Um novo jogo de cena
Planalto faz nova troca na Petrobrás, mas mantém política de preços dolarizados para combustíveis. Senadores do PT criticam o governo e, agora, a FUP diz que país corre risco de faltar diesel
A troca no comando da maior empresa estatal do Brasil é jogo de cena do presidente da República, Jair Bolsonaro, que joga para a plateia e tenta se reeleger sem mexer na política de preços da Petrobras. A mudança foi anunciada na noite de terça-feira, 24, 40 dias após a última mudança promovida pelo Palácio do Planalto. Senadores do PT criticaram duramente a manobra do governo, apontando que Bolsonaro evita promover a mudança que impediria o aumento contínuo do preço dos combustíveis.
O novo presidente da Petrobras é um nome do terceiro escalão da equipe de Paulo Guedes — Caio Mário Paes de Andrade — e já leva bordoada dos sócios minoritários, que o acusam de não ter a qualificação exigida para o cargo. O presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Petrobras, senador Jean Paul Prates (PT-RN), alertou para a farsa na estratégia do Planalto.
“Bolsonaro mascara a questão dos combustíveis para fazer de conta aos eleitores que está trabalhando para baixar os preços”, acusa. “Não está, e nem quer fazer nada. A equipe econômica não quer usar as receitas extraordinárias com o petróleo alto para mitigar os preços internos”. Jean Paul acusou Bolsonaro de se esconder do dever de mudar a política de Preço de Paridade de Importação (PPI), criada pelo governo Temer.
“Não adianta trocar o presidente da Petrobras ou criar atrito com os governadores quando o problema está na mão do presidente da República”, diz o senador potiguar. “É um absurdo um país autossuficiente abrir mão desta vantagem estratégica em relação ao mercado global. Bolsonaro se exime de suas responsabilidades, simula ataques à Petrobrás, diminui e desmoraliza a empresa”.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) também engrossou as críticas. “Após 40 dias da última mudança, Bolsonaro promove nova troca na presidência da Petrobrás. É o retrato de um governo perdido e sem coragem para mudar a paridade internacional de preços”, disse. O senador Humberto Costa (PT-PE) lembra que o atual governo já trocou três vezes o presidente da estatal. “A única coisa que não cai é o preço do combustível”, ironizou.
Segundo Jean Paul, a troca teatral promovida pelo Palácio do Planalto traz danos irreparáveis à imagem da Petrobras. “Enquanto isso, a estatal tem seus ativos sendo vendidos a preço de banana, lucra sem méritos administrativos e distribui tudo aos poucos acionistas preferenciais, em detrimento da economia e do povo brasileiro”, declarou.
O resultado acumulado em 12 meses é de alta de 33,33% do preço dos combustíveis, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de fevereiro, indicador oficial de inflação no país, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao longo do ano passado, o aumento foi de 49,02%. Em março, a gasolina acumula alta de 42,71% do preço. Já o etanol aumentou 36,17% em 12 meses.
Apontado como motivo principal da demissão de José Mauro Ferreira Coelho da presidência da Petrobrás, o risco de desabastecimento de diesel no mercado brasileiro é real e iminente. O alerta é da Federação Única dos Petroleiros (FUP). A entidade publicou nota na última semana avisando que o país pode ficar sem o óleo no início do segundo semestre.
Os motivos do desabastecimento serão a prevista escassez de oferta no mercado internacional e o baixo nível dos estoques mundiais, agravados após as sanções lideradas pelos Estados Unidos contra a Rússia devido à guerra na Ucrânia. Os riscos são os mesmos citados no documento ‘Combustíveis: desafios e soluções’, que Ferreira Coelho teria mostrado a Bolsonaro como justificativa para não congelar os preços do óleo.
“Se não houver sinal de preços de mercado à frente, há risco material de desabastecimento de diesel no pico de demanda da safra, afetando o PIB do Brasil”, alertou o presidente da Petrobrás. O documento foi obtido pela agência de notícias Reuters. A estatal lembrou que a demanda pelo diesel tende a aumentar a partir de junho e julho, com a entrada da safra agrícola destinada à exportação.
“A Índia está produzindo diesel com petróleo russo e exportando para a Ásia e o Brasil. Porém, grande parte do diesel importado pelo Brasil, cerca de 80%, é fornecido pelos EUA, que estão mandando muito para a Europa”, descreve o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar. “Há possibilidade real de faltar diesel no mercado brasileiro ou de o preço explodir no país”
Bacelar afirma que essa ameaça de desabastecimento de diesel no mercado doméstico, a menos de cinco meses das eleições presidenciais, levou Bolsonaro ao desespero e se tornou o pano fundo da quarta troca de presidente da Petrobrás em sua “gestão”. Também motivou o balão de ensaio da proposta de congelamento de preço do produto por 100 dias, numa tentativa eleitoreira de evitar maiores explosões da inflação.
Em três anos e quatro meses de desgoverno Bolsonaro, o preço do diesel subiu 90%. O dado é de levantamento divulgado pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep). Novamente, o PPI é apontado como principal responsável pela explosão dos preços. “É como se a Petrobrás estivesse funcionando como um monopólio privado”, afirmou o economista Eduardo Costa Pinto. •