Em depoimento à Polícia Federal para responder participação em conspiração golpista, Jair Bolsonaro (PL) e seus parceiros de farda optaram pelo silêncio

O silêncio dos inocentes?

Na última quinta-feira, 22, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) compareceu à sede da Polícia Federal para prestar esclarecimentos sobre seu envolvimento em suposta tentativa de golpe de Estado. As acusações vêm em decorrência dos atos de 8 de janeiro, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas por bolsonaristas que contestavam o resultado das eleições de 2022 e pediam um Golpe Militar. 

 Em vez da defesa, esperada de quem brada seus atributos de honestidade, honra e disciplina de (ex) militar, Bolsonaro optou pela covardia do silêncio diante dos investigadores que apuram uma suposta tentativa de golpe de Estado. Bolsonaro ficou menos de meia hora na sede da PF. Valdemar Costa Neto e Anderson torres não se calaram em seus depoimentos com investigadores, mas o conteúdo ainda não foi divulgado.

Em entrevista, o advogado Fabio Wajngarten disse que o ex-presidente “nunca foi simpático a qualquer tipo de movimento golpista”, mesmo diante das evidências apresentadas até aqui. Também ficaram em silêncio os generais Augusto Heleno, Mario Fernandes, Almir Garnier, Paulo Sérgio Nogueira, Braga Netto, Ronald Ferreira Junior. 

Nada solitário dentre os suspeitos de conspiração golpista, Jair Bolsonaro é investigado ao lado de aliados e ex-membros de seu governo, entre eles o ex-ministro e candidato a vice-presidente pelo PL nas eleições de 2022, Walter Souza Braga Netto, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, o ex-ministro de Segurança Institucional general Augusto Heleno, o ex-ministro substituto da Secretaria-Geral da Presidência Mário Fernandes, o oficial do Exército Ronald Ferreira de Araújo Junior e o ex-comandante da Marinha Almir Garnier, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e o ex-ministro da Justiça Anderson Torres.

Os depoimentos são componentes fundamentais da operação Tempus Veritatis, realizada pela Polícia Federal há quinze dias. Segundo as apurações, Bolsonaro e seus apoiadores teriam se articulado com o objetivo de promover um golpe de Estado e assegurar a permanência do presidente no cargo, evitando assim a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

 Recentemente, os advogados solicitaram duas vezes acesso aos documentos da investigação. O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu acesso aos mandados da operação. Posteriormente, os advogados do ex-presidente requisitaram acesso às mídias digitais, como telefones e computadores, assim como à delação do ex-assessor de Bolsonaro, Mauro Cid, mas Moraes negou a autorização. A defesa fez um novo pedido para acessar o conteúdo das mídias. A justificativa é a necessidade de “garantir a igualdade de condições no processo investigativo”.

 Ainda de acordo com informações da Polícia Federal, em retrospecto, foi encontrada na residência de Anderson Torres uma minuta de um decreto golpista que recomendava a prisão dos ministros do STF Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além de Rodrigo Pacheco, presidente do Congresso Nacional. O ex-presidente Bolsonaro também teria solicitado modificações no documento, optando por manter a prisão somente de Moraes e pedindo a convocação de novas eleições. Os eventos sob investigação podem resultar em acusações de organização criminosa, atentado violento ao Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado.

Confraria do Golpe

Uma parte significativa das averiguações está relacionada a uma reunião ministerial que ocorreu em 5 de julho de 2022. Durante o encontro, Bolsonaro orientou os ministros a não aguardarem o desfecho das eleições para tomarem medidas. Apesar disso, os advogados do presidente afirmam que o ex-presidente nunca considerou a possibilidade de um golpe.

 Uma das evidências utilizadas para fundamentar a investigação é a gravação de uma reunião ocorrida em julho de 2022, envolvendo Bolsonaro, ministros e militares, quando ele ocupava a presidência. Conforme apontado pela Polícia Federal, durante essa reunião, o então presidente teria exigido que seus ministros, indo contra o propósito legítimo de seus cargos, disseminassem e replicassem desinformações e notícias falsas sobre a integridade do sistema de votação em suas respectivas áreas, utilizando a estrutura do governo para propósitos ilegais e contrários ao interesse público.

