Ricardo Alexino Ferreira
Os negros constituem, segundo o IBGE, 44% da sociedade brasileira, equivalente a mais de 70 milhões de indivíduos. Um número duas vezes maior que a de afro-americanos nos Estados Unidos da América. Estes números dão ao Brasil o status de segundo país com maior concentração de negros no mundo. O primeiro é a Nigéria, com mais de 123 milhões. E repare que muitos especialistas consideram os números do IBGE inferiores ao da realidade. Ou seja, o Brasil é Negro. Um título que não quer dizer muito. Afinal, no Brasil, este segmento não está nas mesas de decisão do país e nem vem se beneficiando da riqueza, que historicamente ajudou a construir através da mão- de-obra escrava.
Há quem diga que a maioria dos brasileiros tem em suas veias o sangue negro. O primeiro a afirmar isto, na atualidade, foi o presidente Fernando Henrique Cardoso, que pejorativamente chegou a dizer que “até ele tinha um pé na cozinha” ou “que era mulatinho”. Afirmações como estas balançam conforme as brisas da conveniência.
O certo é que os negros estão ausentes dos meios de comunicação de massa, da política, das universidades e por aí vai. O Brasil só se orgulha da sua negritude quando é “para inglês ver”; quando isto pode dar o título de país sensual, de país do melhor futebol, do pagode e da beleza do carnaval. Aí sim, não faltam referências aos negros brasileiros e até mesmo o orgulho nacional da negritude. Mas, não se enganem, tudo isto, volto a dizer, é só “para inglês ver”.
Não é incomum a maioria das pessoas ao ver um negro lhe atribuir tendências naturais ao samba (samba no pé e na veia) e habilidades especiais para o futebol. Não que isso seja um demérito, mas a sociedade branca brasileira vem construindo ao longo dos séculos uma cadeia reservada historicamente para o negro, que lhe permite ascensão social apenas em atividades artísticas e corporais. Com isso, a presença negra em outros segmentos sociais está ficando cada vez mais restrita.
Nem mesmo as aplicações de leis, como a Lei 7.716, que considera o racismo crime inafiançável e imprescritível sujeito a pena de reclusão tem se mostrado de alguma utilidade. Até hoje não se tem notícia do cumprimento integral de fato desta lei.
Mas a população negra tem algumas saídas. Uma delas é a escolarização, considerando a sólida formação humanística e a possibilidade de domínio das novas tecnologias. Tudo isso associado ao compromisso ético e moral da nova classe média negra que começa a emergir e deve se empenhar em criar oportunidades para os descendentes de africanos. Empresários negros, por exemplo, devem se preocupar em empregar e profissionalizar outros negros. Esta tem sido a história norte-americana.
A outra saída é a formação de grupos que tenham um caráter político direto, que tratem as questões étnicas de uma maneira mais incisiva. Esta, por exemplo, está sendo a proposta do grupo Todos a Bordo, dentro do PT.
Ricardo Alexino Ferreira é jornalista, professor de Jornalismo Especializado na Universidade Estadual Paulista (Unesp) e doutorando na área de Ciências da Comunicação na Universidade de São Paulo.
Fonte: PT Notícias, nº 83, setembro de 1999, p. 08. Acervo: CSBH/FPA.
Para visualizar o documento original, clique aqui.