o PCP é um pequeno partido. Desde 1974 aconteceram 16 eleições legislativas. O melhor desempenho do Partido foi em 1979, quando alcançou 19% dos votos. Nas eleições de 2024, obteve apenas 3%. Mas se o Partido agora é pequeno, as Festas do Avante seguem sendo um acontecimento nacional, frequentado por mais de 100 mil pessoas, durante três dias (a primeira sexta, o primeiro sábado e o primeiro domingo de cada mês de setembro).

Reproduzo abaixo o que diz o site da Festa: “Os visitantes podem assistir a inúmeros concertos de música de vários géneros musicais (incluindo música clássica), em diversos palcos de diferentes dimensões, a atuações de grupos corais, de ranchos folclóricos, a animação de rua, a dança, a peças de teatro, a cinema. Realizam-se dezenas de debates políticos, exposições políticas e de artes plásticas, de ciência (incluindo experiências). Há gastronomia, artesanato e jogos tradicionais. Há a festa do livro e do disco. Há um espaço com um parque infantil com atividades e programação dedicada às crianças. A Festa inclui também um importante programa

desportivo com inúmeras modalidades. Um dos momentos altos é a realização do Comício”.

O Partido dos Trabalhadores participa da Festa há muito tempo, inclusive com uma barraca organizada (de forma igualmente militante) pelo Núcleo do PT de Lisboa, onde se vende uma “caipirinha revolucionária”. Aliás, nosso Partido dos Trabalhadores tem tudo para fazer algo similar: um grande festival político-cultural, que pode ter edições estaduais e depois uma grande edição nacional. Vale dizer que nosso aliado PCdoB está buscando fazer o mesmo e já está indo para a terceira edição do seu festival vermelho.

Importante dizer que a maior parte da Festa do Avante é auto-organizada. Ou seja, militantes dedicam seu tempo livre para organizar tudo, desde a segurança aos shows, passando pela fantástica culinária. Onde mais, ao pedir e pagar por uma sopa de pedra com vinho tinto, escutas um “aqui está o troco, camarada”?!

Um último comentário: ouvi de certo alguém um comentário depreciativo sobre a reduzida força eleitoral do PCP. De fato, como já disse, é assim mesmo. Mas eleição não é, nem pode virar tudo na nossa vida. Aliás, nos tempos em que vivemos, em que a extrema direita cresce eleitoralmente e onde a direita tradicional pisoteia a democracia e atropela a esquerda, mesmo quando esta esquerda ganha (como fez Macron, na França), é cada vez mais necessário – além de força eleitoral, que sempre é bom ter – dispormos de uma esquerda militante, organizada, formada ideologicamente, capaz de seguir agindo quando o vento não está a favor.

Isso o PCP tem e, ademais, sua Festa do Avante é uma demonstração de que disciplina, além de indispensável, pode rimar com alegria. Quem tem dúvida, vá lá e preste atenção no que acontece na Festa, quando começa a tocar uma música chamada Carvalhesa.

Valter Pomar é professor da Universidade Federal do ABC e diretor de cooperação internacional da Fundação Perseu Abramo

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