Cannes Lions, considerado o festival de criatividade mais importante do mundo, escolheu ‘A Grande Noite – Bossa Nova’ apresentado por Alaíde Costa como melhor peça publicitária de 2023

Fernanda Otero 

Foto:Divulgação/AlmapBBDO 
Legnda: Alaíde Costa, pioneira da Bossa Nova homenageada pela Johnnie Walker em campanha da AlmapBBDO (Foto: Divulgação/AlmapBBDO)
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Legnda: Alaíde Costa, pioneira da Bossa Nova homenageada pela Johnnie Walker em campanha da AlmapBBDO (Foto: Divulgação/AlmapBBDO) 

Como profetizaram os compositores Céu e Diogo Poças na canção”Turmalina Negra“, escrita para Alaíde Costa, a “pedra rara” no cenário da música popular brasileira deixou sua marca entre as maiores intérpretes do Brasil e assiste agora “o mundo transformar seu trabalho”. 

No ano passado a cantora participou de uma ação de marketing da empresa Diageo que promoveu o show ‘A Grande Noite – Bossa Nova‘, no Carnegie Hall, em Nova Iorque, para celebrar os 60 anos do concerto que revelou ao mundo o gênero brasileiro. 

A campanha recebeu, agora, o prêmio máximo da categoria Entertainment Lions for Music do Cannes Lions, festival internacional de publicidade e criatividade que ocorre em Cannes. O prêmio é conhecido como o “Oscar do setor publicitário”, que premia inovações criativas em diferentes áreas como publicidade, design, digital e entretenimento.

Antonio da Cunha Penna, premiado escritor e autor de livros além de compositor, cantor e historiador, é um grande fã de Alaíde e afirma que ela sempre foi injustiçada. Apaixonado pela cantora desde quando ela apareceu cantando Bossa Nova, Penna possui quase todos os seus LPs, alguns deles originais.

O historiador avalia que, embora Alaíde Costa fosse uma talentosa intérprete do gênero da Bossa Nova, ela não teve a mesma visibilidade que outros artistas brancos do movimento, que era dominado pela classe média alta brasileira e ela foi discriminada pelo seu ‘defeito de cor’. Alaíde Costa e Johnny Alf, ambos talentosos mas não tão celebrados, não foram incluídos na viagem para os Estados Unidos em 1962.

Apesar de seu grande talento, na opinião de Penna, pelo fato de Johnny Alf além de negro, ser obeso e homessexual, e Alaíde Costa ser uma mulher negra sem volúpia, eles enfrentavam discriminação, reafirmando as desigualdades presentes até mesmo em movimentos culturais inovadores como a Bossa Nova. 

Os dois também enfrentaram dificuldades adicionais devido às suas personalidades introvertidas. Alaíde era extremamente reservada e não se envolvia em eventos sociais, enquanto Johnny Alf, também discreto, se dedicava a tocar nas boates à noite sem muito envolvimento nas rodas de imprensa. 

No cenário da MPB, Alaíde talvez seja “a única cantora que nunca fez concessões”, ou seja, nunca gravou faixas para agradar ou fazer charme. Ao igualar o talento da cantora com Elis Regina, que nos primeiros dois discos, gravados aos 16 anos, Penna considera que Elis teve que se submeter às vontades das gravadoras e produtores, enquanto Alaíde, em contraste, manteve a integridade artística desde o início de sua carreira. 

Seu primeiro disco, ainda que mais próximo do samba-canção antes da ascensão da Bossa Nova, já mostrava qualidade superior aos primeiros trabalhos de Elis, que resultaram em álbuns dos quais ela não gostava e que evitava mencionar. Alaíde teve sua trajetória marcada pela coerência e ausência de concessões ao mercado.

Em 1972, foi convidada por Milton Nascimento para participar do disco Clube da Esquina, de Milton e Lô Borges, no qual ela canta com ele a música Me Deixa em Paz, de Monsueto Menezes e Airton Amorim. Esse trabalho a projetou novamente para uma posição de destaque. 

Muitas décadas mais tarde, em 2020, foi um outro homem negro que a trouxe de volta aos holofotes. “O Emicida, que é um rap famoso, muito bom, muito inteligente, muito sensível, descobriu, praticamente, a Alaíde para essa nova geração”, avalia Penna.

 “Com essa sacada do Emicida, ela sofreu uma exposição merecida” , comemora. O CD ‘O que meus calos dizem sobre mim’ lançado em 2022 foi produzido por Emicida e Marcus Preto e foi muito bem recebido pela crítica.

Fã e conhecedor dos trabalhos de Alaíde, Penna tem um trabalho preferido. “Eu me emociono sempre que ouço o disco ‘Coração’. É primoroso. Os arranjos são ótimos, foi um momento em que investiram um pouco nela e, quando a gravadora investia, havia uma estrutura com músicos e arranjadores. Esse é o disco dela que tem tudo”, recomenda.

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