O Brasil enfrenta uma das maiores crises econômicas dos últimos 75 anos. Somando-se o número de desempregados com o de subocupados, chegamos a um terço da força de trabalho do país. A miséria absoluta já atinge 8% da população. Nesta hora difícil, o governo federal apresenta uma proposta de reforma tributária onde o mínimo que seria esperado é que amenizasse a situação cruel por que passa a grande maioria — a população pobre do país, assim como o enorme contingente de pequenas e microempresas. Mas o que se vê é justamente o contrário.

O Brasil é realmente o país das grandes contradições. Aqui, o grupo mais rico constituído por apenas 1% da população recebe 28% de toda renda do país e tem metade do patrimônio. No caso das empresas, a concentração é ainda pior, pois apesar de serem 99% das empresas brasileiras (7,5 milhões) as pequenas e as micro são responsáveis por apenas 29% do PIB brasileiro. É uma das taxas mais baixas do mundo. Para se ter uma ideia, em qualquer país da Europa a taxa mais baixa é de 50% chegando a 65% na Alemanha.

A reforma em discussão nem considera taxar os super-ricos ou mudar as alíquotas do imposto de renda, criando novas faixas de taxação para as camadas com maiores rendimentos. Hoje um trabalhador assalariado que ganha R$ 6 mil reais por mês, ao fazer seu imposto de renda, vai pagá-lo baseado numa alíquota de 27,5%, enquanto um grande empresário cuja empresa distribuiu R$ 600 mil por mês a título de lucros e dividendos não vai pagar nada. Assim é o nosso sistema tributário. Pode se falar tudo dele, menos que seja justo.

Com o envio da proposta de reforma tributária em julho, o Congresso finalmente passou a discutir como taxar dividendos, mas na pessoa jurídica e não na pessoa física, como seria o correto. Aliás, a discussão que se trava na Câmara dos Deputados sobre como taxar o imposto de renda das pequenas empresas mostra bem como é enorme o poder da grande empresa em nosso país. Como estas contam com diversos incentivos fiscais – Reidi, Reiq, Suframa, etc. – que não existem para as pequenas, os próprios dados da Receita Federal mostram claramente que as pequenas pagam muito mais que as grandes.

Em média, a pequena paga 2,5 vezes mais que a grande quando a base é o imposto pago dividido pelo faturamento. No entanto, há técnicos conceituados e que se dizem especialistas em tributação que advogam ainda uma maior taxação sobre as pequenas. É esse poderoso lobby das grandes que não permite que o Brasil tenha políticas públicas que favoreçam as pequenas.

Mas, apesar dos pesares, está errado pensar que o desenvolvimento das pequenas e microempresas deva se basear somente em questões tributárias. Isto está em pauta nesta reforma, mas a questão é muito mais ampla do que apenas incentivos e desonerações. O que falta são políticas públicas como as que existem nos países onde as pequenas empresas são peças chave das respectivas economias. Na Itália, por exemplo, graças a uma política de incentivo à formação de consórcio de pequenas empresas, mais da metade das exportações se originam nas mesmas, enquanto no Brasil as pequenas não respondem nem por 1% de nossas exportações.

Até nos países ditos mais liberais, como os Estados Unidos, as pequenas empresas contam com fortes privilégios quando participam de concorrências públicas e compras governamentais, enquanto no Brasil inexistem iniciativas deste tipo. Sem contar a questão do crédito, uma dificuldade crônica das pequenas empresas, devido sobretudo à falta de interesse dos bancos em emprestar.

Veja se o que acontece com o Pronampe, que deixou de ser um programa de apoio à pequena empresa para se transformar num produto de prateleira dos bancos. Isso porque, com os juros e as condições oferecidas, só vai se interessar o pequeno empresário que não fizer as contas sobre quanto vai perder. Até hoje o único programa de crédito decente que realmente ajudava a pequena empresa foi o Cartão BNDES concebido no governo Lula, mas descontinuado por Temer, justamente por que não interessava aos bancos.

O fato é que estamos vivendo uma situação muito difícil do ponto de vista econômico e, o que é pior, sem perspectivas. Afinal como gerar emprego de fato para 33 milhões de trabalhadores? A saída estaria na pequena empresa, que ainda é responsável por metade dos empregos com carteira assinada no Brasil. Mas, para isso, ela precisaria de apoio e o que procuramos mostrar neste artigo é que hoje, esse apoio não só não existe, mas, principalmente, absolutamente não virá com essa reforma tributária. Há muito mais por se fazer.