Vinte milhões de brasileiros passaram um dia sem ter o que comer em 2021, aponta estudo da Rede Pessan. A fome aumentou em todas as regiões do país, mas é pior no Norte e Nordeste

 

 

O conceito de segurança alimentar é classificado de três formas: 1) leve, quando alguns alimentos básicos estão indisponíveis; 2) moderada, quando essa pouca disponibilidade afeta parte da população sob o ponto de vista nutricional; e 3) grave, quando se passa um dia ou mais sem comer.

Em abril de 2021, um estudo da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Pessan) mostrou que cerca de 20 milhões de brasileiros passaram um dia ou mais sem ter o que comer.

Mais da metade dos lares da população, 116,8 milhões de pessoas, sofre com algum tipo de insegurança alimentar no país. Nada menos que 55,2% dos lares brasileiros conhecem bem a insegurança alimentar. Em 2018, esse percentual era de 33,7%. De 2019 para 2021, o número de pessoas em insegurança alimentar grave, ou seja, que passa fome, saltou de 10,3 milhões para 19,1 milhões.

Em 2013, 77,1% dos lares brasileiros tinham segurança alimentar, um ineditismo. É o nosso recorde histórico. Em 2018, o percentual já havia caído para 63,3%, mesmo número de 2004, quando o governo Lula estava no início.

O sucesso de programas sociais como o Bolsa Família repercutiu no mundo todo. Afinal, era um país em que, ao final da década de 90, 300 crianças morriam de desnutrição e fome por dia. Do final dos governos petistas para cá, os números e as dores da fome alcançaram parcelas cada vez maiores da população, voltando ao patamar do final do século passado.

A fome aumentou em todas as regiões do país, mas se 9% da população geral brasileira não tem o que comer, o indicador é de 18,1% no Norte e 13,8% no Nordeste. Também é maior na área rural e entre pessoas pretas e pardas. É também maior nos domicílios chefiados por mulheres ou no qual a pessoa de referência da casa possui baixa escolaridade.

Tudo indica que esse massacre deve continuar. Os preços médios da cesta básica aumentaram já no primeiro mês deste ano. Nas maior parte das capitais, a alta chega a comprometer mais de 60% do salário mínimo líquido. Itens básicos como açúcar, óleo de soja, batata, tomate e café foram os que mais subiram.

Quem vive com salário mínimo gasta mais da metade — 55,2% — de sua renda para comprar itens básicos de alimentação. Na cidade mais rica do Brasil, a capital São Paulo, o comprometimento da renda chega a 63,67% do salário mínimo.

O foco no agronegócio acentua essa situação dramática. O privilégio às commodities contrasta com a ausência de fomento à agricultura familiar: arroz, feijão e mandioca hoje têm as menores áreas de plantio das últimas décadas.

Para completar a política da fome, o governo Bolsonaro zerou os estoques reguladores e não deve retomar a política de formação de estoques públicos.

Com as altas taxas de desemprego, o achatamento da renda, a inflação crescente, o trabalho precarizado, a retirada de direitos, o campo ajoelhado para o agronegócio e um desamparo social que beira a desfaçatez, o combate à fome não voltará tão cedo. Permanecerá sendo uma política de exceção na nossa história.

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