O antológico trabalho do pensador e militante político uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015) faz 50 anos. Publicado originalmente em 1971, em Montevidéu, pela editora Siglo XXI, o livro As Veias Abertas da América Latina faz uma radiografia da região desde o descobrimento e colonização europeia até o início da década de 1970. Pontifica ao longo das mais de 360 páginas o caráter colonial ainda presente na nossa América, agora sob a hegemonia política, cultural e militar por parte dos Estados Unidos.

Na obra, vê-se com exatidão cirúrgica o verdadeiro massacre dos povos indígenas, sua escravização e posterior apagamento. “Em 1492, os nativos descobriram que eram índios, descobriram que viviam na América, descobriram que estavam nus, descobriram que existia o pecado, descobriram que deviam obediência a um Rei e uma Rainha de outro mundo e a um deus de outro céu, e que esse deus havia inventado a culpa e a vestimenta e havia mandado queimar vivo quem adorava ao sol e a lua e a terra que a chuva molha”, pontua Galeano.

Na visão do escritor, a exploração das riquezas naturais e o escravismo sempre estiveram na base do pensamento do usurpador, travestido de colonizador e civilizador que ocuparam o território de forma vil. Panorama que ainda permanece em grandes partes da “nuestra América”.

Inclusive no Brasil, que é retratado pelo escritor como uma colônia de exploração pelos portugueses e que depois se converteria em área de influência da Inglaterra e posteriormente dos EUA. “A experiência do ouro perdido em Minas Gerais — ‘ouro branco, ouro negro, ouro podre’ escreveu o poeta Manuel Bandeira —, como se sabe, não serviu para nada: o Brasil continua se desfazendo gratuitamente de suas fontes naturais de desenvolvimento”.

Observador atento da realidade latino-americana, principalmente por sua formação no jornalismo investigativo, Galeano era conhecedor profundo do histórico de golpes militares e afins. Em 1973, com o golpe militar no Uruguai, ele foi preso e ameaçado de morte, partindo em seguida para o exílio na Espanha.

No quadragésimo aniversário de lançamento do livro, o escritor lamentava o praticamente imutável cenário na região. “Em todo o mundo, experiências de partidos políticos de esquerda no poder às vezes deram certo, às vezes não, mas muitas vezes foram demolidas como castigo por estarem certas, o que deu margem a golpes de Estado, ditaduras militares e períodos prolongados de terror, com sacrifícios e crimes horrorosos cometidos em nome da paz e do progresso”.

O livro foi publicado em língua portuguesa pela primeira vez em 1978, em pleno regime militar. Foi um sucesso imediato nos círculos da esquerda e nos resistentes à ditadura, chegando a vender por ano uma média de 5 mil exemplares.

Obra imprescindível para todos que queiram conhecer as entranhas da colonização, As Veias Abertas da América Latina continua atual. Ainda mais nesse momento de ofensiva neoliberal e das novas formas de guerra de dominação imperialista: híbridas e de bloqueio e garroteamento econômico.

A despeito das mudanças ocorridas, a obra continua um referencial para aqueles que não aderem ao viralatismo e continuam na luta pela verdadeira emancipação da América Latina.

50 anos de As veias Abertas da América Latina