Ex-ministra das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos no governo Dilma, a pedagoga denuncia que os retrocessos ocorridos na educação brasileira são resultado direto da política de destruição do Estado implementada por Bolsonaro. Ela avalia que as políticas afirmativas implantadas pelo governo do PT sofreram danos depois do Golpe de 2016, mas a esperança agora é de reconstrução em um novo governo Lula

 

 

Ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Nilma Lino Gomes foi a primeira negra a assumir a reitoria de uma universidade federal no Brasil. Pesquisadora acadêmica e coordenadora do Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas de Igualdade Racial, vinculado à Fundação Perseu Abramo (FPA), Nilma apresenta uma leitura sobre a situação da Lei de Cotas depois de 10 anos em vigor.

O texto prevê uma avaliação depois desse período, mas parlamentares de direita vêm criando um clima para a possibilidade de acabar com as cotas raciais. “Isso seria um erro muito grave”, diz Nilma. Ela pondera que o país necessita de incremento das políticas afirmativas e, se a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva se concretizar, será necessário reestruturar os mecanismos de acompanhamento e avaliação dessas políticas, que foram esvaziadas pelo governo Bolsonaro. A seguir, leia os principais trechos da entrevista:

 

Focus Brasil — A Lei de Cotas completou 10 anos e, conforme previsto, precisa passar por uma reavaliação. Ainda há uma campanha contra a Lei de Cotas para revogá-la. A senhora acredita em algum risco de retrocesso?

Entrevista | Nilma Lino Gomes - “É preciso avançar mais nas políticas afirmativas”

— Temos dois projetos interessantes na Câmara. O PL 5384/2020, da deputada Maria do Rosário (PT-RS) torna permanente a reserva de vagas nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio. E temos também o PL 3.422/2021, da Benedita da Silva (PT-RJ) juntamente com o Carlos Zarattini (PT-SP) e Valmir Assunção (PT-BA), que em caráter de urgência na Câmara dos Deputados desde o fim de 2021. São os dois projetos mais avançados e que estão sob a coordenação do campo da esquerda. O 3.422/2021 tem o Bira do Pindaré (PSB-MA) como relator foi o que mais discutimos. Quase chegou a entrar em votação com uma alteração feita pelo relator, mas chegamos a uma conclusão, tanto o relator quanto os outros deputados e o movimento negro, que não era o melhor momento de colocarmos nada em votação em relação à Lei de Cotas, em função da própria situação política que vivemos no Brasil com um Congresso extremamente conservador e em função do processo eleitoral.

Do ponto de vista do andamento da discussão da Lei de Cotas, esses dois projetos colocam o campo da esquerda na liderança da condução do debate na Câmara dos Deputados… É importante citar que, também no Senado Federal, a liderança política da revisão da lei em curso está também com o campo da esquerda e, em especial, com o PT. Há o PL 4656/2020, de autoria do Paulo Paim (PT-RS), que altera a Lei 12.711/2012 e assegura a continuidade das cotas e sua aplicação às instituições particulares de ensino.

 

— Mas ainda há projetos que são um retrocesso.

— Sim. Alguns projetos querem retirar, principalmente, o critério racial da Lei de Cotas. Vários setores da direita querem transformar a lei que atenda só ao critério socioeconômico, com ênfase na escola pública e/ou renda. O maior empenho da direita vai no sentido de uma descaracterização da Lei de Cotas, porque ela sabe que o critério racial foi o que trouxe o sentido mais emancipatório para essa legislação. Há uma disputa na sociedade que mostra uma das facetas do racismo estrutural e como ele tem impedido o direito principalmente da população negra, jovem, a continuar seus estudos, entrar no ensino superior e ter a possibilidade de se formar e atuar nos mais variados setores do mercado de trabalho.

Isso altera totalmente o perfil da sociedade porque nós sabemos que a universidade é o espaço de formação de quadros: intelectuais, políticos, quadros profissionais das mais diversas áreas e do campo da pesquisa. A graduação é só uma porta de entrada do acesso a uma maior democratização, mas se tivermos o acesso com uma permanência digna e bem-sucedida, possibilitaremos a formação pessoas negras que atuarão no mercado de trabalho, e mais, possibilitaremos a essas pessoas a continuidade dos estudos em nível de pós-graduação. Já temos uma portaria, número 13/2016, que é nossa, do PT, do MEC, que trata das cotas raciais na pós-graduação e que já está sendo implementada por uma série de universidades públicas, bem como resoluções internas de universidades que também instituem cotas raciais na pós-graduação.

