E então, Bowie virou a estrela
Em 6 de julho de 1972, o cantor e compositor inglês David Bowie se apresentava com a banda Spiders from Mars na sisuda emissora BBC, no programa Top of The Pops, entoando a épica canção ‘Starman’. Era um esforço para divulgar o álbum The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars, lançado em abril daquele ano. A apresentação foi catártica e David se lançou de tal maneira ao megaestrelato que nunca mais a música pop britânica foi a mesma.
A canção era uma balada, com violões folk e uma melodia memorável. A banda era sensacional, mas a performance de Bowie foi arrebatadora, com o cantor exbindo um corte diferente com cabelos vermelhos, macacão brilhante e um violão de 12 cordas azul. E cantava diretamente para o espectador. Mas o momento em que aponta o dedo para a câmera durante aquela aparição na BBC é reconhecido como o momento exato em que Bowie se tornou uma grande estrela. Na verdade, a grande estrela dos anos 70.
O ponto sem retorno foi logo depois do refrão, quando ele canta os versos “I had to phone someone so I picked on you… oooh oooh” — “Eu tive que ligar para alguém então eu peguei você-hoo-oo”. Ao se dirigir daquele jeito à audiência, Bowie quebrou a chamada quarta parede e entrou na casa dos milhares de jovens para entregar uma mensagem diretamente a cada um deles.
Naqueles tempos, o programa era a janela de exibição para artistas e roqueiros. E aparecer lá era estar em todas as casas dos jovens do Reino Unido. Pois Bowie naquele dia cantou para uma audiência cativante que incluía Paul Hewson, um garoto irlandês que vivia em Dublin e ficou tão mexido com a apresentação da lenda que decidiu naquele dia também se tornar uma lenda: Bono, do U2.
O mesmo aconteceu com Boy George, que viria a criar o Culture Club anos depois. Ou Ian McCulloch, que ficou extasiado e decidiu que seria um músico famoso e formaria uma banda… chamada Echo & The Bunnymen. Aconteceu ainda o mesmo com Brett Anderson, que se identificou de tal maneira com a visão de Bowie e as Aranhas de Marte na TV, que tornou-se um obcecado pelo cantor e criaria a banda Suede, saudada no começo dos anos 90 como a redescoberta de Bowie… por Bowie. O mesmo ainda ocorreu com James Patrick Morrissey, que fundaria os Smiths.
O disco The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars foi influenciado diretamente pelos Stooges e os álbuns do Velvet Underground, que Bowie tinha ouvido e ficado impressionado em sua visita aos Estados Unidos no anterior, 1971. A crítica inglesa diz que ele também deve muito aos singles de sucesso com os quais Marc Bolan, um músico criativo da cena noturna e do circuito Arts Lab, estava arrasando nas paradas de singles em 1971. “Vão ser muitas guitarras”, Bowie disse ao seu produtor Ken Scott. “Você provavelmente não vai gostar.”
Nos primeiros meses de 1972, antes do lançamento de Ziggy, ele e sua nova banda estavam começando a aparecer no palco vestindo os trajes espaciais que haviam tirado do filme Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick. Em fevereiro, tocaram no Old Grey Whistle Test da BBC. Bowie já havia aparecido na Melody Maker anunciando que era bissexual. Assim, tudo estava preparado para quando Ziggy aparecesse em junho de 1972… E o mundo estaria pronto. O hype criado por Bowie foi tão grande, que ele nunca mais voltou a ser um artista comum. E aqui estamos falando dele 50 anos depois. •