Companhia teve contas bloqueadas durante processo de suspensão do X e é a bola da vez na disputa do bilionário com a suprema corte brasileira

Com Musk no controle, Starlink é alerta à soberania nacional
crédito: Cleverson Oliveira / Mcom

Nesta terça-feira (10), será realizado, no Senado, um debate na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) sobre a suspensão da rede social X e o bloqueio de contas bancárias da empresa de satélites Starlink. A audiência está no bojo de uma discussão que começou com a interrupção dos serviços da plataforma por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes há duas semanas. 

No sábado (7), o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, apontou que o assunto não será analisado no plenário do STF, pois já foi formada maioria na Primeira Turma, referendando a decisão de Moraes, com os votos de Flávio Dino, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Luiz Fux. 

A derrubada da rede (que segue sendo chamada de Twitter) gerou bastante polêmica, sendo tema principal nos últimos dias de memes e postagens de reclamação de usuários em “abstinência”. Uma pesquisa da AtlasIntel apontou que as pessoas estão divididas com relação ao posicionamento contrário ou favorável à suspensão, mas que a maior parte (56%) acredita que a ordem de Moraes tem motivação política ao invés de técnica. 

Do ponto de vista técnico, com o imbróglio entre STF e a rede social de Elon Musk, a empresa Starlink acabou envolvida. Por fazer parte do conglomerado de atividades do bilionário, a rede de satélites fornecedora de serviços de internet teve as contas bancárias bloqueadas para que fosse garantido o pagamento de multas estipuladas ao X. A Starlink já recorreu duas vezes da decisão, mas não teve sucesso. 

O avanço da Starlink

Com o início das operações no Brasil em 2022, com autorização da Anatel sob o comando do governo de Jair Bolsonaro, a companhia recebeu a concessão para atuar até 2027 e é a principal provedora de internet em regiões remotas do país, em especial na Amazônia Legal, onde ela está presente em 90% dos municípios, de acordo com levantamento feito pela BBC News Brasil. 

Com Musk no controle, Starlink é alerta à soberania nacional
crédito: IBAMA

“Não tenho dúvidas de que a dependência do Brasil em relação à Starlink coloca nossa soberania nacional em risco”, afirma o pesquisador Ergon Culer. 

Com trabalhos em áreas relacionadas às políticas públicas, desinformação e tecnologias, ele destaca que “já utilizamos a infraestrutura da empresa, por exemplo, em pelotões de fronteira nas operações militares, o que expõe dados sensíveis a uma empresa que já demonstrou desrespeito às leis locais, como no caso da disputa com o STF”.   

Culer é representante da Sociedade Civil na Comissão da Agenda 2030 da ONU para São Paulo, além de integrar grupos de pesquisa na Universidade de São Paulo. Na opinião do especialista, a LGPD, que é a Lei Geral de Proteção de Dados, é uma barreira insuficiente, principalmente colocando em perspectiva a movimentação política de Musk.    

Sobre a atuação do bilionário, ele pondera que “é uma estratégia global mais ampla, na qual Elon Musk se posiciona internacionalmente como um intermediário da inserção das tecnologias nos países, um controlador do processo”.

“Há quem use o termo ‘colonialismo digital’ para explicar essa dinâmica entre big techs e países”, comenta o pesquisador. 

Satélites 

O crescimento da empresa no Brasil foi bastante acelerado. Em apenas um ano, a Starlink desbancou a concorrente Hughesnet e atualmente tem mais de 250 mil clientes no território nacional, incluindo as Forças Armadas, órgãos públicos e escolas rurais a partir de contratos com prefeituras e governos dos estados. 

Com Musk no controle, Starlink é alerta à soberania nacional
crédito: SpaceX

A rápida ultrapassagem da companhia perante as demais que prestam o mesmo serviço tem relação, principalmente, com a forma de atuação de seus satélites. São mais de seis mil espalhados em uma órbita terrestre considerada baixa, permitindo uma comunicação mais rápida e eficaz entre as antenas terrestres e a constelação de satélites da  subsidiária da companhia aeroespacial SpaceX, responsável pelos lançamentos. No Brasil, a Starlink tem 20 gateways (estruturas físicas) para transmitir essa conexão e a instalação por parte do usuário é considerada bastante simplificada e ágil.  

Para o pesquisador Ergon Culer, é uma tendência de mercado que no ambiente das big techs exista o monopólio, faz parte da dinâmica, porém é preciso prestar atenção nas consequências. “A falta de concorrência e a ausência de uma regulação firme cria um ambiente propício para que a Starlink expanda ainda mais sua atuação sem o controle adequado”, afirma Culer.