Dentro da autonomia universitária e de acordo com as condições internas e as discussões políticas, as universidades podem ampliar o público das cotas na pós. E aí as universidades ampliam: cotas raciais, LGBTQIA+, pessoas com deficiência etc. Estamos em um momento de disputa ainda.

 

— A cota no serviço público tem sido colocada por vários intelectuais e ativistas antirracistas, como o Silvio Almeida, você, Benedita da Silva… Temos uma deficiência muito grande em relação a presença de negros e negras na cúpula do setor público, no alto comando das Forças Armadas, no Judiciário, no Ministério Público, no Itamaraty. O governo Bolsonaro não estimula. E agora existe essa pressão por parte dos chamados meritocratas de terminar com a cota no serviço público. Com Lula sendo eleito, não se pode ampliar a cota nos serviços públicos?

— Sim, acho que sim. Tem uma diferença que acho ainda mais impactante. O texto da Lei 12.711/2012 não prevê, de forma alguma, o seu término. Tanto é que houve e ainda há uma confusão na sociedade quando se fala em revisão. Setores do parlamento criaram o discurso de que a revisão significava a lei deixaria de valer depois de completados os 10 anos. E não é isso. O texto da lei não fala em término, mas em revisão – ele diz que a legislação precisa passar por um monitoramento que deveria ser feito pelo Ministério da Educação, pela SEPPIR [Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial] e pela Funai [Fundação Nacional do Índio], porque as cotas são para indígenas, negros, escola pública, baixa renda. O critério racial não é o único, pelo contrário. Tem que se entender a revisão da Lei de Cotas nessa perspectiva. A revisão significa uma avaliação para aprimorar a legislação e, não, uma avaliação para decidir se ela continua ou não.

No caso da Lei 12.990, de 2014, que trata das cotas nos concursos públicos nas instituições federais, é diferente porque o seu próprio texto diz que ela durará dez anos. Significa que o próximo governo terá que fazer não somente uma discussão em relação à porcentagem dessa legislação e sobre continuidade das cotas nos concursos públicos federais, uma vez que a Lei 12.990 tem previsão de término no ano de 2024. Precisaremos ter uma boa política de avaliação da implementação dessa legislação em nível nacional, nos mais diversos setores, de um debate forte e de uma boa discussão e articulação política no Congresso. E, por isso, a urgência e a necessidade dos deputados, deputadas, senadores e senadoras do PT e de outros partidos do campo da esquerda se unificarem e se organizarem em torno da discussão da continuidade da Lei 12.990 ou da proposição de outra legislação no mesmo sentido.

Não temos o mapeamento da realidade porque todas as políticas de igualdade racial foram totalmente deixadas de lado no governo Bolsonaro e, algumas, inclusive, foram destruídas. Precisamos de uma avaliação emergencial para ver a situação em que estamos para viabilizar a reconstrução das políticas de ações afirmativas e, em especial, a continuidade da modalidade cotas, partindo das situações mais urgentes para aquelas que podem ser reorganizadas mais a médio prazo.

Acho que é isso que teremos como tarefa nesse campo da igualdade racial, com, um diálogo muito amplo com o movimento negro, intelectuais e a comunidade negra organizada para ouvi-los e aprender, tomando decisões conjuntas. Nesse período de desgoverno Bolsonaro, quem acompanhou de alguma forma o andamento das políticas de igualdade racial, ou o não andamento delas, foram as comunidades negras organizadas, grupos de pesquisa dentro das universidades, ONGs, Núcleos de Estudos Afro-brasileiros, a Associação Brasileira de Pesquisadores Negras e Negros e tudo com muito limites, pois o governo federal não fez a sua parte. Inclusive, não há orçamento para essas políticas.

