O Sistema Interligado Nacional (SIN) está passando pela maior crise hídrica dos últimos 91 anos. A quantidade de água que chegou nas usinas hidrelétricas entre setembro de 2020 e maio de 2021 foi 33% menor que a média dos últimos 91 anos.

Apesar do nível dos reservatórios das regiões Sul, Nordeste e Norte estar adequado, os três juntos representam apenas 30% da capacidade de armazenamento do sistema. Em outras palavras, apesar das “caixas d’água” destas regiões estarem relativamente cheias, elas são pequenas.

O subsistema Sudeste/Centro-Oeste concentra 70% da capacidade de armazenamento. Ou seja, esta é a grande “caixa d’água” do SIN. No entanto, neste momento, estes reservatórios estão com nível muito baixo. Os níveis dos reservatórios em 28 de junho eram os seguintes: Sudeste/Centro Oeste: 29,21%; Sul: 63,38%; Nordeste: 59,38%; e Norte: 83,08%.

Graças aos investimentos dos governos Lula e Dilma, o sistema elétrico é muito mais robusto em 2021 do que era em 2001, quando aconteceu o grande apagão.

Entre 2001 e 2020, a capacidade instalada do sistema elétrico cresceu 133%, enquanto o PIB cresceu apenas 44%. Também houve grande diversificação das fontes de energia. Entre 2001 e 2020, houve uma significativa diversificação da matriz elétrica levando a redução da dependência do país em relação a hidroeletricidade.

Em 2001, as hidroelétricas representavam 83% da capacidade instalada. Em 2020, representava 62% da capacidade instalada. Houve um aumento da participação das termelétricas a gás natural e outros combustíveis, usinas eólicas e termelétricas a bagaço de cana, que atualmente, representam respectivamente, 15%, 10% e 9% da capacidade instalada total.

Também houve um aumento da capacidade de intercâmbio de energia entre os subsistemas. Em 2001, o Sul tinha água sobrando e faltavam linhas de transmissão para enviar a energia de lá para o Sudeste/Centro-Oeste. Entre 2001 e 2020, a capacidade do Sul de enviar energia para o Sudeste/Centro-Oeste aumentou 61%.

Neste mesmo período, a capacidade do Norte e Nordeste de enviar energia para o Sudeste/Centro-Oeste aumentou 14 vezes. Nos últimos meses, o Norte enviou, a partir das usinas do rio Madeira (Jirau e Santo Antônio) e de Belo Monte, grandes quantidades de energia para o subsistema Sudeste/Centro Oeste.

O mesmo foi feito pelo Nordeste, que vem utilizando o excedente de geração eólica para exportar energia para o Sudeste/Centro-Oeste, contribuindo para reduzir a atual crise de fornecimento de energia.

Mas o fato é que houve um problema de gestão, no monitoramento, com demora no despacho de todas as termelétricas. Em 2020, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), ao não autorizar o despacho preventivo de maior número de termelétricas, deixou o nível dos reservatórios no Sudeste/Centro Oeste cair muito. Em novembro, atingiu-se um percentual inferior a 18%.

Em termos hidrológicos, o período úmido que vai de novembro de 2020 a maio de 2021, foi muito ruim. Mesmo assim, nos primeiros meses do ano, o CMSE só autorizou o despacho de parte do parque termelétrico. Com isto, os reservatórios chegaram em maio, início do período seco de 2021, com níveis muito baixos.

Ou seja, houve uma aposta em São Pedro. Apostou-se que a situação hidrológica iria melhorar e que não se precisaria despachar as termelétricas mais caras. Como a hidrologia não melhorou, não se poupou água nos reservatórios. Ou seja, a aposta em São Pedro deu errado.

E a projeção agora é de que os níveis dos reservatórios ficarão muito baixos no fim do período seco de 2021. As projeções são que o nível de armazenamento do subsistema Sudeste/Centro Oeste deverá chegar em cerca de 10% em novembro, final do período seco. Este é um nível muito baixo. Para se ter uma ideia, em novembro de 2001 os reservatórios desta região chegaram em 23% e em 2014, ano muito seco, chegaram em 16%. Ou seja, o país vai começar o período úmido de 2021 com os reservatórios muito secos. Se tivermos um período úmido muito ruim, poderemos ter problema de suprimento de energia em 2022.

É preciso ser claro. Existe o risco de blecautes — apagões — em 2021. O risco maior é de se ter alguns apagões, principalmente no horário de ponta, entre 18h às 21h, quando as pessoas chegam em casa e usam elevadores, chuveiros elétricos, iluminação e outros eletrodomésticos. O baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas reduz a capacidade de atender momentos de pico de consumo, podendo assim haver interrupções inesperadas no fornecimento de energia.

O governo criou por meio de medida provisória o comitê para gestão da crise. A presidência do comitê é do ministro de Minas e Energia, Almirante Bento Albuquerque. Esta medida tem dois objetivos principais.

O primeiro é poder tomar medidas de redução das vazões dos reservatórios hidrelétricos sem precisar de autorização da Agência Nacional de Águas ou do Ibama, já que se precisa reduzir as vazões das usinas na cabeceira da bacia do Paraná, e isto tem impactos socioambientais e na hidrovia Tietê-Paraná. O governo tem muito medo de judicialização desta medida. O ministro tem feito um périplo pelo STF e pela alta esfera do Judiciário para explicar a MP.

O segundo objetivo é eventualmente contratar termelétricas emergenciais, como por exemplo, termelétricas em balsas que podem vir de diversos lugares do mundo, como foi feito na crise de 2001.

 

Aumentos tarifários importantes

Antes de 2015, o custo anual de operação das termelétricas era repassado na data do reajuste das distribuidoras para as tarifas. O problema é que os valores devidos as distribuidoras eram reajustados pela Selic, criando uma conta financeira para o consumidor.

As bandeiras tarifárias — verde, amarela, vermelha patamar 1 e vermelha patamar 2 — são uma forma de passar para as tarifas os custos da geração termelétrica, conforme as plantas vão sendo operadas. Além de evitar que os consumidores paguem os juros, a bandeira também dá um sinal que a tarifa está cara e que o consumidor deve diminuir o consumo de energia.

Por conta da pandemia, a bandeira foi mantida verde entre fevereiro e novembro de 2020. Isto criou um passivo na “conta bandeiras” de R$ 1,5 bilhão de reais.

Além disto, o despacho de termelétricas mais caras obrigou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a reajustar o valor da bandeira vermelha de nível 2, que teve uma elevação de 52%. Este reajuste deverá implicar em um aumento de 5% na tarifa de eletricidade.

Existe uma avaliação que este aumento na bandeira será insuficiente para cobrir os custos do despacho de todas as termelétricas e que tenha de haver um novo aumento este ano.

 

Conta Covid

Em maio de 2020, o MME criou a Conta Covid. O objetivo era dar um alívio de caixa as distribuidoras de energia e ajudar a compensar a queda no faturamento com a redução do consumo e do aumento da inadimplência nesse período.

O montante final do repasse às distribuidoras foi calculado em R$ 14,8 bilhões. Os recursos foram oferecidos por um pool de 16 instituições financeiras lideradas pelo BNDES.

Para o consumidor, a iniciativa representa a postergação e o parcelamento de impactos tarifários que, caso contrário, teriam efeitos imediatos nas contas das famílias e empresas.

Os empréstimos terão carência até julho de 2021 e vencimento em dezembro de 2025. Ou seja, esta medida implicará aumento de tarifa até 2025. A realidade é esta.