Repasse de parte da receita do Sesc e Senac à Embratur é amparo mútuo e não deve nos transformar em inimigos

Eu tenho profundo respeito pelo trabalho do Sesc e Senac. Por isso, jamais apoiaria qualquer proposta que afetasse as ações das entidades. O debate em torno da proposta de destinar 5% da arrecadação das instituições à Embratur, que será votada pelo Senado, não é sobre a relevância dos serviços prestados. É sobre orçamento, transparência e utilização de recursos públicos.

Em 2019, o governo Jair Bolsonaro (PL) modificou o status jurídico da Embratur, que deixou de ser autarquia federal e passou a ser uma empresa de serviço social autônomo. Com a iniciativa, a Embratur foi retirada do Orçamento da União e ficou sem uma fonte permanente de financiamento. Isso significa que, a partir do ano que vem, o Brasil não terá dinheiro para investir na atração de turistas estrangeiros. A Embratur vai ter que parar.

Para resolver o problema, solicitamos à Fundação Getulio Vargas (FGV) estudo de possíveis fontes de financiamento para a agência sobreviver. O resultado foi a sugestão de destinar 5% do que arrecadam Sesc e Senac para financiar ações de promoção do turismo internacional.

Segundo o portal da transparência do Sesc e Senac, as entidades arrecadam juntas R$ 9 bilhões ao ano. Em média, todos os anos sobram do orçamento R$ 2 bilhões. Os superávits acumulados fizeram com que as duas instituições tenham na conta R$ 15 bilhões. Sabe quanto será destinada ao turismo, de acordo com a proposta? R$ 447 milhões. É menos de 3% das sobras acumuladas no orçamento. Além disso, as entidades embolsam através de rendimentos com aluguel de imóveis e aplicações no mercado financeiro R$ 2 bilhões ao ano.

O que será destinado ao turismo é muito menor do que sobra todos os anos do orçamento. Não é verdade que unidades serão fechadas e ações do Sesc e Senac serão paralisadas. Esse debate precisa ser feito com a verdade, baseado nos números. Afinal, estamos tratando de dinheiro público, fruto de imposto compulsório recolhido pela Receita Federal.

A escolha das entidades para contribuir se deve ao fato de o setor de comércio e serviços ser o mais beneficiado pela vinda de visitantes estrangeiros. No primeiro trimestre deste ano, recebemos 2,3 milhões de visitantes de outros países. Eles gastaram em nosso país R$ 8,6 bilhões, gerando emprego e renda.

A promoção internacional do turismo é estratégica para o Brasil. Segundo a FGV, a cada R$ 1 investido em promoção, R$ 20 entram na economia do país. É dinheiro que favorece o comércio com o crescimento do consumo, a cultura com o aumento do público e o Sesc e o Senac, que vão arrecadar mais com a movimentação econômica.

O debate não é sobre o dinheiro que está chegando na cultura. É sobre o que não chega porque está aplicado no mercado imobiliário e financeiro. Não sou o primeiro a questionar o uso desses recursos. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fez o mesmo na criação da ApexBrasil, e o ministro Fernando Haddad (Fazenda), quando à frente da pasta da Educação, também, ao destinar parte do dinheiro para o ensino profissionalizante gratuito. Divergências não devem nos transformar em inimigos. •

* Presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur)

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