EDITORIAL – Reconstruir o Brasil
Aloizio Mercadante *
Passados cinco anos do golpe contra Dilma, o Brasil atravessa um dos piores momentos de sua história. A pandemia segue descontrolada, já são mais de 410 mil brasileiros mortos – quatro vezes mais óbitos que a média mundial. A vacinação em massa segue atrasada e marcada por incertezas. E voltamos a enfrentar problemas que pareciam já ter ficado no passado, como a fome, o empobrecimento e o recorde de desemprego. O negacionismo, o despreparo e a falta de coordenação do governo Bolsonaro está conduzindo o país para a sua mais grave crise da história contemporânea.
No início do ano, o país amargava a triste marca de 14,4 milhões de desempregados e 5,9 milhões de pessoas que gostariam de trabalhar, mas desistiram de procurar uma vaga. Puxada pela alta dos alimentos e o abuso nos preços dos combustíveis e do gás de cozinha, a inflação segue acima da meta. Além disso, a insegurança alimentar atingiu 36,7% dos domicílios, no final de 2020, enquanto a desigualdade de renda no trabalho cresceu a patamares recordes. A renda dos 10% mais ricos representou 39 vezes o ganho dos 40% mais pobres.
As promessas de que o afastamento, sem crime de responsabilidade, de uma presidenta eleita democraticamente geraria um choque de confiança nos investidores capaz de recuperar a economia fracassaram. A agenda neoliberal, derrotada quatro vezes seguidas em eleições presidenciais e que foi retomada com o golpe, tem promovido o desmonte do Estado de Bem-Estar Social, inviabilizando a capacidade de atuação do Estado, privatizando empresas estratégicas para o país, retirando direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores e desmoralizando e isolando o Brasil no mundo.
Mais que isso, a farsa do impeachment contra Dilma gerou um Estado autoritário e promoveu o arbítrio e a perseguição política. Ainda dividiu a nossa Nação e deu voz a uma extrema direita obscurantista e negacionista, relegada ao ostracismo político desde o processo de redemocratização. Sem a construção da narrativa da antipolítica, dos abusos judiciais e do lawfare, praticados pela da Lava Jato, da criminalização do PT e do apoio de setores conservadores da mídia e da classe política, o golpe não teria ocorrido e o Brasil não viveria essa tragédia histórica.
Bolsonaro emergiu do processo de golpe contra Dilma e ganhou mais força a partir da condenação arbitrária e ilegal de Lula, que o impediu de participar das eleições presidenciais de 2018.
Entretanto, o fracasso do governo do ex-capitão, com sua agenda neoliberal e ortodoxia fiscal permanente, iniciadas pelos golpistas, faz com que, hoje, setores que apoiaram e avalizaram o golpe e que atropelaram o Estado de Direito e o devido processo legal tentem se reposicionar politicamente. As sequelas sociais e as fissuras democráticas do Golpe de 2016 inviabilizaram eleitoralmente as principais lideranças da chamada direita liberal tradicional e aprofundaram a polarização política no país.Aqueles que plantaram e semearam o Golpe estão colhendo as consequências de atentar contra a soberania do voto popular.
Já nós, que lutamos pela justiça e contra o lawfare, assistimos o STF julgar a incompetência do tribunal e a suspeição do juiz que condenou Lula, assegurando seus direitos políticos plenos. Nós, que lutamos e plantamos democracia, diálogo, um projeto sólido de desenvolvimento do país, participação popular e esperança, seguramente, vamos, em breve, colher com Lula lá uma nova oportunidade de reconstruir o Brasil. O Brasil nunca precisou tanto do PT e de Lula como agora.
* Ex-ministro de Estado, é presidente da Fundação Perseu Abramo.