MOVIMENTO NEGRO E O PT – 1982

Francisco Marcos Dias

Militante do movimento negro, rio Grupo Molengo-Itaquera em São Paulo. Membro do Partido dos Trabalhadores

Há quem pergunte porque os negros estão a fazer tanto barulho ultimamente, em forma de movimentos, reuniões, congressos e até mesmo surgimento de candidatos fazendo um discurso estrita mente racial.

Há até mesmo quem pergunte por que dentro do próprio PT surge grupos de negros, candidatos, levantando essa questão.

Pensando nisso, resolvemos analisar um pouco a situação do negro dentro e fora do Partido e por que tanto barulho.

O negro, quando aqui chegou, veio trazido para desempenhar um papel específico, que era ser escravo. E como tal, com o seu suor e sangue construiu-se a nação brasileira.

Veio a abolição da escravatura, muito mais por interesses econômicos do que realmente para acabar com a atrocidade que é a escravidão. Logicamente, não se pode esquecer que houve uma luta para atingir tal objetivo, mas tem-se claro que a libertação foi mais concedida do que conquistada. E tal fato é comprovado pela miséria e marginalidade às quais foram jogados os negros no caminhar do processo.

Sabe-se também que, durante e após a abolição, houve diversas formas de organização do negro para fugir da condição de escravo, resistir ao branco, lutar contra a colônia, lutar contra o regime e muito sangue precioso de negros anônimos foi derramado.

Porém, o oprimido começa a escrever sua história, começa a descobrir os nomes dos heróis anônimos e recomeça a se organizar das mais diversas formas. Assim, como o Brasil hoje é outro, onde o trabalhador começa a buscar formas de organização para efetivamente cuidar de seus interesses, nós negros não poderíamos deixar de nos organizar, pois também somos trabalhadores, também somos oprimidos, mas somos negros. E essa ressalva faz com que o sistema nos discrimine, nos separe (negros, pardos, mulatos, mestiços e outros) tornando-nos marginalizados. Lançando- nos às favelas e alagados, pagando-nos baixos salários, reservando-nos subempregos, atirando-nos aos cárceres, dizimando-nos nas periferias e baixadas. E agora, bem recentemente, propondo-nos o controle de nossa natalidade da forma mais torpe, esterilizando nossas mulheres, evitando assim um crescimento da nossa população.

Temos então de nos organizar, porém, hoje, essa não é uma luta separada, onde somente o negro deve lutar. Essa é uma luta de todos, negros e brancos, e o PT Partido dos Trabalhadores — surge como uma opção de organização.

Nós, negros, devemos – nos organizar enquanto negros, levantando as nossas reivindicações, exigindo o nosso espaço, gerando nossas lideranças e porta-vozes, atuando decididamente dentro do Partido.

Mostrar ao nosso irmão, branco, e também oprimido, as formas de opressão às quais estamos sujeitos. Trabalhar juntos. Evitando os erros organizativos do passado, não deixando que falem por nós pois somos a grande maioria deste País, somos a grande massa de trabalhadores, somos quem carregou e carrega este País nas costas; e não podemos deixar que se forme um partido do trabalhador, pelo trabalhador e para o trabalhador sem a nossa presença.

Todo esse barulho, é consequência dos anos em que nos calamos.

Todo esse barulho, é devido ao imobilismo causado pelas correntes em nossos pés.

Todo esse barulho é o levantamento de dados e fatos para a construção de um País novo, moderno, feito por nós e para nós. Uma verdadeira democracia racial, não aquela dita por eles, mas sim proclamada por nós.

Fonte: Jornal dos Trabalhadores, ano I, nº 14, outubro de 1982, p. 05. Acervo: CSBH/FPA.

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