Assim como quem não quer nada, tomou um ônibus e foi parar no meio de uma cidadezinha de que nunca ouvira falar. Apeou, como diriam os moradores do lugarejo, carregou na mão esquerda a valise de lona de uma companhia aérea e a capa de nailon, na mão direita o cigarro aceso, e, olhando o céu, pôs-se a andar ao léu.

Assim como quem não quer nada, tomou um ônibus e foi parar no meio de uma cidadezinha de que nunca ouvira falar. Apeou, como diriam os moradores do lugarejo, carregou na mão esquerda a valise de lona de uma companhia aérea e a capa de nailon, na mão direita o cigarro aceso, e, olhando o céu, pôs-se a andar ao léu.

Deu quatro passos na rua em que o ônibus parara, virou uma esquina, deu mais vinte passos e entrou na praça. O jardim era horrivelmente simétrico, a grama insuportavelmente bem tratada, os bancos inexoravelmente existentes e desocupados, as árvores escandalosamente frondosas. Surpreendeu-se de notar, entretanto, que, composto de tantas minudências desprimorosas, o jardim era agradavelmente bonito e convidativo. Sentou-se num banco, à sombra de uma árvore, mergulhando a vista na grama verde e fresca e assim embriagando-se de nada, até ir perdendo o sentido dos sentidos e a consciência das preocupações e dos problemas que o haviam feito largar mão de tudo na cidade, fechar a escrivaninha, a porta do escritório, entrar na primeira agência de passagens, tomar o primeiro ônibus que estava dentro do horário e chegar ali.

Levantou-se quando o barulho de crianças em carrinhos de mão, das meninas em bicicletas de duas rodas e as vozes pressurosas de pajens aflitas indicaram-lhe que o torpor do sol de depois do almoço já ia cedendo ao enlanguescer mais ameno do começo da tarde. Com passos deliberadamente vagarosos atravessou a praça e pousou a valise e a capa em cima do mármore redondo de uma mesa baixa de bar: foi ao balcão e pediu um café. “Não, um vermute”- corrigiu. E emendou logo para uma média. “Um copo de leite pingado com uma broa de milho”. Mastigou o lanche sentindo-se doméstico e prosaico, mas simplificado. Pagou e saiu à porta. Do lado direito, uma loja de roupas. Do lado esquerdo, um hotel. Na loja comprou um par de sapatos de lona, duas camisas coloridas de manga curta (há quantos anos não comprava camisas coloridas de manga curta) e um blusão que não entendeu bem como funcionava mas que deveria eventualmente substituir com vantagem um paletó. Depois aproximou-se do balcão do hotel e perguntou por um quarto com banheiro.

“Bem, começou o rapaz do balcão, temos diversos tipos de quartos. Temos…”E antes que o outro continuasse ele pediu: “Dê-me o de número mais baixo. Serve”.

Subiu, depôs a valise e os embrulhos em cima de uma cadeira, tomou um banho de chuveiro, vestiu uma das camisas novas, trocou de sapato, telefonou à portaria solicitando que servissem no quarto a refeição. “Não, não quero carneiro. Nem lombo. Só a sopa, e dois ovos fritos, De sobremesa, queijo com goiabada. E café”.

Depois, tranqüilamente, sentou-se à mesa do quarto, abriu a valise, tirou de dentro um bloco de papel timbrado, um envelope, selos. Puxou da caneta e começou a carta:

“Prezados colegas de Diretoria. Depois de quatro anos de ininterruptos trabalhos para o engrandecimento de nossa firma, venho solicitar-lhes a fineza de concederem-me alguns dias de férias…

 

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