A Lei 12.990 impactou muitas legislações estaduais e municipais no que diz respeito aos concursos públicos. Hoje, também não temos um mapeamento nacional de quem já implementou, qual é a variação das porcentagens. Temos ainda um outro desafio. Estou falando sobre como a Lei 12.990 tem sido implementada (ou não) nos concursos públicos para docentes e técnicos das universidades públicas e institutos federais, por exemplo. É importante saber como as vagas têm sido distribuídas para que possa ser cumprido o que a legislação determina. Temos que articular conjuntamente a Lei de Cotas com a Lei 12.990.

 

— Quais são os resultados da Lei de Cotas no Brasil?

— Há uma pesquisa recente, que se chama “Avaliação das políticas de ação afirmativa no ensino superior no Brasil, resultados e desafios futuros”, realizada pela Ação Educativa/SP, pelo Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação Superior (LEPES), da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Os resultados mostram que a inclusão do critério racial na Lei de Cotas tem sido decisiva para o acesso de estudantes negros e indígenas mais pobres no ensino superior público federal. Além disso, o perfil das universidades e institutos federais de ensino superior, após a implementação da lei, é muito mais diverso do ponto de vista socioeconômico, étnico, racial e cultural.

De um modo geral, as pesquisas mostram que o desempenho dos estudantes cotistas — um tema que é sempre considerado uma grande preocupação — tem sido igual ou melhor em determinadas áreas e cursos do que o dos estudantes não-cotistas. Ou quando existe diferença, essa é mínima. A Lei de Cotas tem transformado o campus universitário em um espaço mais diversos do que ele era, por exemplo, na década de 1990. Isso tem impactado o ensino superior e também tem impactado a assistência estudantil.

Também temos tido impactos do ponto de vista da pesquisa: as temáticas das discussões raciais, quilombolas, indígenas, de pessoas com deficiência começam a ter um outro lugar de interesse acadêmico, porque os sujeitos as que pesquisam são também aqueles que vivenciam a questão racial, indígena, quilombola, da deficiência, no seu cotidiano. Ou seja, são questões sociais, culturais e políticas e não são simplesmente temas de pesquisas. Isso tem trazido, também, tensionamentos. Muitas vezes são os estudantes negros e negras que indagam os professores e as professoras em relação aos seus currículos dos cursos de graduação, nos quais muitas bibliografias, ainda hoje, sequer contemplam autores e autoras negras nas mais diversas áreas, principalmente, nas humanidades, nas sociais. Isso leva os cursos de graduação e pós-graduação a realizarem uma revisão curricular mais emancipatória e atualizada.

Outra dimensão que é muito importante é a convivência com a diversidade dentro do espaço acadêmico. Uma coisa é passar por uma universidade e pelos institutos federais, na sua formação ou mesmo no ensino médio técnico e federal, e conviver com pessoas negras sempre trabalhando na portaria, na faxina, terceirizadas. Não ter um professor negro, uma professora negra, não ter sequer estudantes negros, principalmente se nós estamos falando de cursos que são os chamados mais elitizados, as chamadas áreas tradicionais. Outra coisa é você entrar numa universidade que é pública e ter na sua sala de aula estudantes que são negros e negras, que vêm das periferias, das vilas e favelas, que estão ali por direito, estudando com você naquela sala de aula, e ter professores e professoras negras. Ampliando o público das cotas, você também encontra indígenas, pessoas com deficiência. Ou seja, você tem a diversidade que existe no Brasil, de alguma forma, representada em instituições públicas de formação de novos quadros.

A convivência com o diverso, no mesmo patamar de horizontalidade, é algo que as cotas trazem e provoca um impacto muito profundo nas relações de poder da nossa sociedade. E mais, as cotas também desvelaram com muito mais força a existência do racismo nas instituições onde são aplicadas, a existência do capacitismo, dos preconceitos das mais diversas ordens, inclusive socioeconômicos, linguísticos, de diversidade sexual e possibilitaram que essas instituições fossem cobradas a inserir na sua dimensão pública o combate a todos esses fenômenos perversos coisa que, do ponto de vista institucional, a gente não tinha antes.

As universidades, os institutos que implementam as cotas – estamos falando das federais, mas também das estaduais que implementam cotas como modalidade de ação afirmativa- passaram a ter que responder institucionalmente quando esses fenômenos acontecem no seu interior e são visibilizados, denunciados. Eles já aconteciam antes, mas você não tinha a denúncia formalizada. Quando essa denúncia acontecia, no máximo ela chegava talvez a uma ouvidoria e não sei se o processo era levado até o final da forma como hoje ocorre.

