Depois de décadas em discussão no parlamento, o governo Lula consegue ver aprovada proposta que altera o regime de impostos no Brasil. “Parecia impossível. Valeu a pena lutar”, comemora o ministro da Fazenda, Fernando Haddad

Brasília – 28/06/2023 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante anuúncio do Plano Safra da Agricultura Familiar 2023/2024 Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Em mais um movimento político importante para a retomada do desenvolvimento econômico brasileiro e a redução das desigualdades sociais no Brasil, o país obteve uma vitória importante na noite de quinta-feira, 6. Por 382 votos contra 118, no primeiro turno, e 375 a 113, no segundo, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto. Até a oposição deu votos à proposta que tramitava há décadas no parlamento. A mídia corporativa brasileira classificou a votação como histórica.

Um dos principais articuladores do projeto na Câmara, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comemorou o resultado e agradeceu o empenho do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). “Depois de décadas, aprovamos uma reforma tributária. Parecia impossível. Valeu a pena lutar”, disse.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez questão de parabenizar Haddad e a Câmara dos Deputados pela votação histórica. “O Brasil terá sua primeira reforma tributária do período democrático. Um momento histórico e uma grande vitória para o país. Parabéns para a Câmara dos Deputados pela significativa aprovação ontem e ao ministro Fernando Haddad pelo empenho no diálogo e no avanço da reforma. Estamos trabalhando para um futuro melhor para todos”, disse.

O projeto de emenda constitucional, que ainda precisa ser apreciado em dois turnos pelo Senado Federal, cria pela primeira vez o imposto sobre valor agregado (IVA), um modelo discutido desde a Assembleia Constituinte, que resultou na Carta de 1988, mas nunca alcançado, em razão de disputas entre os entes federativos e receios de perda de arrecadação.

A revisão fiscal marca uma importante vitória política para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desde que assumiu o cargo em janeiro teve que lidar com um parlamento dominada pela oposição. De acordo com o jornal britânico Financial Times, a reforma pode impulsionar o crescimento econômico do Brasil, adicionando até 2,39% ao Produto Interno Bruto nos próximos oito anos, de acordo com estimativas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Durante os últimos 34 anos, uma média de 37 regras fiscais foram alteradas todos os dias, de acordo com o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação. A proposta aprovada unifica ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI em três impostos: uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de gestão federal; o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), gerido por um Conselho Federativo, composto por representantes dos Estados e municípios; e um Imposto Seletivo, federal, que incidirá sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

O jornal financeiro inglês, um dos mais influentes do planeta, lembra que a maior economia da América Latina tem sido prejudicada há décadas pela complexidade e opacidade de seu regime tributário.

Uma empresa de médio porte no Brasil leva cerca de 1.500 horas para preparar e pagar impostos, de longe a maior do mundo, de acordo com o Banco Mundial. Em contraste, uma empresa dos EUA leva 175 horas e uma companhia do Reino Unido leva 114 horas.

O projeto de lei perante o Congresso substituiria uma série de taxas diferentes por apenas dois impostos sobre valor agregado, um federal e outro local. Os contribuintes mudariam para as novas taxas entre 2026 e 2032. Espera-se que a taxa padrão de IVA seja de cerca de 25%.

A reforma também propõe acabar com o sistema de tributação de bens onde eles são produzidos e mudar para um modelo em que os direitos são impostos no ponto de consumo durante um período de transição de 50 anos. A transição federativa só acabará em 2078 e, para suavizar os efeitos do fim da guerra fiscal, a União repassará R$ 40 bilhões por ano, a partir de 2032, para os Estados investirem ou subsidiarem a atração de empresas.

Com décadas de atraso, a aprovação da reforma tributária pelo Senado pode colocar o Brasil no mapa dos 174 países que já cobram um IVA, reduzindo a burocracia para as empresas e abrindo portas para o ingresso de maiores investimentos internacionais. Autor da PEC 45, base do texto votado, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), presidente da sigla, destacou que esta pode ser a “primeira reforma tributária da era democrática”.

O atual desenho em vigor começou a ser estruturado em 1965, sob a ditadura militar instituída no ano anterior, quando uma emenda constitucional criou o sistema tributário nacional e instituiu a base de alguns dos tributos em vigência até hoje.

Ainda na sexta-feira, a Câmara dos Deputados concluiu a votação da reforma com a rejeição de três destaques do PL — o partido de Jair Bolsonaro — que visavam desfigurar o texto. Com o voto favorável da bancada do PT, o plenário da Câmara garantiu na reforma a aplicação do imposto seletivo sobre produtos que prejudicam a saúde e o meio ambiente, alíquotas menores para planos de saúde visando a proteção dos consumidores e ainda a garantia de atualização da base de cálculo do IPTU, de acordo com a valorização do imóvel.

Um dos destaques do PL, cuja maioria votou contra o texto da reforma tributária, buscava alterar o texto-base da proposta impedindo a criação do imposto seletivo sobre produtos que prejudicam a saúde e o meio ambiente.

Segundo o relator da reforma, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), o imposto é uma regra adotada pelo conjunto dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne as economias mais desenvolvidas do mundo, dentro do sistema do IVA, que será também adotado no Brasil. •

`