PING PONG | JOSÉ CARLOS LIMA – “Bolsonaro está destruindo tudo”
Derrotar Jair Bolsonaro é fundamental para que o Brasil se recupere e deixe de ser um pária internacional. A reeleição do atual presidente da República provocaria um caos completo no meio ambiente brasileiro, afirma José Carlos Lima, presidente da Fundação Herbert Daniel, ligada ao Partido Verde (PV). Nesta entrevista, ele diz acreditar na possibilidade de resgatar o sistema público de gestão ambiental e afirma ser necessário ir além de denunciar. Diante da conjuntura, a Fundação Verde Herbert Daniel se reuniu com a Fundação Perseu Abramo e está em andamento uma proposta para a construção de uma plataforma conjunta para 2022.
Focus Brasil — Muitos alertas estão sendo feitos sobre a devastação do meio ambiente no Brasil, há uma preocupação muito grande com o tamanho do estrago. Não só pela devastação, mas também pelo sistema de gestão do meio ambiente. O senhor acredita que ainda exista a possibilidade de reverter os danos que foram causados pelo governo Bolsonaro?
José Carlos Lima — Os danos provocados pelo governo Bolsonaro no sistema de gestão ambiental, mexendo no ICMBio, no Ibama, interferência política nos órgãos foram grandes. O governo destruiu o Conselho Nacional de Meio Ambiente, o Conama, um órgão muito importante e respeitado não só na gestão do meio ambiente. Há um conselho que hoje não funciona mais, não tem respeitabilidade. Bolsonaro foi destruindo tudo. O mais grave foi o Fundo Amazônia. Tudo é grave, mas este era um fundo de solidariedade internacional, que colocava o Brasil como grande nação protagonista da questão ambiental. Todas as decisões passavam pelo Brasil e tínhamos conseguido solidariedade internacional da Alemanha, da Noruega, dos países da Europa. Isso nos colocava no patamar que merecíamos pelo trabalho que a gente vinha fazendo. Então, esse recursos foram colocados à disposição do Fundo Amazônia para apoiar a sociedade. O artigo 225 da Constituição diz que a responsabilidade sobre o meio ambiente é do poder público nos seus entes diversos, mas também da sociedade civil. E a participação dela é fundamental. Eu não concebo um Estado forte sem uma sociedade civil forte. Esse dinheiro, além da questão de ter a solidariedade internacional, era o reforço às instituições que não conseguem funcionar no Brasil porque a sociedade não foi acostumada a financiar os próprios organismos da sociedade. Quando a gente fala em ONG, elas não sobrevivem se não tiverem apoio governamental, não tem jeito. E não é só aqui, na Alemanha é assim também. O fundo ajudava as associações indígenas, ONGs que monitoram o desmatamento. E isso acabou. O sistema meteorológico dos mapas de desmatamento também foi desmontado. E isso tudo aconteceu para o avanço do garimpo, da agricultura ilegal e do desmatamento. Acabaram com a fiscalização.
— A devastação do meio ambiente pode ser revertida?
— Estamos numa emergência climática, a sociedade precisa entender isso. Até então, se não fizéssemos o dever de casa, iriamos atingir um aumento de 1,5° da temperatura do planeta em 2060. Mas 262 cientistas emitiram um relatório para a ONU alertando que esse patamar será atingido em 2030. Perdemos 30 anos. A Amazônia é fundamental para a questão climática. Além disso, temos um problema econômico porque temos um potencial de recursos naturais que têm um valor muito grande. E nós estamos destruindo. O garimpeiro causa essa destruição. O ouro que ele tira de lá não gera riqueza nenhuma, não vai resolver o problema da miséria e pobreza.
— O que representaria para o meio ambiente uma nova vitória do Bolsonaro em 2022?
— Seria como se uma parte da sociedade estivesse dizendo sim à destruição, ao seu próprio fim. É pôr fim ao compromisso com as futuras gerações. Seria um sim a tudo o que não é bom para ninguém. O Brasil ficaria completamente isolado do planeta. Após oito anos deste governo, a gente estaria diante do caos completo. Ainda há jeito. Há, sim. Temos uma eleição pela frente e nesse processo precisamos de políticos que apresentem não só a denúncia. É preciso denunciar, gritar e mostrar a realidade para a sociedade. O povo brasileiro é o que menos percebe a sua própria realidade, o sistema de informação no Brasil é deficitário demais e, por isso, a informação não chega e o que se produz é muito pobre e tendencioso. Não é por acaso que Bolsonaro consegue fazer as pessoas acreditarem em mentiras utilizando fake news. Então, a gente precisa informar o povo sobre o que está acontecendo e ele precisa saber que também tem responsabilidade. Mas é preciso apresentar um projeto viável capaz de produzir e preservar, gerar emprego e renda de qualidade, preservando o meio ambiente.
Dos governos civis, da ditadura militar para cá, o presidente Lula fez muito pela Amazônia, mas talvez pelo tempo ou por falta de um debate mais profundo não conseguimos construir coletivamente um modelo de desenvolvimento compatível com o bioma. Não cabe desmatamento, nem madeireira, nem boi. É preciso construir esse modelo que impeça a continuidade do desmatamento.
— Nesse contexto, surge uma parceria entre a Fundação Verde Herbert Daniel e a Fundação Perseu Abramo. Você pode contar um pouco sobre a elaboração dessa plataforma conjunta?
— Tivemos uma primeira conversa a partir do Observatório da Democracia e estivemos com Lula a convite da Perseu Abramo. A receptividade dele foi ótima e isso nos encorajou a reunir os nossos pensadores com os da Perseu Abramo para fazer uma revisão de tudo o que já foi pensado. Vamos olhar todas as políticas públicas dos anos dos governos do PT e do tempo em que participamos do governo e outra parte em que criticamos no sentido da construção, não da destruição. Às vezes, radicalizamos pelo lado do ambientalismo, pelo lado do conservacionismo. Outras vezes, a pressão ruralista em cima do governo também fazia o seu papel. O momento é de fazer uma revisão dos dois lados e construirmos um programa para apresentar ao presidente Lula para o debate presidencial. Fizemos essa conversa e, depois de 7 de Setembro, devemos dar prosseguimento. É um momento em que os brasileiros que gostam do meio ambiente, da Amazônia, das questões indígenas devem sentar para fazer a reflexão e fazer a boa política acontecer.