A construção política do Dia Nacional da Consciência Negra, hoje feriado nacional em alguns municípios brasileiros, tem um sentido especial. A existência do racismo, no Brasil, revela-nos o quanto a consciência política é atravessada pela branquitude

 

 

De onde vem a força dos negros e das negras brasileiros, que apesar de terem suas vidas ameaçadas cotidianamente pelo racismo, pela pobreza, pelas desigualdades e violências, persistem com altivez e orgulho e são capazes de reeducar a sociedade, o Estado e a esquerda brasileira sobre a urgência do antirracismo?

Aprendemos com o Movimento Negro que essa força vem da ancestralidade africana. Das mulheres e homens negros escravizados e trazidos à força da África para o Brasil. E que nunca perderam a sua dignidade. Resistiram e lutaram.

Foi o movimento negro, em especial, o Grupo Palmares, no Rio Grande do Sul, que em 1971 idealizou e propôs o dia 20 de novembro, data a morte de Zumbi, como Dia da Consciência Negra. Essa foi a forma encontrada por aquele grupo de valorizar o papel dos negros e das negras na sociedade e denunciar o racismo. A proposta era criar uma data comemorativa que confrontasse o 13 de Maio, considerado como dia da abolição da escravatura.

O Quilombo de Palmares é um símbolo de resistência contra a escravidão no Brasil. Foi o maior quilombo da América Latina. Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, Aqualtune, sua avó, Dandara, sua companheira e Acotirene, matriarca e líder palmarina, são exemplos de força vital.

O Movimento Negro do passado e do presente, nas suas mais diferentes formas de organização e estratégias de luta contra o racismo, no Brasil, representa simboliza a continuidade de Palmares.

O Brasil deve a população negra brasileira o fato de ter aprendido que é preciso combater e superar o racismo. E o Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras (PT) deve aos militantes negros e negras que nele atuam, o debate sobre a presença negra nos espaços de poder e de decisão no partido e nos governos por ele liderados.

É importante destacar que a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial nos governos do PT e a implantação de diversas políticas publicas voltadas para a população negra teve a participação efetiva da militância de negros e negras do PT.

A atuação da militância negra petista tem possibilitado um aumento paulatino da consciência antirracista dentro do próprio PT e de outros setores da esquerda, negros e não negros.

Nos momentos de pós-golpe de 2016, com ascensão da extrema direita ao Executivo Federal, em 2018, e a escalada de destruição dos direitos, das pautas raciais, de gênero, LGBTQUIA+, da juventude, da assistência, da previdência, da ciência e tecnologia, da educação, da cultura e dos direitos humanos é visível que o discurso antirracista vem ocupando um outro lugar no partido.

Líderes partidários importantes que antes sequer mencionavam o racismo estrutural e estruturante das relações sociais e de poder brasileiras passaram a assumir essa reflexão em seus discursos. O desafio está em fazer desse reconhecimento parte da nossa práxis.

Esse aumento da consciência antirracista tem crescido à medida em que também se acirra o racismo em tempos de neofascismo. E nunca podemos nos esquecer da ação do movimento negro nesse processo, bem como a sua presença histórica como inspirador e construtor  das lutas antirracistas na sociedade brasileira.

Por tudo isso, queremos destacar a importância do dia 20 de novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra e a ampliação do debate público e político sobre o combate ao racismo para todo o mês de novembro.

Reconhecemos que o debate não se reduz a uma única data ou mês. Mas é preciso entender que a construção política do Dia Nacional da Consciência Negra, hoje feriado nacional em alguns municípios brasileiros, tem um sentido especial.

A existência do racismo, no Brasil, revela-nos o quanto a consciência política do brasileiro e da brasileira é atravessada pela branquitude e pelo racismo. Ela precisa ser politizada e reeducada na compreensão de que o combate ao racismo é um dever ético, cidadão e político de todas as pessoas independentemente do seu pertencimento étnico-racial, classe social, religião, idade, gênero e orientação sexual.

Esse aumento de conscientização política não se faz apenas com discursos. É preciso construir práticas antirracistas, políticas de igualdade racial, programas e projetos de ações afirmativas. E é preciso coibir o racismo, de fato, com a aplicação justa das leis antirracistas já existentes.

Se no passado, africanos e africanas escravizados e seus descendentes foram o motor da economia da colônia, com seus braços, seu trabalho, sua vida, hoje, a situação não é diferente.

O dia 20 de novembro insta-nos a continuar indagando: quais são os lugares ocupados pelos negros e as negras na economia do nosso país? Eles e elas continuam sendo um dos motores dessa economia, mas ainda são os braços trabalhadores explorados pelo capitalismo, os corpos negros assassinados pelo racismo.

Reconstruir e transformar o Brasil implica que todo e qualquer projeto e proposta democráticos do PT e do campo da esquerda precisam incorporar políticas e práticas antirracistas.

Urge que o debate político sobre o antirracismo no campo da esquerda avance para uma práxis antirracista e que possamos discutir e agir para mudar afirmativamente o lugar ocupado pelas negras e negros no PT, principalmente quando se aproximam as eleições de 2022.

As discussões aqui realizadas extrapolam a discussão sobre o 20 de novembro, mas estão no seu núcleo de reivindicação política. Por isso, ele continuará sendo um dos principais momentos de reconhecimento e visibilização da força, da resistência negra e da luta antirracista.

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