Racismo estrutural, o fantasma ainda assombra
A pandemia acendeu ainda mais esse racismo, que fortalece as desigualdades no país. O Estado não existe para os mais vulneráveis. Não oferece a eles educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Não condiz com as garantias e princípios constitucionais.
A omissão do Estado se reflete no descaso com as vidas negras, no trato da abordagem de agentes públicos e privados. Muitos matam e depois perguntam o porquê. Isso nos indigna.
O Instituto de Segurança Pública (ISP) registra que as mortes por intervenção de agente do Estado somaram 453 no primeiro trimestre de 2021, um aumento de 4%, e 157 em março, 37% a mais em relação ao mesmo mês de 2020.
Só em São Paulo, de janeiro de 2015 a dezembro de 2020, 1.253 crianças e adolescentes, de 19 anos ou menos, foram mortas, conforme dados do Comitê Paulista pela Prevenção de Homicídios na Adolescência da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
Um exemplo que demostra que vidas negras não importam, é o caso das três crianças desaparecidas, há cinco meses, em Belford Roxo. Fernando Henrique, de 11 anos, Alexandre da Silva, de 10 anos, e Lucas Matheus, de 8 anos. Essas crianças saíram de casa, no dia 27 de dezembro do ano passado, e não foram mais vistas até hoje. As suas famílias choram e clamam por uma resposta. Só agora temos alguns sinais de investigação mais profunda. Por que a sociedade brasileira não se comove com esse fato?
Em meados de 2020, o STF decidiu pela suspensão da realização de ações policiais em comunidades do Estado do Rio de Janeiro, enquanto perdurar o estado de calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19.
Infringindo essa decisão, em 6 de maio, a comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, é surpreendida com a ação desestruturada do Estado, tendo como resultado a morte de 28 seres humanos. Qual a cor dessas pessoas mortas?
Cesare Lombroso teorizava os aspectos comportamentais e biológicos baseados na criminologia de determinadas pessoas. Isso contribui para a estigmatização negativa do negro e assombra diariamente a nossa sociedade. Não podemos permitir isso.
Sou um parlamentar negro e tenho consciência da responsabilidade que carrego frente ao combate ao racismo no Brasil. Por isso, resgatamos e elaboramos mais de 13 proposições para promoção da igualdade racial. As sugestões e a parceria ativa dos movimentos negros foram fundamentais para esse resultado. O Senado se sensibilizou e aprovou as propostas.
Entre elas, a Convenção Interamericana contra o Racismo, o PL 5231, de 2020, que trata da abordagem policial dos agentes públicos e privados.
Essas matérias tramitam na Câmara e precisam ser pautadas e votadas. Não podemos permitir que realidades diárias, como a de Jacarezinho, se perpetuem no país.
Oxalá, que neste mês de maio, consigamos aprovar o PL 4373, de 2020, que tipifica como crime de racismo a injúria racial. Esse crime precisa ser imprescritível e inafiançável, pois o racismo, crime cruel, precisa ser abolido na sua essência e esse projeto garante essa punição educativa.
Martin Luther King dizia: “que não sejamos julgados pela cor da pele, mas pelo conteúdo do nosso caráter.” Muito axé.