Empreendedorismo: uma solução criativa e coletiva em Araraquara

Em quatro meses, cooperativa de motoristas da cidade consolida aplicativo próprio, eleva ganhos e diminui jornada. Agora, se prepara para segunda geração da plataforma

 

 

Está funcionando bem o aplicativo adotado pela cooperativa de motoristas Coomappa, de Araraquara (SP). O grupo, formado por 270 pessoas, resolveu criar a cooperativa e adotar um aplicativo alternativo às plataformas Uber e 99 para poder ganhar melhor e ter jornadas de trabalho reduzidas.

Hoje, quase quatro meses após ter entrado em operação comercial, a cooperativa está realizando, graças ao aplicativo, em média, 550 corridas diárias durante a semana e 700 aos sábados e domingos. Segundo os cooperados, 95% dos valores das corridas ficam com os motoristas e os demais 5% são destinados a remunerar o aplicativo e a própria cooperativa.

Com isso, a vida dos cooperados está melhorando. Katia Anello, presidenta da Coomappa, explica que sua jornada de trabalho, que anteriormente era de 14 a 16 horas por dia, hoje é de 10 horas, para atingir o mesmo resultado financeiro ao final do mês. “É gritante a diferença. Uma corrida de R$ 10, a gente fica com R$ 9,50. Com o Uber, é R$ 6,40, no máximo”, relata.

Uma parte dos cooperados ainda tem trabalhado com os aplicativos tradicionais, quando há tempo livre entre uma chamada e outra. Mas já há quem os tenha deixado de lado por completo, informa a cooperativa. Do ponto de vista de proteção trabalhista, todos têm recolhido as contribuições previdenciárias pelo regime de microempreendedor individual. No médio prazo, o grupo pretende adotar a contribuição via cooperativa.

Além dos 270 cooperados ativos, há uma espera de aproximadamente 1 mil motoristas que querem ingressar na Coomappa, e que agora estão passando por treinamento e cursos, em parcerias com a prefeitura e entidades como o Sebrae. Segundo a Coomappa, essa preparação é importante para a compreensão sobre o modelo e os objetivos de uma cooperativa de trabalhadores. Essa procura pode ser vista como um termômetro da evolução da empreitada.

 

Adaptação

O processo de adaptação teve seus problemas nos dois primeiros meses, com dificuldades geradas principalmente pelo GPS adotado pela plataforma. Atualmente, o funcionamento está bem equacionado, atesta Katia Anello. O aplicativo em uso, Bibi Mob, é uma franquia que opera em outras regiões, mas em Araraquara é de uso exclusivo da Coomappa. “Nós adotamos essa franquia em caráter de urgência, porque ninguém mais suportava Uber e 99”, explica.

Porém, um novo aplicativo, feito sob medida, está sendo desenvolvido por uma equipe de especialistas montada pela prefeitura da cidade. Comandada por Edinho Silva, do PT, a prefeitura tem participado e apoiado a cooperativa desde o início. Além do novo aplicativo, uma das formas de apoio é a cessão de um espaço físico para sediar a cooperativa e servir de base para os motoristas em serviço.

Com o novo aplicativo que substituirá o atual, a cooperativa pretende ter mais rapidez para efetuar adaptações que as circunstâncias exigirem. Aberta aos cooperados, a tecnologia poderá ser moldada com menos níveis de interferência e dependência. A entrega está prevista para junho. A operação começará em caráter de transição, com o Bibi Mob ainda em uso, para evitar solavancos no trajeto.

Por enquanto, o aplicativo alternativo parece agradar aos usuários. “Já usei quando não encontrava outros aplicativos de transporte particular. Costuma funcionar bem, não dá problemas de conexão”, atesta a especialista em mídias sociais Geovana Oliveira, moradora da cidade. Ela diz que tende a chamar primeiro os aplicativos mais tradicionais. “O que falta são os usuários e motoristas acreditarem na plataforma da cooperativa, pois além de ser algo que movimenta a economia da cidade, é mais barato”, defende.

O fato é que a cooperativa ainda não realizou uma campanha de publicidade porque a intenção é aguardar a plena operação do novo aplicativo e o ingresso dos demais candidatos. “Queremos garantir nossa preparação antes de um forte aumento da demanda”, explica Katia. Até agora, a divulgação ficou restrita a reportagens feitas no lançamento da iniciativa, nos meses de janeiro e fevereiro. E no contato direto entre motoristas e passageiros.

Entre os defensores da proposta de cooperativas de trabalho como modelo de geração de emprego e renda, a palavra solidariedade é empregada com frequência. No caso da Coomappa, vai além de definição. O germe da união dos motoristas tem início com o incêndio que destruiu o carro da Katia Anello, pouco antes do início da pandemia.

Ela já trabalhava como motorista de aplicativo havia dois anos, não tinha seguro do carro, que estava financiado. “Um grupo de cinco amigos se uniu pra me ajudar. Fizeram uma vaquinha, me apoiaram para alugar um outro veículo”, lembra. Daquele episódio, começaram as discussões para encontrar uma alternativa à penúria que atinge os motoristas de aplicativo, em geral.

No início, procuraram a prefeitura para pedir ajuda na organização de um sindicato que os defendesse das más condições de trabalho impostas pelos grandes aplicativos. “Mas não cabe à prefeitura organizar sindicato. Então propusemos, quando nos procuraram, a alternativa de organizar uma cooperativa e buscar um aplicativo próprio”, recorda Camila Capacle, coordenadora de Trabalho e Economia Criativa e Solidária da prefeitura.

Foi uma resposta baseada na experiência acumulada desde 2001, no primeiro mandato de Edinho. A cidade tem programas que geram trabalho e renda para catadores de material reciclável, cozinheiras e agricultores familiares. A administração é a principal contratante desses serviços e produtos. Camila usa a expressão “empreendedorismo coletivo” para se referir ao modelo. Em breve, anuncia, a próxima cooperativa em operação será a dos motoentregadores. Eles aguardam o pleno desenvolvimento do aplicativo que está em gestação para também embarcarem nessa empreitada. •