EDITORIAL – A Guerra e seus impactos econômicos e geopolíticos
A deflagração da operação de guerra da Rússia sobre a Ucrânia pode ter consequências dramáticas para a já combalida economia brasileira. Isso porque o início do grave conflito militar na Europa pressiona os dois principais pilares da inflação no Brasil: petróleo e alimentos.
Após o anúncio de uma operação militar na Ucrânia pelo presidente Vladmir Putin, o preço do barril do petróleo, que já vinha em alta, superou a marca dos US$ 100 pela primeira vez desde setembro de 2014. Nesse cenário de alta, o Brasil não conta com uma política estratégica para a Petrobrás enfrentar a questão pelo abandono dos investimentos no refino e em um sistema integrado de produção, distribuição e comercialização, que gerem ganho e competitividade em relação a outras economias.
Nos governos Temer e Bolsonaro, a Petrobrás foi desmantelada e opera pela lógica da política de preço de paridade de importação. Com isso, a cadeia nacional de petróleo e gás está subjugada aos interesses de 390 empresas importadoras dos acionistas minoritários da empresa, que impõe uma política de dolarização dos preços dos combustíveis em território nacional.
É inacreditável que depois do país atingir a condição de autossuficiência em petróleo, com a descoberta das gigantescas reservas do pré-sal em nossos governos, tenha-se optado por se tornar mero exportador de óleo cru e importador de produtos acabados.
Com isso, em 2021, ano que o povo brasileiro pagou preços recordes por gasolina, óleo diesel e gás de cozinha, a Petrobrás apresentou o maior lucro de sua história: R$ 106,6 bilhões. Um crescimento de 1.400% em relação ao ano anterior. Seguramente, a alta do barril do petróleo decorrente da guerra na Europa, frente à fragilidade da Petrobrás, resultará em inflação na veia e um efeito cascata nos custos de produção da economia brasileira.
O segundo ponto de atenção são os possíveis impactos do conflito na importação de fertilizantes da Rússia, especialmente o cloreto de potássio, produto fundamental para a fertilização do solo e indispensável para a agricultura nacional. O Brasil importa 95% do potássio que utiliza e a Rússia é a principal fornecedora desse produto para o país.
O potássio já está em falta e, assim como petróleo, também está com preço em alta. É evidente que isso terá impacto no custo de produção agrícola, pressionando o preço dos alimentos e impactando de forma dramática a cesta básica e a inflação.
Nada justifica uma guerra e acreditamos na construção da paz por meio do diálogo e da diplomacia, mas é inegável que o fim União Soviética poderia ter gerado uma ação pacificadora do Ocidente. Mas, ao contrário disso, as forças ocidentais optaram por aprofundar uma política agressiva de expansão, com a OTAN passando de 12 membros originais para 30, inclusive com nações fronteiriças à Rússia, como tentam fazer agora com a Ucrânia.
Não é demais lembrar que, no início do mês, antes do início da incursão russa, Putin e o presidente da China, Xi Jinping, divulgaram um comunicado em que denunciavam a expansão da Otan, que está no centro do atual conflito em curso na Ucrânia.
Esse entendimento entre Rússia e China mexe definitivamente com a geopolítica mundial. Os bloqueios econômicos do Ocidente podem ter algum efeito de curto prazo na economia russa. O embargo ao gasoduto entre Alemanha e Rússia, por exemplo, gerará uma grave crise energética para os alemães, ao mesmo tempo que possibilita a Moscou oferecer gás natural barato para a China por meio do projeto Força da Sibéria.
Os efeitos de médio e longo prazo do bloqueio ocidental podem até agravar a vulnerabilidade econômica da Rússia, mas colocam no horizonte também um possível acordo comercial amplo entre russos e chineses.
Por isso, os desdobramentos dos conflitos na Ucrânia podem resultar na supremacia da economia chinesa no mundo, ao mesmo tempo em que, no Brasil, viveremos o aprofundamento da crise econômica e a explosão inflacionária, em razão de um presidente pária internacional, que é incapaz de entender os desafios, de dialogar, de negociar e de ser respeitado pelos principais líderes do mundo.