 De com a documentação da Polícia Federal, na gravação da reunião, o então ministro-chefe do GSI, general Augusto Heleno, mencionou ter conversado com o diretor-adjunto da Abin sobre a infiltração de agentes nas campanhas eleitorais, mas alertou sobre o perigo de os agentes serem identificados. Nesse momento, Bolsonaro interrompeu o ministro, possivelmente reconhecendo o risco de expor as ações dos servidores da Abin, conforme indicado pela PF, ordenando que ele não continuasse a discussão e sugerindo abordar o assunto em particular mais tarde.

 O então ministro do GSI afirmou de forma incisiva que medidas deveriam ser tomadas contra certas instituições e indivíduos, e que uma mudança radical na situação deveria ocorrer antes das eleições. “Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições. Depois das eleições, será muito difícil que tenhamos alguma nova perspectiva”, disse Heleno.

 Em outro momento da reunião, Bolsonaro afirmou que “o plano B, tem que botar em prática agora”. “Só pra gente prestar atenção. […] A fotografia que pintar no dia 2 de outubro acabou, porra! Quer mais claro do que isso? Nós estamos fazendo a coisa certa, mas o plano B tem que botar em prática agora”, bravateou o ex-presidente Jair Bolsonaro na reunião.

 As declarações são parte de um vídeo contendo a totalidade da reunião ocorrida em julho de 2022, que serviu como base para a operação da Polícia Federal contra militares e ex-ministros de Bolsonaro suspeitos de envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado. As imagens foram encontradas no computador de Mauro Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e divulgadas nesta sexta-feira (9) pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Durante o encontro, o então presidente Bolsonaro e ministros discutiram “ações” anteriores às eleições daquele ano. Conforme a PF, o ex-presidente ordenou a disseminação de informações falsas com o objetivo de alterar o cenário na disputa eleitoral e evitar uma possível vitória do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

 Segundo a PF, os investigados se uniram para disseminar notícias falsas sobre o sistema eleitoral brasileiro, com objetivo de criar condições para uma intervenção militar que mantivesse Bolsonaro no poder. Vale lembrar que Bolsonaro foi declarado inelegível até 2030 pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que condenou o ex-presidente por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação ao questionar o sistema eleitoral. Bolsonaro também é alvo de outras investigações no STF.

Operação Tempus Veritatis

Em 8 de fevereiro, a Polícia Federal conduziu a Operação Tempus Veritatis, tendo como alvo vários militares e assessores associados a Bolsonaro. Durante a operação, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, foi detido por porte ilegal de arma e de pepita de ouro proveniente de garimpo ilegal.

A iniciativa da operação ocorreu após o tenente-coronel Mauro Cid, ex-auxiliar de Bolsonaro, firmar um acordo de delação premiada com os investigadores da PF. Esse acordo foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR) e já foi homologado pelo STF.

Bolsonaro foi alvo de mandados de busca e apreensão, teve seu passaporte confiscado para impedir sua saída do país durante a investigação. Além disso, a operação resultou na prisão de Filipe Martins, ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, do coronel Marcelo Câmara, da reserva do Exército, e do major Rafael Martins, em serviço ativo no Exército.

A investigação também indica que o general Walter Braga Netto, então candidato a vice-presidente na chapa derrotada em outubro de 2022, teria comandado uma campanha de difamação contra generais que não concordaram com o suposto plano de golpe de Estado.

Diversas autoridades também foram convocadas para prestar depoimento na operação: Marcelo Costa Câmara (coronel do Exército), Tércio Arnaud (ex-assessor de Bolsonaro), Cleverson Ney Magalhães (coronel do Exército), Bernardo Romão Correia Neto (coronel do Exército) e Bernardo Ferreira de Araújo Júnior. Além disso, foram agendados depoimentos em diferentes cidades do Brasil: Rio de Janeiro: Hélio Ferreira Lima, Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, Ailton Gonçalves Moraes de Barros e Rafael Martins Oliveira. São Paulo: Amauri Feres Saad e José Eduardo de Oliveira. Paraná: Filipe Garcia Martins. Minas Gerais: Éder Balbino. Mato Grosso do Sul: Laércio Virgílio. Espírito Santo: Ângelo Martins Denicoli e Ceará: Estevam Theophilo.