As cotas também têm possibilitado para todas as pessoas perceberem as formas como o racismo se expressa, inclusive nas fraudes que é o que acontece quando as pessoas burlam aquilo que é uma luta, histórica do movimento negro por direitos usando de uma forma totalmente desonesta para ocupar uma vaga que não lhe é devida. Inicialmente as universidades não queriam ter que lidar com a questão das fraudes, elas se acomodavam dizendo que a autoidentificação racial já era suficiente. Universidades e institutos tiveram que mudar de posição, tiveram que entender que essa não era uma posição ideológica, mas uma decisão institucional e política. E, por isso, as comissões de verificação tiveram que ser instituídas para que a gente possa demonstrar para a sociedade a seriedade do processo de implementação das cotas. Há muitas indagações em relação às comissões de heteroidentificação, mas eu sempre chamo a atenção para uma coisa: o problema é a comissão ou é o racismo e a burla racista? A questão não está na comissão de heteroidentificação em si. A existência da comissão é que explicita o racismo e a forma como ele opera por meio de pessoas estão fraudando a política de cotas. Um exemplo:  pessoas brancas lançam mão de fraudes para ocupar vagas destinadas às cotas raciais. E nós sabemos, a quem elas são destinadas, por lei. Por isso tem que ter comissão de heteroidentificação e punição aos fraudulentos.

 

— Lula vem falando muito que essa é a eleição em que, possivelmente, será eleito o maior número de deputados e senadores negros e indígenas. Qual é a sua perspectiva?

— Espero que tenhamos mesmo uma modificação nesse perfil étnico-racial e de gênero. Hoje temos uma discussão muito mais forte, muito mais pujante, com relação à representatividade de mulheres, a representatividade negra no Congresso, nos espaços de decisão da sociedade brasileira, muito mais forte do que já foi em outras eleições. Do ponto de vista da questão racial, a gente tem hoje, pelo próprio TSE, a legislação sobre os recursos do fundo de financiamento eleitoral, o que possibilita, dentro dos partidos, uma redistribuição um pouco mais justa desses recursos, pensando nas candidaturas negras. Agora, eu acho que vai depender muito da adoção de uma forma justa de implementação dos recursos do fundo. Vai depender também dos partidos serem ciosos e sérios em relação às candidaturas negras, por exemplo, porque já temos visto na imprensa uma série de notícias de fraudes na identificação racial de candidatos e candidatas – de direita e de esquerda — que se passam por pardos.

Tem outro detalhe também. Eu espero que esse perfil mais diverso no Congresso traga uma diversidade acompanhada de uma postura progressista, porque não basta apenas ter mais negros, mais mulheres e mais indígenas. Nós precisamos de mais negros, mais mulheres e mais indígenas com uma postura democrática, progressista de Estado e de sociedade e das próprias questões que representam. Veremos como vai se configurar após as eleições.

 

— Completaram-se seis anos do golpe contra Dilma. De lá para cá vivemos muitos retrocessos, como resultado do golpe. O quanto os retrocessos na à educação e na ciência prejudicaram o país?

— Vamos começar pelo golpe. Eu me lembro de que quando aconteceu aquela situação, falei para a presidenta Dilma que o golpe, para mim, não era só parlamentar. O golpe tem algumas características que eu já falei e repito: ele foi um golpe parlamentar, sim, mas também foi um golpe midiático, de raça, de classe, de gênero, heteronormativamente orientado, jurídico e fundamentalista religioso. Você pode fazer uma leitura de tudo que aconteceu depois desse golpe e vai encontrar essas características lá, de grupos que se articularam para promover o golpe. Aconteceu tudo o que a presidenta Dilma disse no seu último discurso: a sociedade brasileira seria afetada nas mais diversas áreas. Não era só tirar o PT, tirar Dilma… Era um projeto de uma destruição profunda do Estado Democrático de Direito e é isso que nós estamos vendo.

