Apesar do avanço da vacinação e da retração gradual da pandemia de Covid-19 no Brasil, a economia brasileira segue na UTI. A recuperação do crescimento esperada com a retomada das atividades está ameaçada pela carestia, pelo desemprego, desalento e pelo endividamento recorde das famílias em um cenário de aumento dos juros.

Se a previsão segue sendo de crescimento de aproximadamente 5% em 2021 — apenas recuperando a queda de 4,1% do ano passado —, a expectativa para 2022 é de que o Brasil volte para o cenário de estagnação que enfrenta desde o governo Temer, com crescimento estimado de 2%.

O mais grave é que essa esperada volta à estagnação ocorrerá em um cenário econômico e social extremamente deteriorado. Atualmente, o país tem aproximadamente 15 milhões de trabalhadores (as) desocupados (as), 5,7 milhões de trabalhadores (as) desalentados (as) e um total de 29,3% da população trabalhadora subutilizada. Dentre os empregados, ao menos 40% se encontram na informalidade e seus rendimentos reais (já descontadas a inflação) mostram estagnação, quando não queda.

Esses dados se refletem também na ampliação da pobreza e da fome, que voltaram a assolar os brasileiros após terem sido virtualmente eliminadas durante os governos petistas. São 14,3 milhões de brasileiros vivendo em um cenário de extrema pobreza, dentre os quais cerca de 40% são crianças e adolescentes e 74% negras ou pardas.

De acordo com a Oxfam, mais da metade do Brasil hoje se encontra em uma situação de insegurança alimentar, sendo que 43,4 milhões se encontram em situação moderada ou grave de insegurança alimentar — quando falta comida no prato. O crescimento do número de pessoas em insegurança alimentar grave é assustador: saltou de 10 milhões em 2018 para 19 milhões em 2021, uma verdadeira epidemia de fome.

Além do desemprego e da queda na renda, outro fator que contribuiu para esse cenário desolador é a carestia. O IPCA, principal indicador de inflação, já acumula alta de 9% em 12 meses, e o INP, índice que capta a realidade das famílias mais pobres, alcançou elevação de 9,85% no mesmo período.

Um dos principais vilões dessa inflação elevada é o preço dos alimentos, a energia elétrica, os combustíveis e o gás de cozinha. Como é possível ver na tabela, alguns alimentos chegam a acumular aumento de 40% ou mais em seus preços, pressionando fortemente o orçamento das famílias mais pobres. A energia elétrica, que já acumula alta de 20% em 12 meses, deve seguir pressionada devido à seca e a falta de investimentos no setor de produção de energia nos últimos anos.

O fracasso do ultraliberalismo

Sem emprego, sem renda e com os produtos cada vez mais caros, as famílias brasileiras têm batido recordes de endividamento. Atualmente, 71% das famílias se encontram endividadas, sendo que 10,9% estão muito endividadas, sem perspectivas de quitar suas obrigações. Esse número cresce se analisarmos apenas as famílias que tem renda até 10 salários mínimos, quando o endividamento alcançou 72,6% das famílias em julho.

Para piorar a situação, com o aumento da inflação, o Banco Central está promovendo uma rápida elevação dos juros básicos da economia, a chamada taxa Selic. A previsão é que se chegue ao final do ano com a Selic próxima de 8%, impactando diretamente o custo do crédito ao consumidor, incluindo o crédito imobiliário, um dos poucos setores da economia que vinha reagindo e que, agora, diante do encarecimento dos insumos e do crédito, tende a desacelerar.

Os dados aqui apresentados são inequívocos e falam por si. A estratégia ultraliberal de Paulo Guedes, que representou um aprofundamento da já fracassada “Ponte para o futuro” do governo Temer, fracassou.

As reformas não promoveram crescimento, não geraram empregos e foram incapazes de preparar a economia para enfrentar momentos de crise, como a pandemia da Covid-19. Além do negacionismo, da inação e das atitudes criminosas na propagação do vírus, o impacto econômico da crise no Brasil será majorado por uma agenda econômica fracassada e ultrapassada, que não será capaz de recuperar o crescimento, o emprego, a renda e estabilizar a economia brasileira.

Por hora, o governo prossegue com a agenda liberal de um lado — privatizações, reforma administrativa e desmonte do Estado —, enquanto busca formas de aumentar os gastos e garantir desonerações para a classe média durante o ano eleitoral, através da reforma do imposto de renda e da PEC dos Precatórios.

A ilusão de que o objetivo da política econômica era a “sustentabilidade fiscal” já se desfez há muito tempo. Está claro quais os reais intuitos de Guedes e Bolsonaro: destruir o Estado, enquanto distribuem recursos públicos para seus aliados políticos visando a eleição de 2022. O preço pela aventura bolsonarista é alto não apenas no cenário social, ambiental, político e institucional, mas também no pilar econômico.