Outro objetivo é iniciar recomposição de quadros na máquina pública, desmontada nos últimos seis anos

Enem dos concursos quer democratizar acesso aos cargos públicos federais

Sob coordenação de Esther Dweck, ministra de Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, o governo Lula abriu oficialmente, na última semana, o Concurso Nacional Unificado (CNU), que vai oferecer 6.640 vagas em 21 órgãos públicos para candidatos a servidores federais. Batizado informalmente de Enem dos concursos, o formato inédito é inspirado no processo seletivo de alunos para o ensino público superior.

Os locais das provas serão descentralizados, com 220 cidades e mais de 77 mil salas preparadas para receber os candidatos. Além de minimizar as dificuldades de locomoção e os custos de viagem que marcavam os concursos anteriores, cujas provas eram aplicadas quase sempre apenas em Brasília, o Enem dos concursos vai permitir que as pessoas se candidatem a mais de um cargo com uma única inscrição.

A ministra não apenas admite que o novo formato de concurso foi inspirado no Enem, mas se diz contente com a designação popular. “A gente está muito feliz, a gente gosta muito desse nome ‘Enem dos concursos’, disse Esther, durante entrevista coletiva em 10 de janeiro, mesmo dia em que o edital do CNU foi divulgado oficialmente.

Somados à reserva de 30% das vagas para pessoas negras e 5% para pessoas com deficiência, a descentralização das provas e possibilidade de concorrer a mais de um cargo são elementos que, segundo a ministra, darão início à democratização do serviço público federal. “Este será um concurso com a cara do povo brasileiro”, afirmou.

As inscrições para disputar as 6.640 vagas acontecem de 19 de janeiro a 9 de fevereiro. As provas serão realizadas no dia 5 de maio. As taxas de inscrição são de R$ 60, para quem vai disputar cargos de nível médio (sem necessidade de diploma universitário), e de R$ 90 para cargos de nível superior. Os salários oferecidos vão de R$ 4.008 a R$ 22.921.

Um dos resultados já percebidos no novo formato foi a redução dos valores de inscrição. Para efeito de comparação, o concurso aberto recentemente pelo Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) tem taxa de R$ 180, válida para disputar apenas um dos cargos oferecidos.

Esther Dweck explica que a participação de 21 órgãos federais no Enem dos concursos se deu por adesão voluntária, sem imposição do governo. Todo o certame, desde a formatação das provas e das regras, até a organização dos locais e horários, foi produzido por um conjunto de órgãos do governo federal – além do Ministério da Gestão, o da Justiça, a Advocacia-Geral da União, o Tribunal de Contas da União, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) e o próprio Ipea, embora tenha decidido fazer concurso próprio. A segurança e lisura das provas serão garantidas em parceria com polícias estaduais, Polícia Federal e Abin (Agência Brasileira de Inteligência).

“Fiquem atentos”, recomendou a ministra, ao dizer que os candidatos devem guiar-se apenas pelo edital, e não seguir recomendações e instruções de cursos e consultorias privadas que não estejam de acordo com as normas do concurso. Segundo ela, os órgãos de segurança envolvidos estão monitorando as redes para coibir propagandas enganosas e intermediação de inscrições.

Outra forma de democratizar o acesso à disputa do concurso é a oferta de cartilhas e cursos gratuitos, preparados por órgãos federais. Um desses materiais, ofertado pela Enap (Escola Nacional de Administração Pública), pode ser acessado aqui. Lives e vídeos de orientação serão disponibilizados pelo governo nos próximos dias. O Ministério da Gestão, no entanto, não apresentou ressalvas aos candidatos que queiram fazer cursos privados de preparação.

A “múltipla escolha” de vagas pelas pessoas candidatas, outra ferramenta de democratização do concurso, se dará pela possibilidade de optar não por um cargo específico, e sim por um dos oito blocos temáticos, divididos em áreas de interesse e atuação. 

Cada bloco – Nível Intermediário; Gestão Governamental e Administração Pública; Setores Públicos e Regulação; Educação, Saúde, Desenvolvimento Social e Direitos Humanos; Trabalho e Saúde do Servidor; Ambiental, Agrário e Biológicas; Tecnologia, Dados e Informação; Infraestrutura, Exatas e Engenharia – oferece cargos em mais de um órgão e que podem ser ocupados por mais de um tipo de formação acadêmica e experiência profissional.

Segundo a ministra, este será o primeiro dos concursos que o atual governo pretende organizar. “A gente não vai ficar só neste. Talvez bianualmente, se não anualmente, façamos outros concursos unificados”, sinalizou, sem, no entanto, apresentar números precisos de vagas.

A necessidade de novos servidores concursados é bem maior do que os 6.640 que serão escolhidos a partir das provas de maio, o que a própria ministra reconhece. Estimativas da Condsef-CUT (Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal) apontam que apenas nos seis anos após o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, aproximadamente 150 mil vagas foram extintas na máquina federal.

O próprio presidente Lula destacou essa demanda reprimida durante o discurso que fez na Conferência Eleitoral do PT, realizada em dezembro. “Quero agradecer as pessoas que estão se dedicando ao trabalho no governo. Sabemos que em alguns ministérios há metade do efetivo que nós deixamos em 2014”, disse.

Além de tentar suprir essa necessidade  com a realização de mais de um concurso nacional unificado, o governo tem procurado também racionalizar e compartilhar certas carreiras de Estado entre os ministérios, como explica a ministra. Sua gestão criou a Secretaria Nacional de Serviços Compartilhados, cuja principal missão é nacionalizar as estruturas já existentes em áreas como compras, tecnologia da informação e transportes, colocando-as a serviço de 13 ministérios, com previsão de chegar a 20 até o final de 2024.

Na mesma lógica de racionalização de custos e aumento de eficácia, a estrutura logística das provas do próximo dia 5 de maio vai permitir que 95% dos candidatos estejam a, no máximo, 100 km de distância de um dos 5.141 locais de aplicação do concurso, distribuídos em 220 cidades. Cerca de 350 mil pessoas vão trabalhar nos serviços de suporte no dia de aplicação das provas.

Por todas essas características, a previsão é de que o Concurso Nacional Unificado receba um grande número de inscrições e seja um dos mais disputados da história do Brasil. Somente durante a coletiva de imprensa concedida por Esther Dweck, mais de 23 mil pessoas acompanharam simultaneamente a transmissão pelo canal do ministério no Youtube. Ao todo, foram 144 mil visualizações ao longo dos dois dias seguintes. Algo como 21,5 pessoas por vaga. E contando.