A saída de Dilma e do PT do governo federal interrompeu injeção de recursos em programas de melhoria para a qualidade de vida das pessoas. Ministério das Cidades foi extinto e o Minha Casa Minha Vida tirou os mais pobres entre principais beneficiários

 

Nos governos do PT, a melhoria da qualidade de vida nas cidades foi assumida como tarefa do governo federal, em parceria com Estados e municípios. Apoio à elaboração de projetos, volumes inéditos de recursos e ações coerentes com o enfrentamento das carências e desigualdades urbanas foram marcas nos períodos de Lula e Dilma. No total, por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), foram destinados cerca de R$ 715 bilhões para investimento em moradias do Minha Casa Minha Vida, obras de saneamento, mobilidade e prevenção de riscos.

A partir do Golpe de 2016, que tirou Dilma da Presidência da República por meio do impeachment sem crime de responsabilidade, sob a égide do ajuste fiscal nunca alcançado, o apoio do governo federal a estados e municípios foi progressivamente reduzido, apesar de as carências urbanas persistirem crescendo. A extinção do Ministério das Cidades recriou um vazio institucional.

Criado em 2003, o Ministério das Cidades recolocou o governo federal na construção da política de desenvolvimento urbano, estimulando os municípios e atores sociais na elaboração de novas práticas de planejamento do território e gestão democrática.  No governo Temer, houve um esvaziamento orçamentário do ministério, com os recursos empenhados voltando ao patamar de 2008 — isso passou a corresponder a 30% dos recursos disponíveis entre 2013-2015. Ademais, a 6ª Conferência Nacional das Cidades, que deveria ter ocorrido em 2017, foi transferida para 2019 e o Conselho das Cidades, esvaziado.

No governo Bolsonaro, o Ministério das Cidades foi extinto. Houve um retrocesso institucional, voltando ao panorama existente antes dos governos do PT, com resultados desastrosos. As ações voltadas ao desenvolvimento das cidades foram pulverizadas entre ministérios e secretarias, assim como os recursos. O Conselho de Desenvolvimento Urbano, que substituiria o Conselho das Cidades, segue sem definição há dois anos.

Outra grave consequência é que os municípios perderam centralidade na construção dessas ações e os movimentos de reforma urbana e direito à cidade deixaram de ter interlocução junto ao governo federal, perdendo representatividade. Mas o mais grave, contudo, de todos os efeitos gerados pelo Golpe de 2016 foi a exclusão dos mais pobres do programa de habitação Minha Casa, Minha Vida. Entre 2009 e 2016, foram investidos R$ 294,5 bilhões pelos governos Lula e Dilma.

Os números mostram que o MCMV foi o maior programa habitação da história do Brasil. Foram 4,2 milhões de moradias contratadas até maio de 2016, em 96% dos municípios brasileiros. Praticamente metade dessas moradias atendeu famílias com renda de até R$ 1.800, a chamada Faixa 1 do programa. Isso só foi possível porque os governos petistas reconheceram que parte expressiva da população não consegue acessar o financiamento nas condições do sistema bancário – e ajustaram o MCMV para resolver este problema.

GOLPE DE 2016 - Investimentos despencam nas cidadesGOLPE DE 2016 - Investimentos despencam nas cidades

O Golpe de 2016 foi mortal para o MCMV em sua forma original. A Faixa 1, que atendia as famílias mais pobres, foi sendo abandonada. Como resultado, do total de moradias contratadas para as famílias mais vulneráveis entre 2009 e 2020, 91% foram nos governos do PT.

No novo mandato de Dilma, os investimentos previstos para o programa chegavam a R$ 210,6 bilhões: R$ 41,2 bilhões, com subsídios do Orçamento Geral da União; R$ 39,7 bilhões, com subsídios do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); e mais R$ 129,7 bilhões, via financiamento com recursos do FGTS. A ideia era atender a 23 milhões e, até 2018, contratar 5,75 milhões de moradias contratadas. Tudo isso ficou apenas no planejamento com o Golpe de 2016.

O governo Temer reduziu progressivamente os recursos do Orçamento da União destinados ao MCMV. Bolsonaro praticamente zerou as contratações de moradias para o segmento de menor renda. Em 2020, lançou o programa Casa Verde Amarela que, na prática extinguiu o MCMV, ao alterar o perfil dos investimentos e passar a operar basicamente com o subsídio do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Na prática, o programa Casa Verde Amarela é uma nova marca fantasia, utilizada por Bolsonaro para entregar moradias para famílias de baixa renda em empreendimentos habitacionais em sua maioria contratados ainda no governo Dilma.

De 2009, ano de criação do MCMV, até o fim de 2018, o investimento anual do programa, que era de R$ 11,3 bilhões, em média foi caindo. Em 2020, chegou a R$ 2,54 bilhões. No primeiro ano de governo Bolsonaro, o valor investido foi de R$ 4,6 bilhões. O Brasil tem um déficit de 7,797 milhões de moradias, segundo a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). O estudo se baseia em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em 2021, o cenário é ainda mais regressivo. Os cortes do Orçamento de 2021 devem paralisar cerca de 250 mil moradias que estavam em execução. Ou seja, nem mesmo concluir o que estava em curso será possível por parte do governo federal.

Retrocessos em prevenção de riscos e desastres

Os governos do PT encararam o desafio de construir uma política integrada para apoiar estados e municípios na gestão dos riscos e resposta a desastres. Para isto, disponibilizaram recursos da ordem de R$ 19 bilhões para obras de prevenção, mapeamento de áreas de risco, aprimoramento da capacidade de resposta a desastres integradas e montagem de uma rede nacional de monitoramento e alerta. Foram feitas 332 obras de drenagem e 140 obras de contenção de encostas em todo o país.

Todo este esforço foi abandonado a partir do golpe. Na esteira da Emenda do Teto dos Gastos, os investimentos no setor despencaram – os recursos para drenagem recuaram, em média, 75%, e os para contenção de encostas, 90%. E nunca mais se recuperaram.

O Plano Plurianual 2020-2023 completou o desmonte da atuação integrada, além de perseverar na redução dos recursos para apoio aos municípios e estados. No atual PPA, praticamente só há recursos para ações de defesa civil a serem deflagradas após a ocorrência dos desastres, destino de 70% dos recursos empenhados em 2020 e de 94% dos previstos para 2021.  No governo Bolsonaro, não há mais investimento em prevenção de riscos e desastres nas cidades e estados.