As universidades, nesse contexto, o campo da ciência, têm sido atacadas, desde o início desse golpe que pavimentou o caminho para extrema direita ascender ao poder naquilo que mais garante a sua sobrevivência: o orçamento. Estamos assistindo, até hoje, um ataque orçamentário para retirar as condições estruturais de funcionamento das universidades. Isso significa comprometer a produção científica nas mais diversas áreas, a permanência dos sujeitos que entraram para as universidades, para os institutos federais por meio das políticas de ações afirmativas. Então, é um ataque que vai pelos flancos, parece que não é ataque direto, mas é. Tivemos ataques que ferem, por exemplo, a autonomia da universidade de decidir seus destinos e de decidir, inclusive, os seus dirigentes e as suas dirigentes por meio da consulta pública.

Assistimos o desrespeito aos ganhadores e ganhadoras desses pleitos e que ficaram no primeiro lugar das listas tríplices. Temos ainda um projeto de intervenção política dentro de várias universidades, desrespeitando o processo de consulta pública e o governo colocando nas reitorias pessoas alinhadas ideologicamente aos seus valores conservadores e reacionários. Estamos vivendo várias tentativas oficiais de inculcar na sociedade um clima de descrença na ciência, de negacionismo, e isso ficou muito forte durante o período da pandemia com toda a discussão sobre as vacinas, com toda a corrupção que a CPI da Covid mostrou por trás da questão das vacinas.

Tudo isso, de alguma forma, contaminou uma grande parte da sociedade brasileira no período mais forte da pandemia. O resultado é a essa descrença, o medo das pessoas de, por exemplo, completar o seu ciclo vacinal. A negação não é apenas devida aos efeitos colaterais que várias pessoas sentiram em relação à aplicação da vacina. Existe um discurso ideológico negacionista, reiteradamente repetido na sociedade e por setores da mídia, reforçado por meio das fake news associadas ao fundamentalismo religioso. O ataque afeta o campo da ciência e, com certeza, afeta a universidade como lugar de produção do conhecimento e saber científico.

E temos retrocessos no Ministério da Educação, no Ministério da Ciência e Tecnologia, que vão além do corte do orçamento para pesquisa. Há a corrupção no MEC, a ausência de uma política nacional de educação desde a educação básica até o ensino superior. Qual foi a política educacional implementada, no Brasil, ao longo desses seis anos?

Na educação básica, você pode falar: “ah, a Base Nacional Comum Curricular”. Mas de que forma essa base está sendo instituída? A reforma do ensino médio, com tantos contratempos e com tantas indagações e discordâncias, e nada sendo discutido, por exemplo, com a categoria dos educadores e educadoras. O Plano Nacional de Educação e o não cumprimento de suas metas. É um projeto de destruição.

 

— Como foi o encontro com Francia Márquez. Qual é a importância de ter uma mulher preta na vice-presidência da Colômbia?

— Foi um encontro muito impactante. Tivemos um encontro de discussão política e institucional, com a presença de outras ex-ministras: Tereza Campello, Eleonora Menicucci, que eram de Desenvolvimento Social e Políticas para as Mulheres, respectivamente, e, no meu caso, Igualdade Racial. Ela queria muito ouvir a nossa experiência para pensar também como poderia ser a organização na Colômbia. Depois, houve outro econtro que foi bastante emocionante, com o movimento negro e seus representantes, coordenado pela Secretaria Nacional de Combate ao Racismo do PT. Pessoas de diferentes lugares do Brasil vieram para encontrar com a Francia Márquez.

Tem uma questão forte quando você se encontra com os seus iguais. É um outro lugar de representatividade e de acolhida. Ela se emocionou, as pessoas se emocionaram e puderam falar disso que você me pergunta: que importância tem essa mulher negra? Tem muita importância porque isso significa que nós estamos dando passos, mesmo que lentos, na luta antirracista. Significa que estamos rompendo com os bloqueios raciais que as relações de poder colocam para as questões de gênero e raça, mesmo nos governos progressistas. Eu acho que existiu, ali, uma simbologia do lugar de quem é a Francia, com a toda trajetória que ela vem, de ativismo político, que associa a luta contra a desigualdade de gênero, racial, a luta ambiental, os direitos humanos. Ela reúne todas essas dimensões que são muito caras para quem luta por democracia e fala insistentemente que a economia não se define por si só, mas que para a gente fazer um desenvolvimento econômico, de fato, inclusivo, você precisa considerar todas essas dimensões da diversidade também. •